Folha de S. Paulo


Leia a transcrição da entrevista de Eduardo Campos à Folha e ao UOL - Parte 1

Eduardo Campos, pré-candidato a presidente pelo PSB, participou do Poder e Política, programa da Folha e do "UOL" conduzido pelo jornalista Fernando Rodrigues . A gravação ocorreu em 29.abr.2014 no estúdio do UOL em São Paulo.

Leia a transcrição da entrevista de Eduardo Campos à Folha e ao UOL - Parte 2

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Eduardo Campos - 29.abr.2014

Narração de abertura [EM OFF]: Eduardo Henrique Accioly Campos tem 48 anos. É economista formado pela Universidade Federal de Pernambuco.

Eduardo Campos começou sua militância política como presidente do Diretório Acadêmico da Faculdade de Economia, em 1985. No ano seguinte, trabalhou na campanha que elegeu seu avô, Miguel Arraes, governador de Pernambuco, e tornou-se seu chefe de gabinete.

Eduardo Campos filiou-se ao PSB em 1990, quando conquistou seu primeiro mandato, como deputado estadual. Quatro anos depois, elegeu-se deputado federal, mas permaneceu no governo de Pernambuco, como secretário de Governo e, em seguida, da Fazenda.

Eduardo Campos reelegeu-se deputado federal em 1998 e 2002. Integrou a bancada de apoio ao governo do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em 2004, Lula nomeou Eduardo Campos ministro da Ciência e da Tecnologia.

Eduardo Campos assumiu em 2005 a presidência nacional do PSB. No ano seguinte, elegeu-se governador de Pernambuco, e em 2010 foi reeleito para o cargo.

Eduardo Campos rompeu a aliança histórica que mantinha com o PT e, em 2013, recebeu o apoio da ex-senadora Marina Silva. Em abril de 2014, Eduardo lançou-se pré-candidato à Presidência da República, tendo Marina como sua vice.

Folha/UOL: Olá, bem-vindo a mais um Poder e Política - Entrevista. Este programa é uma realização do jornal Folha de S.Paulo e do portal UOL. A gravação é realizada aqui no estúdio do UOL, em São Paulo. E o convidado desta edição do Poder e Política é o pré-candidato a presidente pelo PSB, ex-governador de Pernambuco, Eduardo Campos.

Folha/UOL: Olá, como vai o sr., tudo bem?
Eduardo Campos: Olá, Fernando. Tudo bem.

O sr. mencionou, nesta semana, que a inflação no Brasil, cuja meta é de 4,5% com uma tolerância de dois pontos para mais ou para menos, que a meta de 4,5% pode ser atingida no Brasil até o ano de 2018. Tem como ser antes?
Fernando, o brasileiro está se sentindo, sobretudo, mais pobre ao comprar alimentos no supermercado a cada semana, a cada quinzena, que a inflação, na vida das pessoas, está até maior que o indicador oficial. Nós precisamos preservar essa conquista, que é a conquista da estabilização econômica. Ela tem que ser um compromisso, e será um compromisso do nosso programa de governo. Por isso que eu falei, nosso governo vai tratar do... Qual é o propósito que a gente quer com o país? Para onde que a gente quer levar esse país? E isso, vamos deixar claro, com metas objetivas que vamos colocar, não só metas para a inflação, mas metas também para o crescimento econômico. É possível sim, tanto é possível que outros países como Chile, como a Colômbia têm inflação menor que a do Brasil.

Eu ia perguntar exatamente isso. A meta de inflação é 4,5%. O sr. acha que é possível, até 2018, atingir esse centro da meta, mas o sr. acha, com as informações que tem, que é possível antes de 2018 chegar nesses 4,5% e depois reduzir ainda mais?
É exatamente esse o debate. Eu falei em 4%, na verdade, de meta de inflação para chegar até 2014 e como em 2015.

2014?
Até 2018. E como em 2015 a gente tem que fazer o PPA, o Plano Plurianual, que avança um ano sobre o mandato seguinte, a gente já quer deixar claro uma rampa de queda do centro da meta e ter um compromisso com o centro da meta e não com o teto. Agora já está furando o teto. A gente precisa cuidar, exatamente, de focar o centro da meta.

