Folha de S. Paulo


Para médico, 'antiético' é não testar medicamentos em brasileiros

João Massud Filho, médico e presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Farmacêutica criticou a fraca presença do Brasil nos projetos de pesquisa clínica e disse que a dificuldade de se realizar testes em pacientes no país é antiético com a população. Massud foi o último convidado a falar no Fórum a Saúde do Brasil, organizado pela Folha, que terminou nesta quinta-feira (27).

"A aprovação ética no Brasil é complicada, existe uma tutela sobre os pacientes. A Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) rejeita os projetos porque está dizendo que o paciente não pode ser submetido à pesquisa."

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Para ele, as restrições prejudicam a eficácia dos tratamentos aplicados aqui. "Como médico, digo que antiético é desenvolver um produto na Finlândia, com todo o respeito ao país, e vir usá-lo no Brasil, na 'raça brasilis' que nem sabemos qual é, dada a diversidade étnica que temos."

Para o convidado, os entraves ao desenvolvimento de novos tratamentos causam prejuízo social, científico e econômico ao país. "[Muitos] pacientes morrem esperando para serem incluídos em um projeto de pesquisa, porque não há tratamento para sua enfermidade. Perdemos desenvolvimento tecnológico, ingresso de dinheiro e competitividade", afirma

Segundo o especialista, pesquisas do tipo permitiram o desenvolvimento dos transplantes de órgãos e de medicamentos contra doenças como câncer e Aids. "Com isso, conseguimos a diminuição da mortalidade e a melhoria da qualidade de vida das pessoas".

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ATRASO NACIONAL

Massud Filho também criticou a redução da pesquisa desenvolvida no Brasil. "Nos últimos cinco anos, o Brasil involuiu 3% [no número de projetos]. A Argentina cresceu 2%, a China mais de 15% e a África do Sul, 2,8%."

Uma das causas, segundo ele, seria a demora com que os projetos são aprovados no país e a ausência do tema na agenda governamental, além das complicações éticas para se iniciar um estudo clínico.

O convidado argumentou que os investimentos da indústria farmacêutica mundial em pesquisa e desenvolvimento chegam US$ 80 bilhões por ano. O Brasil, de acordo com Massud, está em sétimo lugar na lista dos dez maiores mercados farmacêuticos do mundo, mas recebe menos de 1% dos investimentos do setor.

"Precisamos pensar qual é o caminho que queremos para o Brasil", pontuou. "Ser o país que vende commodities ou [aquele] que possa vender tecnologia?"

DEBATE

Os desafios das pesquisas clínica e farmacêutica também foram abordados durante o Fórum a Saúde no Brasil por Antônio Britto, presidente-executivo da Interfarma.

Na manhã desta quarta-feira (26), Britto criticou a falta de incentivos à inovação e a dependência que o Brasil ainda tem das tecnologias estrangeiras. "Hoje, quanto maior é o acesso à saúde, mais a gente se torna dependente. Há um deficit crescente na balança comercial [de medicamentos e tecnologia]", disse.

Tanto Massud quanto Britto defenderam posições semelhantes sobre as soluções para superar os entraves na inovação: diálogo mais estreito entre academia, pesquisadores, governo e indústrias.

Organizado pela Folha, o Fórum a Saúde do Brasil reuniu especialistas e profissionais do setor durante as manhãs desta quarta (26) e quinta-feira (27).

Entre os palestrantes, estiveram no seminário o ministro da Saúde, Arthur Chioro; David Uip, secretário estadual da saúde de São Paulo; e o médico Drauzio Varella.


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