Folha de S. Paulo


Oito paulistanas contam as delícias e os dissabores da gravidez

Ser mãe é padecer num paraíso." A frase pode soar datada e fora de moda, mas só quem é, ou quer ser uma, sabe que o escritor maranhense Coelho Neto (1864-1934) não estava errado quando a colocou no poema "Ser Mãe".

As dúvidas são muitas, as respostas também. Parto normal ou cirúrgico? Segundo a obstetriz Cristina Balzano, "melhor normal e de cócoras, pois a gravidade ajuda o feto a sair". "Mas quero na água, dizem que é mais relaxante para mim e o bebê", diz a arquiteta Camila Salomão, 31.

Há ainda as que preferem, por medo da dor ou outros receios, marcar a data da cesárea meses antes.

E os exercícios prejudicam a gravidez? O educador físico Alexandre Alves diz que, "se mãe e filho estiverem saudáveis, eles diminuem os problemas físicos da gestação". "Porém, minha médica os proibiu, mesmo que não tenhamos qualquer problema", lamenta a modelo Carol Trentini, 25, grávida de um garoto.

De primeira ou segunda viagem, radicada no Brasil ou fora dele, uma das maiores modelos do mundo ou uma atendente de posto de gasolina, oito mulheres contam como é a maternidade antes de o bebê nascer.

DOCE DESEJO

Filha de doceira, Maria está há apenas dois meses no útero e já faz jus aos genes que herdou. Sua mãe, Isabel Fortes, 29, sócia da Brigadeiro Doceria & Café --eleita a Melhor Doceria pelo júri de "O Melhor de sãopaulo Guloseimas 2012"--, precisa de todo o autocontrole possível para não atacar a vitrine do estabelecimento.

"Na primeira gravidez, engordei mais de 19 kg. Nesta, a segunda, sou acompanhada por um nutricionista e faço exercícios regularmente. Porque o desejo é enorme", afirma.

Se o primeiro filho, Joaquim, de 11 meses, mudou sua vida, Maria veio para sacudi-la de vez.

"Quando casamos, há quase dois anos, meu marido e eu compramos um apartamento maior, de dois quartos, para apenas um bebê. Com esta surpresa, tivemos de nos mexer e trocar por um de três", diz ela, que, apesar de não ter planejado uma gravidez tão próxima da outra, não se preocupou em se proteger.

"Esperamos Joaquim completar sete meses para passar uns dias na Califórnia a sós. Daí, já viu, né?", conta ela, que não pensa em fechar o forno. "Mas, calma. Só vamos pensar no terceiro depois de criarmos os dois. É trabalho demais ao mesmo tempo."

HUMANIZAR É PRECISO

MÃES E BEBÊS
Tudo o que é importante saber para aproveitar este feliz momento da vida

Camila Salomão, 31, acredita que, ao lado do amor entre mãe e filho, não pode haver dor. E, se no parto normal ela é inevitável, que seja, pelo menos, minimizada. A arquiteta engrossa a lista de mães que optam pelo parto humanizado, no qual a mulher escolhe, além do local em que dará à luz, a posição --de cócoras e deitada de lado são as mais comuns-- que deseja para ter o filho.

"Quero ter o meu na água", afirma a grávida de três meses. A água morna, de acordo com os apoiadores da prática humanizada, diminui o impacto da mudança de temperatura ambiente da barriga da mãe para o mundo exterior, o que faria o bebê sofrer menos.

"Além disso, a luz mais baixa, a música e a figura da obstetriz [parteira] me deixam mais calma", conta a arquiteta, que tentou, em sua primeira gravidez, dar à luz dentro da banheira de um hospital.

"Mas ela era muito pequena, me senti desconfortável. Além disso, estava cansada, devido às 15 horas que passei em trabalho de parto. Acabei tendo de fazer uma cesária", diz, com a esperança de que, dessa vez, tudo seja diferente.

"É mais fácil parir quando você acredita que seu sofrimento e o do seu filho serão minimizados ao máximo. Da primeira vez, fiz até escova no cabelo para ir ao hospital."