Então vamos entender. Para 2014 já está dada: a meta é 4,5%, não tem como, e para 2015 também vai ser 4,5%, que é decido agora. Qual deve ser a trajetória da meta de inflação do Brasil ao longo dos próximos anos, considerando-se que em 2015 já vai ser 4,5%, para os anos seguintes, como o sr. vislumbraria?
Eu acho que, nos próximos quatro anos, a gente deve perseguir uma meta de 4%, como centro da meta, podemos...

A partir de qual ano?
A partir do ano de 2016, a gente já se aproxima do centro da meta. Até porque a gente tem uma porção de situações que foram represadas, exatamente, porque esse ano tem eleição, o governo está segurando uma série de preços. Nós temos que trabalhar com esse dado de realidade, mas nós queremos olhar para, a partir de 2018, um novo centro da meta, em torno de 3%, para que o Brasil, aí sim, vá se aproximando de uma inflação de classe mundial para países do padrão do Brasil.

Vamos entender. 2015 já está dado, a meta é 4,5% por que é decidida neste ano pelo atual governo. A partir de 2016 o sr. entende 4%.
4%.

Que seguiria até 2018 e 2019...
E o PPA nosso constaria, para 2019, já uma meta de 3%.

Agora, o sr. mencionou represamento de certos preços controlados ou administrados diretamente pelo governo, vou citar combustíveis e energia. Há grande dúvida sobre como desrepresar esses preços. Quando vai ser possível trazer esses preços para níveis de mercado e como fazer isso?
Primeiro temos que definir uma regra clara, transparente, objetiva sobre preços de combustíveis para que o governo não fique com essa capacidade de meter a mão e ficar atrapalhando a vida do programa, por exemplo, de investimento da própria Petrobras, matando o programa do álcool, 40 usinas fechadas, milhares de empregos, no interior do Brasil, no setor do etanol...

O governo comenta que fez isso para segurar a inflação, para ajudar a todos os brasileiros. Está errado?
Está errado, porque ele fez isso porque deixou de fazer outra coisa, que foi, na governança da macroeconomia, cuidar, efetivamente, de ter uma sinergia entre política monetária e fiscal e ter compromisso com o tripé macroeconômico, de fazer um dever de casa que não fez. Como não fez, teve que ir administrar, exatamente, em cima dos preços que ele poderia colocar a mão.

Tem um senso comum entre os agentes econômicos, economistas, analistas da área, que é mais ou menos assim: se for reeleita a presidente Dilma Rousseff, ela não vai querer dar uma pancada de uma vez nesses preços, aumentar tudo a partir do primeiro semestre de 2015. Estou dizendo preço de energia, combustíveis, entre outros. Se for um candidato de oposição, como não tem compromisso com a política anterior, logo nos primeiros seis meses vai reajustar tudo e vai haver uma pancada na inflação, o país vai ficar em condições difíceis, no ano que vem. Isso vai acontecer?
Eu acho que não. Se depender de nós, nós vamos fazer um processo...

Qual é a gradualidade dessa correção?
A gente passar uma mensagem de tranquilidade, uma visão de médio e longo prazo, a possibilidade de ter regras que impeçam, no futuro, situações assemelhadas a essas e, ao mesmo tempo, não esconder que tem um esqueleto que estão deixando. Eu não sei nem se esse esqueleto, depois das eleições, a presidenta [Dilma Rousseff] perdendo as eleições, se ela não teria, exatamente, as condições de, talvez, e até a obrigação de consciência de já tomar algumas medidas para ir diminuindo o tamanho do passivo que fica.

Agora, imaginando que é necessário fazer essa correção nesses preços, reajustá-los, energia, combustível, como eu tenho citado. O sr. imagina que ao longo de quanto tempo isso terá que ser feito, para minimizar o impacto na taxa de inflação?
Isso, na verdade, está sendo calculado por especialistas para, exatamente, a gente cumprir a meta, que eu falei há pouco, falávamos há pouco, da inflação. Acho que a gente não pode soltar isso de uma vez só porque são preços que são transversais a toda a economia. Eles têm impacto no custo Brasil, têm impacto na competitividade da nossa econômica. Nós precisamos cuidar dele, mas precisamos diluir no tempo.

