Folha de S. Paulo


'Fui baleado e continuei filmando', diz cineasta, destaque de mostra árabe em SP

Até o dia 16 de setembro, o CineSesc e o Centro Cultural Banco do Brasil recebem a 8ª Mostra Mundo Árabe de Cinema. A seleção de 23 filmes, entre ficções e documentários, aborda temas relacionados a diversidade cultural, social e política de países árabes. Os ingressos custam R$ 4.

O evento tem curadoria de Soraya Smaili e Geraldo Adriano Godoy de Campos, Diretor Cultural do Instituto da Cultura Árabe (ICArabe) e é dividido em duas atrações: "Sessão Mundo Árabe", com clássicos e inéditos, e a "Sessão Diálogos Árabe-Latinos", com produções brasileiras e latino-americanas relacionadas a mesma temática.

Um dos destaques é o palestino "Cinco Câmeras Quebradas", de Emad Burnat, 41, que está no Brasil para a mostra. O longa que foi indicado ao Oscar de Melhor Documentário em 2013 intercala imagens de momentos familiares com cenas da resistência à ocupação israelense na Cisjordânia.

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A sãopaulo conversou com o diretor. Confira abaixo.

sãopaulo - O que o motivou a continuar filmando mesmo depois de ter as câmeras quebradas em conflitos?
* Emad Burnat -* A minha responsabilidade. Eu era o único com uma câmera em Bil'in [vila onde mora]. Precisava mostrar o que estava acontecendo. Outros filmes sobre a Palestina foram feitos por pessoas de fora, mas eu queria fazer algo diferente. Nossa vida é política também, mas quando falamos dos filhos, dos amigos, da família, tocamos as pessoas.

Que tipo de represália você sofreu durante as filmagens?
Fui atingido por balas e bombas de gás lacrimogêneo, além de ter sido preso duas vezes pelo Exército israelense. Uma vez fui baleado e continuei filmando.

Você diz que o público se transforma ao assistir o longa.
A maioria dos jornais não conta tudo o que acontece nesses conflitos, não se aprofunda. No documentário, o público assiste à vida real, testemunha a ocupação e muda a maneira de pensar sobre a Palestina.

Existe um outro lado dessa história? Dos israelenses?
Eu queria contar a minha história. Mostrar como uma família palestina vive sob a ocupação israelense. O outro lado está lá [no filme]! Os soldados estão fazendo seu trabalho. Alguns só observam. Parece que não querem estar envolvidos, não querem usar violência. Mas a maioria pensa apenas em servir o Estado.

Você gravou a maior parte do material sem ajuda de terceiros e utiliza alguns recursos interessantes.
Os recursos são acidentais (risos). Gravei com câmeras diferentes que apresentavam formatos distintos. O fato delas terem sido atingidas por balas também afetou um pouco a configuração.

Quais suas referências cinematográficas?
Não tenho costume de assistir documentários. Gosto de filmes de ação com o Robert De Niro, com a Jennifer Lopez e o Ben Affleck, que conheci no Oscar. Mas quem é uma inspiração mesmo é o Michael Moore. Ele é honesto e sempre apoia os direitos humanos. Somos amigos hoje.

Falando nisso, como foi concorrer ao Oscar?
Uma honra! Principalmente porque foi o primeiro documentário palestino a ser indicado. O mais importante é representar o país, mostrar o que estava acontecendo.

Você continua filmando. Pensa em fazer um novo filme?
Pretendo, mas quero observar por enquanto. Esperar um pouco para ver o que vai acontecer para fazer algo diferente. Agora eu queria criar uma escola de cinema em Bil'in para ensinar as crianças a mexerem em câmeras. Lá não há leis de incentivo para financiar esse tipo de projeto, mas estou buscando apoio financeiro.

O que mudou na sua vida após "Cinco Câmeras Quebradas"?
Eu fiquei famoso, o filme ganhou reconhecimento internacional. Mas nada mudou no meu dia a dia. Ainda sou uma família que vive sob a ocupação israelense. Um muro caiu, mas criaram outro. Conheci muita gente que se oferece para ajudar, mas quando falo o que quero ou preciso, eu não consigo ajuda. E para continuar fazendo isso eu não consigo sozinho. Preciso de ajuda.

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