EXCESSO DE COMPATIBILIDADE

A jornalista de moda Helena Campos, 37, relutou até contar às pessoas que estava grávida. É que, depois de tentar engravidar diversas vezes, sem sucesso, ela procurou ajuda médica e descobriu que seu corpo não reconhecia o sêmen do marido como algo estranho --fator crucial para a preparação do organismo da mulher após a fecundação.

O problema resultava em abortos espontâneos e, às vezes, imperceptíveis. "Não nos preocupávamos em ter um filho. Mas, depois que descobrimos o problema, isso se tornou um peso", conta Helena.

Uma vacina desenvolvida por meio da imunoestimulação com linfócitos, na qual são mescladas amostras do sangue do casal, foi a saída encontrada pelos médicos. "Tomei várias doses desse 'remédio' até que ele fizesse efeito", conta.

E fez. Há quatro meses, Rosa, como se chamará sua filha, aumenta em três vezes a feira de frutas dos pais. "Porque me controlo, senão devoraria tudo o que visse pela frente."

Editora de um site de moda, Helena se preocupa com o corpo e faz de tudo para ainda caber em suas roupas. "Sempre fui muito magra, até pelo meio em que trabalho. Estou levando numa boa o fato de a barriga crescer", diz. "Mas já percebi que terei problemas com o guarda-roupa. Já viu como as roupas para grávidas são horrorosas?"

BEBÊ NA PASSARELA

Se dizem que vida de modelo não é fácil, vida de top que está no Models.com --referência para a indústria da moda-- nem se fala. Além de lidar com a agenda (requisitada) de trabalho, a gaúcha Carol Trentini, 25, tem de enfrentar a agenda dos médicos, dos ultrassons constantes e do marido, o fotógrafo Fábio Bartelt.

"E ainda tenho de ouvir que minha barriga não é grande, é falsa", diz, referindo-se ao furdunço que gerou nas redes sociais uma foto postada por ela do abdôme de recém-completados cinco meses de gestação. "Fiquei arrasada, não se fala isso para uma mãe. Olha agora. Esticou. Sou magra e alta, claro que ia demorar para aparecer."

Como quase qualquer grávida, Carol diz que anda sensível, "chorando por tudo", e que sofre com a falta de doces. "Comia muito, mas agora enjoo logo. Porém, ando comendo muito churrasco", conta. Todos os dias, usa um sonar portátil para ouvir o coração do primeiro filho, que "deve ter o segundo nome igual ao do meu falecido pai, Jacob". "Também canto de tudo para ele."

Sobre criar o rebento fora do país, como a maioria das tops, é taxativa: "De jeito nenhum. A formação dele será aqui. Temos um apartamento em Nova York, mas quero mantê-lo perto da família, para que cresça com os nossos valores", explica.

Ela e o marido, que mantêm um apartamento em São Paulo, estão construindo uma casa em Balneário Camboriú, litoral de Santa Catarina, para as férias da família. "Penso em ter vários filhos. O próximo deve vir logo, os outros, mais para frente. Ainda quero trabalhar muito."

JORNADA DUPLA

A coordenadora de tecnologia da informação Angela Matos, 30, é chamada carinhosamente pelo marido de "planilha de Excel ambulante".

"Talvez por trabalhar em um banco, sou organizada ao extremo e planejo tudo com cuidado", diz ela. "Ainda bem, porque, para aguentar o ritmo que vou enfrentar, só com muita paciência e organização."

No sexto mês de gestação dos gêmeos idênticos Ricardo e Gustavo, Angela teve de fazer o caminho inverso da maioria das grávidas pela sua saúde e a dos filhos: "Enquanto os médicos, em geral, recomendam repouso às gestantes, eu tive de me movimentar, porque passo o dia inteiro sentada", explica.

Duas vezes por semana, treina pesado com o preparador físico Alexandre Alves, dono da clínica Body Pregnancy Fit, no Itaim Bibi, zona oeste. "Ainda tiro uma hora e meia para passear durante o dia."

Na contramão do que se imagina de uma mãe prestes a ter gêmeos, Angela não concebe a ideia de ter de comprar tudo igual para os dois.

