Folha de S. Paulo


Zika não afasta, mas faz turista mudar hábitos no Nordeste

Ailton Cruz/Folhapress
Banhistas lotam a praia do Francês, próxima a Maceió (AL), tida pela população como 'zika free
Banhistas lotam a praia do Francês, próxima a Maceió (AL), tida pela população como 'zika free'

Conhecido pelos turistas como a terra do frevo, do maracatu e dos blocos de rua populares, Pernambuco ganhou outro rótulo neste verão –ainda que desagradável.

O Estado é o com mais casos suspeitos de microcefalia: 1.312 desde 2015 (veja mapa abaixo).

Por causa da suspeita de ligação com a zika, a malformação que acomete recém-nascidos é um dos parâmetros usados pelo Ministério da Saúde para ajudar a medir os casos de infecção pelo vírus (cujos dados são desconhecidos, já que a doença ainda não é de notificação obrigatória).

O que parece preocupante –a Organização Mundial da Saúde decretou quadro de emergência por causa da microcefalia, e mesmo Pernambuco instaurou em dezembro estado de emergência– não tirou o sossego dos visitantes.

Nos centros turísticos do Nordeste pelos quais a reportagem da Folha circulou nos últimos dias, o clima era de aparente tranquilidade.

Em Alagoas (119 casos suspeitos de microcefalia), chega-se a alardear que praias como a do Francês, símbolo do turismo de massa no Estado, são zonas "zika free".

"É por causa do vento. O mosquito não consegue voar perto da praia", diz o vendedor de cocos Everaldo Gomes, 37. Especialistas da saúde ouvidos pela reportagem dizem que o vento pode mesmo fazer com que o Aedes aegypti, transmissor da doença, tenha dificuldades de orientação.

No Galo da Madrugada, bloco de Carnaval que recebeu 2 milhões de pessoas, a estudante paulistana Marina Tostes, 20, relaxou. "Prometi à minha mãe que ia passar repelente sempre, mas no meio do bloco é difícil", diz.

Mas há sinais de que alguns hábitos mudaram, sim. Na praia, o produto se tornou quase obrigatório. E na rua, mesmo com temperaturas na casa dos 30ºC, a calça comprida é relativamente comum.

A alemã Laura Kühl, 31, que passou o Carnaval no Recife, carregava repelentes de duas marcas. "Não precisa ter medo, é só se prevenir", disse.

O engenheiro Marcos Palma, 43, passou dose dupla de spray na filha Valentina, 1, antes de ir a Porto de Galinhas (PE) e reforçou a proteção da menina com camiseta de mangas longas. "Ajuda contra o sol e o mosquito; o zika e a dengue podem ser muito perigosos para ela", afirma.

Nas farmácias de Pajuçara, bairro que concentra os hotéis em Maceió, as marcas mais conhecidas de repelente acabam rapidamente.

Guga Matos - 6.fev.2016/JC Imagem/Folhapress
Foliões com mosquiteiros sobre as sombrinhas de frevo no desfile do Galo da Madrugada, no Recife
Foliões com mosquiteiros sobre as sombrinhas de frevo no desfile do Galo da Madrugada, no Recife

RITMO DE FREVO

As capitais nordestinas reforçaram neste verão as ações de conscientização.

Isso porque o cenário carnavalesco é ideal para a proliferação do mosquito que transmite dengue, zika e febre chikungunya: calor e umidade, grandes aglomerações e maior quantidade de lixo –potencial criadouro do Aedes aegypti– na rua.

No Recife, uma banda de frevo fez plantão no aeroporto, alertando turistas sobre como evitar as doenças.

Ainda assim, em João Pessoa, o engenheiro civil carioca Nelson Linhares, 52, que passava férias com a mulher e as duas filhas, não se alterou. "Não temos o costume de usar repelente e nunca pegamos dengue. Nas férias, vamos manter a rotina", disse.

A Paraíba notificou 497 casos suspeitos da malformação desde 2015 (o segundo Estado com mais registros). Taxistas, guias de passeios pelo litoral e funcionários de hotéis dizem crer que o foco do zika seja as periferias, não a orla.

Mesmo em Tambaba, praia de nudismo a 30 quilômetros de João Pessoa, muitos não estavam preocupados com o mosquito –embora, em teoria, todos tivessem centímetros a mais de pele exposta para o mosquito picar.

"É em Pernambuco que a situação está mais feia", disse Rosângela, 44, turista de Natal. A pousada local, diga-se, instalou mosquiteiros extras e repelentes de tomada.

O jornalista BRUNO MOLINERO viajou ao Recife a convite da Secretaria de Turismo de Pernambuco

Colaborou CAROLINA OLIVEIRA, de São Paulo

Zika nos Estados


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