Folha de S. Paulo


Marido de superexecutiva do Facebook era exemplo de defesa das mulheres

Desde que era aluno de segundo grau, David Goldberg aconselhava as colegas de classe a defender seus próprios interesses.

Como jovem executivo de internet, ele trocava de namorada constantemente, mas se apaixonou de vez por uma amiga muito ambiciosa, Sheryl Sandberg, que viria se tornar diretora de operações do Facebook, a número dois da empresa. Passou anos à espera de que ela retribuísse.

Depois que os dois se casaram, Goldberg incentivou a mulher a negociar com firmeza por salários mais altos e organizava sua agenda para que ele pudesse ficar em casa com os dois filhos do casal, de 10 e 8 anos, quando ela tinha de viajar a trabalho.

Rick Wilking/- 09.jul.2014/Reuters
Sheryl Sandberg, diretora de operações do Facebook, e o marido, David Goldberg, durante evento na Califórnia
Sheryl Sandberg, diretora de operações do Facebook, e o marido, David Goldberg, na Califórnia

Goldberg, que morreu na sexta-feira (1º), aos 47 anos, após cair da esteira ergométrica e bater a cabeça em um resort no México, era um cordial empreendedor do Vale do Silício. Ele transformou sua mais recente companhia, a SurveyMonkey, de modesta start-up em potência avaliada recentemente pelos investidores em US$ 2 bilhões.

Mas também talvez fosse o mais significativo dos homens feministas de sua era: o primeiro presidente-executivo na história recente a incentivar sua mulher a ter sucesso tão grande quanto o dele nos negócios, e figura essencial em "Faça Acontecer" (Companhia das Letras, 2013), o best seller de Sandberg para orientar mulheres quanto ao sucesso profissional.

MODELO

"Eles eram modelos para o que a próxima geração precisa enfrentar e deseja realizar", disse Deborah Spar, reitora do Barnard College. Em discurso a formandos do Barnard, em 2011, Sandberg disse que a escolha de um marido seria a decisão mais importante de carreira de uma mulher.

Na peça "The Heidi Chronicles", que recebeu nova montagem na Broadway neste trimestre, um personagem homem, fundador de uma empresa de mídia, diz: "Não quero chegar em casa e encontrar uma A+" –para explicar sua ambição de se casar com uma mulher que o ajude sem ameaçar sua posição.

Goldberg veio a defender a postura oposta, começando com sua criação em um meio progressista de Minneapolis "onde o poder da mulher estava presente em todos os aspectos de nossas vidas", disse Jeffrey Dachis, amigo de infância dele, em entrevista.

Os pais de Goldberg leram juntos "The Feminine Mystique" [de Betty Friedan, uma das obras fundamentais do feminismo]. De fato, foi o pai de Goldberg que recomendou a obra à mulher, de acordo com o livro de Sandberg. Em 1976, Paula Goldberg -a mãe de Dave Goldberg- ajudou a fundar uma organização sem fins lucrativos para ajudar crianças deficientes. O pai dele, Mel, professor de direito que lecionava à noite, cuidava de preparar o café da manhã da família.

Anos mais tarde, quando Karin Gilford, uma das primeiras funcionárias da Launch Media, a companhia de música digital de Goldberg, teve seu primeiro filho, ele sabia exatamente o que fazer.

Continuou a dar a ela atribuições desafiadoras, recorda Gilford, mas permitiu que trabalhasse em casa um dia por semana. Quando o Yahoo! adquiriu a Launch, Goldberg se tornou conhecido por dar rosas a todas as mulheres da empresa no Dia dos Namorados.

Sandberg, que muitas vezes se descreve como "mandona, mas de um jeito bacana", o encantou quando se tornaram amigos, na metade dos anos 1990. "Ele a queria, mesmo quando estava noiva e casada com outro", recorda Chessen.

CONQUISTA

Depois que o casamento de Sandberg acabou, ela saiu com outras pessoas, mas Goldberg persistiu, e até ajudou na mudança dela e de seu então namorado, recorda Bob Roback, amigo de Goldberg e outro dos fundadores da Launch.

Quando Goldberg e Sandberg enfim se casaram, em 2004, os amigos se lembram de ter pensado como os dois eram parecidos, e que as qualidades que talvez levassem Sandberg a ser intimidadora para outros homens eram exatamente aquelas das quais Goldberg gostava.

Nos dez anos seguintes, Goldberg e Sandberg foram pioneiros em novas maneiras de capturar informações on-line, tiveram um filho e depois uma filha, enriqueceram muito, e decidiram por negociação quem fazia o que em seu casamento.

Para ele, viver em San Francisco e trabalhar em Los Angeles se tornou um problema, e por isso ele se mudou, mais tarde brincando que havia "perdido o cara ou coroa" para decidir onde o casal viveria. Ele pagava as contas, ela planejava as festas de aniversário, e os dois muitas vezes saíam de seus escritórios às 17h30 para jantar com os filhos, voltando a trabalhar depois.

Após o livro "Faça Acontecer", Goldberg gerava em leitoras a reação "mas onde é que eu consigo um desses?" Algumas leitoras lamentaram que os conselhos de Sandberg dependessem demais de um casamento com um cara como Dave Goldberg, humilde o bastante para enquadrar seus planos aos da mulher, atencioso o bastante para se preocupar com os sapatos de sua filha, e rico o bastante para pagar pelos empregados que tornam possível o equilíbrio familiar que eles encontraram.

Agora que ele se foi, e Sandberg deixa de ser metade de uma parceria célebre para se tornar talvez a mais proeminente mulher solteira do mundo dos negócios, as páginas de "Faça Acontecer" passam a trazer a dor de uma perda.

"Jamais estávamos em 50:50 em cada dado momento –uma igualdade perfeita é difícil de definir ou sustentar–, mas permitíamos que o pêndulo oscilasse de um para outro de nós", ela escreveu em 2013, acrescentando que o casal estava aguardando ansiosamente a oportunidade de criar filhos adolescentes.

"Felizmente, tenho Dave para me ajudar a decidir", ela escreveu.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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