"Acho que os pais devem estimular os filhos a terem sua própria personalidade. Os meus irão nascer juntos, são idênticos, mas não significa que serão totalmente iguais", diz a executiva.

VIDA NOVA, CASA NOVA

É atrás do balcão de um posto de gasolina nos Jardins, zona oeste, que Tâmara Santos, 21, sonha com a chegada de Lucas. Quando descobriu estar grávida, a atendente de uma rede de lojas de conveniência viu sua vida girar. "Nunca quis ter filhos. Mas, com a notícia, fiquei louca. Comprei tudo o que vi pela frente, do berço às roupinhas", conta.

Sem ter nascido, o garoto já uniu as famílias dos futuros pai e mãe. O marido, o frentista Ramon Falcão, 26, resolveu que era hora de sair do apartamento de um cômodo em Cidade Tiradentes, na zona leste, e pediu à mãe que cedesse um pedaço de terra no fundo de sua casa, que fica no mesmo bairro.

O padrasto da gestante, pedreiro, se encarregou de construir a pequena casa que irá abrigar a nova família e prometeu que, até o nascimento, tudo estará pronto.

"Uma pena é que vou ter de sair do emprego, que adoro. Aqui, teria de trabalhar no sábado e não quero passar o fim de semana longe do meu filho", diz Tâmara.

Mesmo com o corpo mais pesado e os passos lentos, ninguém pode dizer que ela faz corpo mole. De meia em meia hora, a atendente se reveza com uma colega na organização da loja, ora colocando as fornadas de salgados na vitrine, ora no caixa recebendo o dinheiro dos clientes. "Esse é meu exercício diário."

FILHA HIPERATIVA

No Dia da Mentira, em 1º de abril, Sara pregou uma peça em Juliana Lima, 26. Com oito meses na barriga da mãe, chutou e empurrou tanto o útero que parecia não aguentar mais tanta tranquilidade. Queria sair.

"Ela é que nem eu. Não suporto mais ficar parada na cama." A analista de departamento pessoal está de repouso absoluto desde o quase parto prematuro. Por ter de ficar em casa sem se exercitar, sente dores por toda a região da lombar.

"Ia, religiosamente, às 7h para o trabalho e só voltava à noite. Andava muito e malhava. Com a gravidez, ficou difícil até subir escadas", conta. "Minha barriga cresceu bastante e Sara troca a todo momento de posição", diz a gestante, que nem passa a mão na barriga quando a filha fica ouriçada.

"Se não, ela chuta ainda mais, só falta me bater", brinca. Os exercícios semanais próprios para grávidas também foram proibidos pelo médico. "Ia de ônibus ou trem até a academia para gestantes. Saía de casa [em Parelheiros, no extremo sul da cidade] e voltava sem dor alguma.

Após o parto, a primeira coisa a fazer é voltar aos exercícios, diz a gestante. Se Sara deixar, é claro.

SOTAQUE ITALIANO

Esportista, massoterapeuta, hoteleira e, aos 29, mãe de segunda viagem, Thaís Cruz e Silva mudou toda sua rotina e, de quebra, a do marido, para ter o filho no Brasil. O casal vive na região de Aleghe, no norte da Itália, onde são donos de dois hotéis conhecidos por suas estações de esqui.

"É um ambiente de aventura numa paisagem muito bonita. No entanto, não há nada comparável ao carinho da família nesse momento", diz a paulistana, mãe de Sofia, 3.

O marido "engravidou" junto com a mulher, deixando tudo para trás na pequena cidade italiana para passar o último mês de gestação na companhia dela. No dia da foto, há mais de duas semanas, ela estava prestes a dar à luz --o garoto Noah nasceu no último dia 13.

Ciente de que as diferenças culturais podem distanciar os filhos das origens brasileiras, Thaís fala tudo em português. "A criança capta todos os sons e assimila as línguas facilmente. Não vou deixar de falar na minha língua com meus filhos."

Apaixonada por esqui e corrida, ela não vê a hora de completar o mínimo de 20 dias de repouso do pós-parto para voltar a suar. "Toda mulher deveria se exercitar. Eu me sinto muito mais tranquila e certa de que, em forma, a gravidez não se torna um problema."


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