Agora, não tem mágica então, porque se foi um erro ter represado, será também um erro desrepresar de uma vez?
Eu acho.

Ao não corrigir de uma vez, o erro cometido, como o sr. disse, porque aí segura, enfim, investimentos na Petrobras, entre outros lugares, também continua a ser cometido. Como é que resolve isso?
Resolve, primeiro, evitando. Eu acho que a gente, na hora que tem uma regra, daqui para frente, a gente blinda o Brasil de ter esse tipo de prática. Depois, a gente precisa ter consciência de que não temos como resolver isso de uma vez só. Isso está claro para mim.

O sr. acha que é um ano, dois anos para colocar tudo isso de acordo, três anos. Quanto tempo para daí ficar tudo, mais ou menos, normalizado?
Eu acho que deve ser no menor prazo possível, desde que não crie uma situação de constrangimento para a economia.

Mas isso seria, o sr. faz ideia, quanto tempo? É mais de um ano?
Eu acho que é mais de um ano. É mais de um ano e menos de três.

Dois anos, na média, até corrigir tudo?
Até corrigir tudo.

O sr. disse, recentemente, também ser a favor de uma "carta forte", foi a expressão que o sr. usou, para o Banco Central, dizendo que seria necessário formalizar a independência operacional do Banco Central. Sua pré-candidata a vice-presidente, Marina Silva, deu uma declaração não exatamente nessa linha, contraditando um pouco o que o sr. disse a respeito da independência do Banco Central. Em um eventual do governo do sr. como presidente, o Banco Central teria qual tipo de independência e qual seria o formato que essa independência seria, então, conferida ao BC?
Desde já, já há um consenso em todo o nosso conjunto que o Banco Central deve ter independência administrativa. Isso é um consenso. É fundamental para que a gente...

Mais do que tem hoje?
Muito mais do que tem hoje.

Por meio de lei?
Tanto quanto já teve no passado em alguns governos.

Mas por meio de uma nova lei?
Com autonomia administrativa assumida aqui como um compromisso político, com documento por um governo que vai ser legitimado pelas urnas. O que eu estou discutindo, e falei desta forma, é que é muito importante, a meu ver, que a gente tenha uma carta mais forte do que esse compromisso...

Como é que se materializa isso?
Seria através de uma lei, mas existem vários modelos. Existem pessoas que defendem vários modelos de Banco Central, por isso que esse debate ainda está acontecendo na nossa equipe de programa de governo.

Não há divergência entre o sr. e Marina Silva sobre isso?
Não. Nós estamos discutindo com a assessoria de vários economistas, temos um consenso claro de que deve haver um compromisso, como já há, de que no nosso governo, a partir dia 1º de janeiro, nós teremos uma direção do Banco Central com autonomia administrativa para cumprir a meta de inflação, então a política monetária que defenda o país e que possa reconduzir o país a um rumo de crescimento distinto desse que nós estamos tendo.

Mas aí, no seu governo, além dessa... Por que no início do governo o sr. entraria e daria essa independência administrativa de ofício, no caso. Agora, o sr. está dizendo que seria necessário uma nova lei para oficializar tudo isso em seguida?
O que eu tenho defendido é que, para a recuperação do Brasil, da situação ser até mais rápida, nós temos que ter gestos, gestos com a sociedade, gestos com o mercado, que mostrem que vai vir um governo novo para um novo momento do Brasil, com outras prioridades e outras práticas políticas.

Mas deixa eu detalhar no caso do Banco Central. Os diretores do Banco Central e o seu presidente seriam, por exemplo, a eles conferidos mandatos com tempo determinado e, durante esse mandato, não seriam demissíveis ad nutun pelo presidente, por exemplo. Como é que seria essa lei para dar autonomia para o BC?
É exatamente este modelo que está sendo discutido: se o mandato é do presidente, ou o mandato é do diretor. Há países em que você tem 12 diretores e que o mandato é do presidente, quando o diretor vira presidente por dois anos, ele está blindado na função de presidente. Esse debate que estamos fazendo.

