Folha de S. Paulo


Economia Limpa só precisa de obediência às leis, dizem especialistas

O estímulo a uma economia limpa, com baixa emissão de carbono e amplo reaproveitamento dos materiais recicláveis nas cadeias produtivas depende do cumprimento pleno das leis já existentes no Brasil, como a Política Nacional de Resíduos Sólidos, sancionada em 2010.

A própria Constituição Federal também permite que outros instrumentos, como a desoneração fiscal de setores que utilizam tecnologias limpas, sejam utilizados com esse objetivo.

Essa foi a conclusão do primeiro dia do Fórum Economia Limpa, realizado pela Folha, Abralatas (Associação Brasileira dos Fabricantes de Latas de Alta Reciclabilidade) e Novelis, na manhã desta segunda-feira (20) no auditório Unibes Cultural, em São Paulo. O evento continua amanhã (21), a partir das 9h.

O ministro do Meio Ambiente José Sarney Filho abriu o ciclo de debates, defendendo que os municípios da região Norte e Nordeste do país recebam recursos do Fundo Clima e Fundo Amazônia para impulsionar investimentos nas áreas de saneamento e gestão do lixo urbano.

O Fundo Amazônia é composto por doações de países como Noruega e Alemanha e conta ainda com recursos ainda de compensação ambiental da Petrobras. Já acumula mais de R$ 1 bilhão em projetos aprovados, mas sua atuação está concentrada em apenas seis municípios.

Segundo Sarney Filho, os recursos vindos dos fundos ajudariam na destinação correta do lixo e na melhoria dos índices de saneamento básico nas duas regiões, que contam com os menores índices de cobertura do país. "O processo de recuperação ambiental pode atuar como gerador de emprego e renda", disse o ministro.

Sarney Filho anunciou ainda que o governo vai propor um projeto de lei para desburocratizar e dar mais agilidade aos processos de licenciamento ambiental, que são considerados muito demorados pelos empreendedores. O plano é rever os atuais prazos para concessão das licenças. "Não vamos mexer nas exigências, não vamos facilitar, não vamos flexibilizar. Vamos apenas desburocratizar", disse ele.

Foi consenso entre os participantes que as leis brasileiras já trazem instrumentos suficientes para estimular a economia verde. A Política Nacional de Resíduos Sólidos é o maior exemplo: a lei trouxe princípios inovadores para a gestão do lixo no Brasil, como a responsabilidade compartilhada entre poder público, empresas e consumidores pela destinação dos resíduos, a logística reversa dos materiais e a inserção dos catadores de recicláveis nessa cadeia.

Graças à lei, esses profissionais passaram a ser vistos com outros olhos, afirmou Roberto Rocha, representante do Movimento Nacional dos Catadores.

"Antes, as crianças achavam que o catador era o homem do saco, tinham até medo. Não tínhamos reconhecimento como parte de uma política pública", disse Rocha. Apesar disso, ainda falta um olhar das prefeituras para que incorporem, oficialmente, os catadores nos serviços de coleta e destinação dos resíduos.

Embora seja uma lei avançada, ela ainda esbarra nas dificuldades para o cumprimento das metas. Uma delas previa a extinção dos lixões até 2014, que acabou sendo postergada para 2018. Cidades importantes como Brasília ainda dispõem seus resíduos de forma inadequada.

"Brasília tem o maior lixão do Brasil, mesmo sendo a cidade com maior renda per capita do Brasil. A gente não pode mais aceitar isso", afirmou Victor Bicca Neto, presidente do Cempre (Compromisso Empresarial para a Reciclagem) e diretor da Coca-Cola. A entidade está à frente do acordo setorial assinado com o Ministério do Meio Ambiente no ano passado para reforçar os sistemas de coleta seletiva de embalagens.

Para as empresas, o grande desafio de uma economia mais limpa, com maior eficiência e menor geração de resíduos, é incorporar a sustentabilidade em toda a linha de produção, do fornecedor até o consumidor final.

Políticas públicas podem auxiliar no processo, como incentivos fiscais e tributários para produtos com menor impacto ambiental, na avaliação de Carlos Medeiros, membro do Conselho Diretor da Abralatas. "Um tratamento tributário diferenciado permitiria fazer a distinção a distinção de produtos que cumprem metas ambientais", disse.

Para o jurista Ives Gandra Martins, todos os impostos existentes hoje no Brasil poderiam ser usados para incentivar medidas favoráveis ao meio ambiente, mas a crise econômica atual dificulta que esses instrumentos sejam usados, pois Estados e municípios temem perder arrecadação. "O IOF, ITR e IPTU são exemplos de impostos que poderiam ser utilizados para estimular a economia verde", disse Martins.


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