Folha de S. Paulo


Com crise, arte de rua explodiu em Buenos Aires e virou atração turística

Na visita mais recente que fiz a Buenos Aires, evitei os programas de praxe, como apresentações de tango e tour no teatro Colón. Em matéria de passos percussivos, prefiro o sapateado. E já vi teatros de ópera suntuosos na Europa. Para fugir da agitação dessa cidade vibrante, procurei espaços calmos.

Um deles foi El Rosedal, um jardim de rosas no parque Tres de Febrero. Como era primavera, as 12 mil roseiras de 1.200 variedades pareciam estar todas floridas. Os círculos concêntricos de flores perfumadas, em muitas cores, cercados por rosas trepadeiras que tomam conta das pérgulas, são deslumbrantes.

Situado no mesmo parque, o Jardim Japonês é o maior do mundo fora do Japão, com 20 mil m² cativantes de bonsais, pontes de laca vermelha no formato de arco-íris e passarelas de madeira sobre lagoas com carpas.

A algumas quadras dali, no Malba (Museu de Arte Latinoamericano de Buenos Aires), entre quadros de Portinari, Tarsila do Amaral e Frida Kahlo, descobri o pintor argentino Xul Solar.

Seu estilo de inspiração surrealista, lembrando o de Paul Klee, me levou ao museu Xul Solar, a menos de três quilômetros do Malba. Lá, 86 de seus trabalhos converteram a casa do pintor numa galeria de imagens oníricas. Em uma delas, uma cidade suspensa por balões de ar quente flutua sobre uma vila medieval.

É igualmente convidativo o tour feito com a Graffitimundo para conhecer a arte de rua de Buenos Aires, que explodiu durante a crise econômica de 1998-2002, quando grafiteiros cobriram os muros de edifícios com murais vibrantes, muitas vezes com a permissão dos donos. Em um mural imenso, dois lutadores obesos vestindo apenas calças azul-elétricas se agarram num embate que mais parece um abraço.

Um grafiteiro criou uma colagem colorida de estênceis pintados com spray para decorar a fachada do restaurante Tegui, que encomendou o trabalho. A figura central do mural é um homem com tentáculos de polvo, cercado pelos rostos de figuras famosas (como Prince e Ray Charles) e outras nem tanto, rinocerontes e caracteres chineses que, segundo o guia, dizem "aprenda chinês".

Feito a pé e de van, o passeio inclui visita a um ateliê onde grafiteiros cortam seus estênceis e testam os desenhos sobre telas e a uma galeria que vende os quadros dos artistas.

TANGO? NÃO!

Em vez do tango, fui conhecer outra criação argentina: a Fuerza Bruta, colisão pós-moderna de ritmos percussivos e imagens aéreas realizada em sua maior parte muito acima da plateia.
Ao som de tambores, duas acrobatas, suspensas por cordas e polias fazem piruetas.

Em cima de uma lona de plástico suspensa sobre o público, mulheres seminuas mergulham e se entrelaçam sobre lençóis d'água. E então esse aquário humano desce para o público, que dança ao som de música eletrônica.

Com o câmbio favorável (R$ 1 equivale a 0,3886 peso argentino), até me animei a comprar vinhos de qualidade e um casaco de couro para minha mulher.

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PARA CONHECER

Editoria de Arte/Folhapress

El Rosedal
Onde parque Tres de Frebrero, em Palermo (entrada entre as avenidas Infanta Isabel e Sarmiento)
Quanto entrada gratuita

Jardim japonês
Onde parque Tres de Frebrero, em Palermo (entrada próxima às avenidas Berro Adolfo e Casares)
Horário das 10h às 18h
Site jardinjapones.org.ar
"Quanto* 24 pesos argentinos (R$ 9)

Malba
Onde avenida Presidente Figueroa Alcorta, 3.415, em Palermo
Horário qua., das 12h às 21h; de qui. a seg., das 12h às 20h;
Site malba.org.ar
Quanto 40 pesos argentinos (R$ 15)

Museu Xul Solar
Onde calle Laprida, 1.212, no Bairro Norte
Horário de ter. a qui., das 12h às 20h; sáb., das 12h às 19h
Site xulsolar.org.ar
Quanto 20 pesos argentinos (R$ 8)

Graffitimundo
Onde tour sai do bairro Colegiales; endereço é informado só após reserva do passeio
Horário de qua. a sáb., às 15h (tour de três horas feito a pé e de van)
Site graffitimundo.com
Quanto US$ 25 (R$ 58)

Fuerza bruta
Onde calle Junin, 1.930 (Centro Cultural Recoleta), na Recoleta
Horário qui., às 21h; sex., às 23h30; sáb., às 19h e às 22h; dom., às 20h
Site fuerzabruta.net (ingressos em ticketek.com.ar/newsite/fuerzabruta)
Quanto de 120 a 160 pesos argentinos (R$ 45 a R$ 60)

MICHAEL KEPP, jornalista americano radicado há 30 anos no Brasil, é autor do livro "Tropeços nos Trópicos - Crônicas de um Gringo Brasileiro" (editora Record)

Tradução de CLARA ALLAIN


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