Folha de S. Paulo


Especialista em derrotados, Steve Carell surpreende em 'Foxcatcher'

Comediantes costumam seguir um padrão. Em certo momento da carreira, em busca de uma turbinada na autoafirmação, procuram papéis sérios com cheiro de Oscar. Jim Carrey tem seu "O Show de Truman", Robin Williams ganhou a estatueta por "Gênio Indomável" e Bill Murray emocionou com "Encontros e Desencontros".

Agora, chegou a vez de Steve Carell. Especialista em personagens derrotados, daqueles que provocam vergonha alheia, o ator de 52 anos nunca me pareceu particularmente bom. Mas surpreende no que pode vir a ser o grande personagem de sua vida: o milionário psicótico do suspense "Foxcatcher: Uma História que Chocou o Mundo", que estreia no Brasil em janeiro.

Para encarnar o personagem real John du Pont (1938-2010), o ator usou uma prótese para aumentar o nariz e passou por sessões de três horas diárias de caracterização. "Ninguém me via sem maquiagem nas filmagens, e isso ajudou a me distanciar psicologicamente dos outros. Além disso, ensaiamos com o diretor Bennett Miller por seis meses", diz o ator.

O caso que inspirou o filme é pouco conhecido no Brasil. John du Pont era o herdeiro de uma das famílias mais ricas dos Estados Unidos, fornecedora de munições para o Exército. Em 1986, John decidiu patrocinar um time de luta greco-romana e contratou dois atletas: Mark Schultz (Channing Tatum) e seu irmão mais velho, David (Mark Ruffalo). Ele finge treiná-los para um campeonato até que acontece uma tragédia, que não posso revelar aqui. "Há um sentimento de perigo durante todo o filme", diz Steve. "Mesmo quem conhece o episódio ficará surpreso e chocado com o que acontece."

O drama dark, que rendeu o prêmio de melhor diretor em Cannes a Bennett (de "Capote" e "O Homem que Mudou o Jogo"), tem tudo para receber várias indicações ao Oscar. E Steve Carell virou o centro das atenções.

"Você não consegue tirar os olhos dele", escreveu o crítico americano Todd McCarthy, da revista "Hollywood Reporter". "Carell interpreta Du Pont como um Norman Bates moderno misturado com Jay Gatsby", analisou outro crítico, Ramin Setoodeh, da "Variety".

Manuela Eichner

Escolhido pelo diretor exatamente por parecer incapaz de ser cruel ou violento, o ator encontrou no set um modo de atuar parecido com o de suas comédias. "Improvisamos bastante. Bennett falava para esquecermos o que estava no roteiro, para nos concentrarmos nas cenas, usando nossas próprias palavras", diz. "Decidimos jogar a precaução no lixo. Foi difícil porque são personagens verídicos e queríamos honrar a história daquelas pessoas."

Depois de oito anos assistindo ao ator na série cômica "The Office", o público de Steve Carrell vai se surpreender quando descobrir o quão macabro pode ser o intérprete do gerente enganador Michael Scott. E isso, em Hollywood, vale ouro.


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