O sr. tem opinião sobre isso?
Tenho. Eu acho que o Brasil precisa de uma carta forte para mostrar que o Brasil vai ser...

Mas o mandato seria de quem?
O mandato seria do presidente.

Do Banco Central?
Do Banco Central.

Não seria demissível no período em que estive ali?
Na presidência.

Entendi. O sr. defende mandatos de quantos anos para o presidente do Banco Central?
Eu acho que ele deve ter um mandato de três anos.

Não coincidente e reelegível, reconduzível?
Por uma vez.

Entendi. Assim de maneira a não coincidir com o mandato com o chefe do Executivo.
A partir daí ele não coincide com o mandato do Executivo.

Aí o sr. vai defender, eventualmente, junto com os seus colegas de campanha, com Marina Silva, formatar esse tipo de modelo para apresentar um projeto de lei para o Congresso?
É esse o debate que estamos fazendo nesse momento e devemos tratar desse assunto no programa de governo, que vamos apresentar até o final de junho.

Ou seja, lógico de se imaginar que, o sr., ocupando a Presidência da República, provavelmente proporia essa lei, que daria os mandatos fixos para o presidente do Banco Central e durante esses mandatos ele seria indemissível?
Esse é o estágio que estamos, fazendo um debate interno. Já assumindo de pronto e isso já está resolvido, já é consenso, que o Banco Central deve ter autonomia para que ele cumpra o seu dever.

Que reformas econômicas, uma ou duas, porque senão a gente vai falar só disso aqui, o sr. acha que são absolutamente urgentes e fundamentais para o país?
Olha, Fernando, tem as reformas clássicas que o país precisa. Reforma tributária, reforma política, mas eu acho que a gente tem que ter...

Na área econômica?
...Eu acho que a gente tem que ter um foco muito claro, mais muito claro, na busca de alavancar a produtividade da economia brasileira. Esse é um desafio de um lado. Um outro desafio é a qualidade de vida do povo brasileiro. A qualidade de vida caiu muito nos grandes centros, nas médias cidades brasileiras. Desde a mobilidade, a insegurança, a qualidade dos serviços públicos de saúde, de educação. Eu acho que o grande desafio da produtividade é a questão da educação. Nós precisamos, de uma vez por todas, acabar com o apartheid que choca o Brasil que é entre a qualidade da escola privada e da escola pública que estamos oferecendo ao povo brasileiro. Eu acho que esse deve ser um grande centro, uma grande bandeira de um novo ciclo que o Brasil precisa ver. É um pacto em torno da educação de qualidade que vai conduzir o Brasil a um outro padrão de produtividade na sua economia.

O sr. falou de produtividade até, a propósito, a revista britânica "Economist", acabou de publicar um texto muito crítico dizendo que quando a gente coloca o pé no Brasil já começa a perder tempo. E que há muito pouco de avanço na produtividade do trabalhador brasileiro ao longo de décadas. Quando se fala nisso no Brasil, em geral, o discurso toma várias direções, uma delas é a necessidade de algum tipo de aperfeiçoamento ou reforma trabalhista, das leis trabalhistas. O sr. enxerga necessidade de alguma reforma nessa área?
Eu acho que ninguém nesse país vai ter condição de assumir um compromisso com a sociedade que vai tirar direitos sociais nos próximos quatro anos. Quem fizer isso vai estar mentindo para a sociedade, não há ambiente político, no Brasil, para nenhum candidato a presidente da República ter condições de assumir um compromisso que vai retirar direitos sociais. O que que tem, na verdade? Sobretudo a nossa campanha, a nossa proposta, vem de um conjunto de forças que tem, historicamente, compromissos com as lutas sociais brasileiras. O que nós precisamos fazer para alavancar a produtividade no Brasil? Nós precisamos fazer um grande esforço de qualificação profissional, um grande esforço da educação, de inovação, e precisamos ter, exatamente, um esforço continuado de desonerar a geração de trabalho, porque a produtividade em uma fábrica, nos Estados Unidos, e em uma fábrica no Brasil, se elas têm padrão tecnológico assemelhados, a produtividade física, física, ela se dá praticamente no mesmo tamanho. Ela é tocada pelos custos que vêm da logística, muitas vezes da carga tributária que existe sobre o salário, mas não da renda do trabalhador.

