Folha de S. Paulo


País precisa desmistificar a ideia de diretor "herói", dizem diretoras

O Brasil precisa desmistificar a ideia de que o diretor da escola pública precisa atuar como um "herói", capaz de resolver individualmente problemas graves do ensino brasileiro, como falta de infraestrutura e evasão escolar.

"Não existe um herói na escola. Existe uma equipe a ser mobilizada por um gestor", afirma Elba Alves da Silva, que dirigiu a escola estadual Tristão de Barros, em Currais Novos, no Rio Grande do Norte, de 2012 a 2016. Hoje, Elba Silva é diretora-geral de Educação e Cultura do município.

"Temos uma grande responsabilidade: entregar os alunos à sociedade com as competências necessárias para a vida e as condições que nos são dadas de formação não são suficientes ao chegar na gestão", afirmou.

Cinco diretoras do Espírito Santo, Rio Grande do Norte, Ceará, Goiás e Piauí debateram os desafios da gestão escolar nesta quarta (27), no primeiro dia do seminário promovido pela Folha, em parceria com o Instituto Unibanco e o Consed (Conselho Nacional de Secretários de Educação).

Elba Silva conta que, em 2012, o Rio Grande do Norte liderava o ranking brasileiro de evasão escolar. Seu desafio era reduzir o índice de reprovação e implementar um redesenho curricular por um novo programa do Estado, chamado Ensino Médio Inovador.

Em quatro anos, o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) da escola Tristão de Barros aumentou de 3,8 para 5,1. A reprovação caiu de 11% para 5%, e o abandono escolar, de 2,4% para 0,5%. Para melhorar o desempenho escolar, foi preciso elaborar uma gestão mais técnica: "E a técnica a gente não tem", declarou. "Tivemos que aprender na prática."

Na Tristão de Barros, isso foi feito através de uma avaliação institucional. A escola aplicou diversos questionários para alunos e professores. Descobriu-se, por exemplo, que os alunos não sabiam interpretar textos.

"Fazendo entrevistas, vimos que eles precisavam ler o enunciado de uma prova até três vezes para entender o que estava sendo pedido, e ainda sim não conseguiam dar a resposta demandada", relatou. Mesmo com bons resultados em sua gestão, Silva critica um ponto crítico que possuía ao assumir a escola: os diretores não recebem uma formação técnica adequada. "Tem incêndio para apagar todos os dias, e a gente se pergunta: onde foi que eu perdi essa aula de gestão escolar pública?"

No Rio Grande do Norte, a escolha dos diretores de escola é regida por uma lei de gestão democrática, e pessoas licenciadas em qualquer área de conhecimento podem pleitear um cargo de direção _mas os cursos de licenciatura não ensinam teorias ou técnicas de administração escolar.

"A formação inicial dos professora precisa ser revista", afirmou Claudete Silva do Nascimento Radaelli, assessora da Secretaria de Educação do Espírito Santo. "O diretor da rede pública foi formado professor, e um bom professor não necessariamente será bom em dirigir um colégio", disse.

Durante 23 anos, Claudete Radaelli dirigiu a escola estadual Clóvis Borges Miguel, na Serra, região com alto índice de criminalidade. O trabalho à frente da unidade foi intenso. "Eu fazia a mediação entre os conflitos na escola".

Ela listou a avaliação institucional, feita através de diálogo com os alunos, como chave para obter melhores resultados.

EVASÃO

Segundo as diretoras, o combate à evasão durante o ensino médio é um dos maiores desafios dos gestores. "Muitos alunos não tem um projeto de vida ou expectativa de continuar a estudar. Então eles perdem a vontade de continuar na escola", disse Elba Silva.

Ireni Soares da Mota, diretora do colégio estadual Dona Genoveva, em Itaguari GO), diz ter procurado meios para contornar a falta de mobilização dos jovens para os estudos no município de 4.000 habitantes.

"Em cidade pequena, o papel de trazer o aluno para aula é muito grande. Muitos vão para comer o lanche, e isso era criticado. Por quê? Se é por aí que nós vamos, é por aí que vamos fazer. O gerente de merenda faz churrasco na às sextas-feiras para os meninos, e eles vêm às aulas", declarou Ireni Mota, que aos domingos conta com a ajuda do marido ("meu braço direito") para fazer serviços de limpeza e zeladoria na unidade.

Francisca Rozimar Alves Belém de Morais conseguiu zerar a evasão na escola estadual Irmã Ana Zélia da Fonseca, em Milagres, no Ceará. O resultado, segundo ela, foi obtido pela mobilização de diferentes órgãos da cidades.

"Se um aluno passa alguns dias fora da escola, vamos atrás dele para entender os motivos. Se necessário, acionamos quem for preciso: Conselho Tutelar, Ministério Público, tudo para manter o jovem na escola", afirma.


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