Folha de S. Paulo


Livro documenta o dia a dia de diretores de escolas pelo país

Depois de percorrer 6.590 km em 37 dias, visitando 30 escolas públicas de 27 cidades em seis Estados, o fotógrafo Eder Chiodetto concluiu que "a humanidade não inventou nada mais revolucionário que o diálogo".
A cada diretor que entrevistava, percebia que as iniciativas para melhorar o nível do ensino no país sempre passavam por uma relação mais próxima com os alunos.

Convidado pelo Instituto Unibanco para documentar gestores de escolas públicas de ensino médio, Chiodetto teve de voltar a fotografar profissionalmente após 15 anos –o último trabalho como fotógrafo publicado pelo curador retratava escritores em seus espaços de trabalho.

Agora, nos ensaios produzidos desde o fim de 2016 e reunidos no livro "Ser Diretor", Chiodetto não só resgata a veia fotojornalística como faz reportagens a partir de entrevistas com os gestores. Nos papos, palavras como "acolhimento", "aproximação", "convivência" e sinônimos aparecem com frequência.

A passagem do campo abstrato para a prática se dá em atividades lúdicas, em que o aluno tem a dianteira do processo. Em Itaiçaba, interior do Ceará, por exemplo, a escola João Barbosa Lima criou a banda Os Pitagóricos para ajudar os alunos a entender matemática -são eles quem criam as letras das paródias a partir do conteúdo que estão aprendendo.

A insistência na participação do aluno em exercícios que fujam do modelo do adolescente preso à cadeira é uma constante para evitar o crescimento da evasão escolar.

"O processo educacional é, em geral, verticalizado", diz Chiodetto. "O estudante raramente tem algum protagonismo no processo. Recebe um pacote que lhe é imposto e que invariavelmente não é um modelo que dialoga com seus anseios e necessidades."

As escolas visitadas tem o projeto Jovem de Futuro em comum. Criado há dez anos pelo Instituto Unibanco, o programa oferece, em parceria com secretarias de Educação, assessoria técnica e formação em diversas etapas do processo educacional.

Ainda que os casos de melhoria nos índices escolares chamem a atenção, "Ser Diretor" também exibe os inúmeros problemas sociais e de infraestrutura que consomem a educação no país. Por isso, explica Chiodetto, tanto as imagens das escolas quanto os retratos dos gestores foram editados em preto e branco. "Não é um livro alegre. Para falar de educação pública no Brasil não dá para atingir as cores", afirma.

Chiodetto cita, por exemplo, o momento em que entrevistava a diretora do colégio Professor Antônio Marco de Araújo, em Luziânia, no Estado de Goiás, quando quatro alunas entraram na sala para relatar ameaças de violência e assédio na saída da escola.

Os casos que envolvem a presença do tráfico de drogas se multiplicam durante o livro, e um dos colégios recebeu o apelido de "Carandiru", enquanto outro tinha paredes pichadas com os nomes de alunos e as palavras "luto" e "deixa saudade".

O núcleo familiar também é uma questão. Os pais muitas vezes não acompanham a vida escolar dos filhos e, quando há cobranças para impedir que os adolescentes deixem a escola, alguns reagem com agressividade, dizendo que os diretores estão atrapalhando a vida deles.

Fora a violência, alguns dos problemas relatados parecem até anedóticos. Na escola Job Pimentel, em Mantenópolis, no Espírito Santo, o local até dispõe de ar-condicionado para colocar nas salas, mas a rede elétrica não suporta. Outra, em Santarém, no Pará, funciona sem muros há dez anos, após um desabamento. Por isso, o local é invadido e assaltado com frequência.

São situações que a diretora Luciana de Sousa, de Santarém, enfrenta como uma maestrina: se não tiver harmonia entre os setores da escola, a música desafina.

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"SER DIRETOR"
Autor Eder Chiodetto (Instituto Unibanco)
Quanto Disponível gratuitamente no site livroserdiretor.org.br


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