Não, claro. Mas eu ia perguntar para o sr. Por exemplo, uma empresa de médio porte, que contrata lá 100 ou 200 funcionários, que paga, digamos, R$ 2 mil para um funcionário contratado por meio da CLT, totalmente correto. Ela, em geral, que os tributaristas dizem é que, para contratar um funcionário e pagar um salário de R$ 2 mil, gasta-se, em geral, mais R$ 1 mil. Quer dizer, gasta 100% do salário em encargos. Isso é alto ou é adequado para o Brasil?
Não. Eu acho que o Brasil tem uma oneração do trabalho que não deveria ter, mas isso não são ganhos do trabalhador, isso é da carga tributária, é de um sistema que é antigo. Nós temos, por exemplo, sobre o consumo, nós temos, praticamente, cinco tributos cobrados, às vezes, pelos Estados, na maioria das vezes os Estados e a União, mas o próprio ISS, em alguns casos, vai no serviço que atinge o setor de consumo, o varejo, ou seja, nós precisamos de uma reforma tributária. Agora, o Brasil fica insistindo em fazer reforma tributária para amanhã e aí termina não fazendo nunca. Nós precisamos fazer uma reforma tributária fatiada, no Brasil, olhando, inclusive, a geração do trabalho.

No caso do trabalhador, dos trabalhadores, dos encargos que incidem sobre o salário do trabalhador, estou entendendo que o sr. não vê ambiente político para, nos 4 anos do próximo governo, fazer uma alteração a respeito disso? Fundo de garantia, INSS, férias, décimo terceiro, todos esses custos adicionais ao salário. Quanto a isso o sr. não vê espaço político?
Nós não vamos colocar na nossa plataforma nada que retire direitos dos trabalhadores. Tocar em férias de trabalhador, décimo terceiro salário, de forma nenhuma. Agora, nós vamos sim fazer um esforço para melhorar a produtividade, para melhorar a possibilidade das empresas brasileiras gerarem trabalho sem oneração. Como? Através de uma reforma tributária que possa melhorar a composição dos custos no trabalho.

Reajuste do salário mínimo. A atual política que existe no Brasil é a mais adequada?
Eu acho que a gente não pode pensar que esse país vai renunciar ao direito, a classe trabalhadora vai perder o direito de ter um reajuste da inflação para a sua remuneração. Ou que vamos resolver o problema das contas públicas no Brasil tirando a possibilidade dos trabalhadores que ganham o salário mínimo ter um ganho real. Nós temos um problema que não é o salário mínimo ter ganho em real, nós temos um problema é na Previdência, de um passivo que foi sendo formato ao longo dos anos.

Mas no caso do salário mínimo, a política atual, que leva em conta o crescimento dos anos anteriores, faz uma média, joga para frente. O sr. acha boa essa política atual ou o sr. gostaria de modifica-la?
Acho que nós podemos de discutir a política. Nós temos que ter a possibilidade do salário mínimo seguir tendo reajustes para garantir o poder de compra real do salário mínimo, no Brasil, que é fundamental para que a gente possa ter um país mais equilibrado socialmente, para que a gente tenha um mercado interno, sobretudo nas regiões mais pobres, que ajude através do consumo o crescimento da economia.

O sr. está dizendo então, basicamente, que essa política, que nos últimos anos deu ao salário mínimo um ganho real, em relação à inflação, deve ser mantida e seria mantida em um eventual governo seu?
Eu não estou falando que exatamente essa política que está aí, que vai até 2015. Eu estou falando do princípio. No nosso governo o salário mínimo terá a recomposição do poder de compra da inflação...

Sempre é um pouquinho em cima da inflação?
...E algum ganho real, sim.

