Folha de S. Paulo


Paulistanos passam a usar praças e parques para aniversários e piqueniques

A publicitária Ximena Buteler decidiu comemorar seu 26º aniversário com um piquenique. Escolheu o parque Buenos Aires, na região central de São Paulo, como cenário.

No dia marcado, um sábado, cobriu o gramado com toalhas coloridas e posicionou cestas com comidinhas. No cardápio, quitutes familiares e sanduíches feitos sob encomenda em uma padaria 24 horas.

"Quis fazer isso porque meu apartamento é minúsculo e nem minha família caberia", afirma.

Ximena driblou, assim, um problema comum para aniversariantes na cidade: a escassez de lugares baratos para alugar e de bares ou casas noturnas que não cobram entrada.

Para se ter uma ideia: um espaço para cem pessoas varia de R$ 3.000 a R$ 8.000, segundo a agência de eventos The Front. Outros endereços requisitados, como o Galpão Cabaret, na Vila Leopoldina (zona oeste), cobram por volta de R$ 7.000.

Já prédios costumam pedir porcentagem do salário mínimo ou do condomínio para reservar o salão de festas.

"Falam da Europa, que lá as pessoas ocupam as ruas, têm opção ao ar livre, e a gente inveja... Olha este lugar, é um privilégio", diz Ximena.

'ALGO DESCOMPROMISSADO'

Mas nem tudo são flores para quem busca alternativas a céu aberto. Tempo fechado, por exemplo, pode ser um banho de chuva fria.

No aniversário de Ximena, em maio, o clima virou no fim de semana. "O plano B era o salão do edifício do meu namorado." Não precisou acioná-lo: o sol acabou saindo.

A alguns metros dali, outra comemoração, com bexigas coloridas e bolhas de sabão. O jornalista Thiago Perin, que apagava 25 velinhas, queria "algo descompromissado". "Acho um absurdo meus convidados pagarem entrada para o meu aniversário."

Natureza e sossego são outro chamariz dos lugares públicos.

Os publicitários João Paulo Porto, 25, e Rebecca Kelch, 25, fizeram o aniversário de um ano do filho Jonas no Jardim Botânico, na zona sul. O pai confessa: "Para ser bem sincero, o aluguel do salão de festas é muito caro. E aqui a criançada fica com pé no chão, no meio do mato".

A estilista Fernanda Cannalonga, 24, também queria fugir do caos urbano. E o parque Alfredo Volpi (zona sul) tinha estrutura: mesas, banheiros próximos e estacionamento gratuito.

"Moro do lado do Ibirapuera, mas aqui é mais calmo. Se fizesse num barzinho não teria sagui [os macaquinhos apareceram durante o piquenique], e as pessoas estariam mexendo nos celulares."

Ela acredita, porém, que os insetos e a localização atrapalharam. "Não é perto do metrô, alguns convidados tiveram que vir de táxi. Também foi difícil explicar onde eu estaria exatamente dentro do parque."

REGRAS DO JOGO

Às vezes o biólogo Cesar Pegoraro, 40, administrador do Alfredo Volpi, precisa estragar a festa: já vetou uma para 500 pessoas (quase ninguém pede autorização formal, mas em eventos grandes é melhor consultar antes).

A Secretaria do Verde e do Meio Ambiente não sabe precisar quantas confraternizações acontecem nos 97 parques sob sua responsabilidade.

Algumas restrições são comuns a todos eles. Por exemplo: é proibido distribuir brindes e usar bexigas, para evitar que animais comam o material (norma descumprida pela maioria).

Cada canto possui, ainda, normas específicas. No Jardim Botânico, produções mais elaboradas, nem pensar: só piqueniques simples. Já o Ibirapuera tem um documento de mais de 20 páginas com limitações para eventos.

As praças oferecem mais liberdade. Nelas, dá para pôr música até 22h. Mas há entraves como falta de iluminação, de segurança e de estrutura.

Tem também a reclamação dos vizinhos. Moradores próximos à praça do Pôr do Sol, na Vila Madalena (zona oeste), criticam o som alto e a sujeira deixada para trás. Para o professor Roberto Moisés, 50, que reside nos arredores, "tem que respeitar o que o outro quer ouvir, fazer, sentir".

Aí sim, continua, "teremos o espaço de convívio que um dia já existiu".


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