Previdência. Previdência pública, previdência privada. A previdência pública tem um rombo, um déficit grande que, em geral, é quase que equivalente ao da previdência privada que tem dezenas de milhões de mais trabalhadores a ela associados. Como resolver esse problema?
Esse é um problema que o Brasil foi tocando aos poucos. Houve mudanças no governo Fernando Henrique, houve mudanças no governo do presidente Lula, há matérias, inclusive, que não foram completamente colocadas para funcionar e nós precisamos discutir, sobretudo nesse momento que temos uma janela demográfica que temos, até para garantir à juventude de hoje, aos trabalhadores de hoje, esse direito lá na frente, é preciso que a gente faça um debate sobre a reforma da Previdência.

Uma medida objetiva sobre a Previdência, por exemplo, a idade da aposentadoria, o formato como é a aposentadoria dos trabalhadores do setor público. O sr. tem alguma proposta objetiva sobre o que poderia ser pensado e executado?
Não. Nesse momento, nós temos um intenso debate, estamos ouvindo especialistas que tratam dessa matéria fazendo uma segregação do que muitos Estados estão fazendo e a União fez dos novos servidores, distinguindo dos antigos servidores, tem muito debate sobre a questão das pensões, mas não temos nenhuma posição tomada. Esse debate está acontecendo nesse momento.

Vários países europeus têm aumentado a idade de aposentadoria. É o caso de o Brasil começar a pensar também em aumentar a idade de aposentadoria de seus trabalhadores?
Olha, o Brasil já fez isso, né.

Pois é, mas comparado a países europeus ainda é mais baixo.
Na medida em que haja um processo em que a idade média do país vai crescendo, é natural que vá crescendo também a idade média da aposentadoria, as pessoas estão vivendo mais, é natural que as pessoas também queiram trabalhar ou possam trabalhar mais do que antes.

60 anos é uma idade adequada no Brasil ou 65, qual o sr. acha que seria a idade adequada hoje de aposentadoria?
Esse é o debate que os especialistas estão fazendo...

O sr. tem opinião?
Tenho, opinião tenho, mas não fechamos a opinião porque não só minha opinião que vai fazer o programa.

Mas a sua qual é?
Na nossa posição é que é preciso fazer um debate sobre a questão da Previdência, inclusive, animando a previdência complementar no Brasil que é fomentando, incentivando a previdência complementar para o mundo privado como uma forma de a gente ter um lastro de poupança que possa nos ajudar a alavancar os investimentos. O Brasil cuidou muito pouco de incentivar a previdência privada complementar e agora também há espaço para a previdência complementar pública porque os novos servidores não terão a paridade. E aí tem uma oportunidade de você garantir renda para os aposentados, até porque Previdência é algo estratégico para a harmonia de uma sociedade, para o equilíbrio da sociedade e pode ser, economicamente, uma grande oportunidade para o Brasil superar esse gargalo da poupança interna.

Mas estou entendendo que, ao longo desse debate, vai ser inevitável fazer alguma correção na idade mínima de aposentadoria?
Não, não tomamos essa decisão.

Não?
Nesse horizonte desses quatro anos agora, não.

O Brasil tem 39 ministros, nem todos de ministérios, mas de secretarias com status de ministérios, 39 ministros. Quantos ministros o Brasil teria de ter idealmente?
Eu acho que entre 15 e 20.

Isso é possível?
É claro. É possível.

Por que tem tanto ministro?
Tem que perguntar à Dilma, né Fernando?

Mas deixa eu perguntar uma coisa. Em Pernambuco, o sr. governou o Estado com 28 secretários que são, em nível estadual, os ministros, vamos dizer. Por que em Pernambuco não tinha de 15 a 20?
Porque você não pode comparar a máquina de um Estado com a máquina de um país. Muitas vezes em um Estado, que tem máquinas muito mais precárias, uma situação bem diferente da União do ponto de vista de recurso, do ponto de vista de equipes técnicas, para você chegar e fazer inovação, como nós fizemos em Pernambuco na gestão, tanto que é que nosso governo foi premiado pela ONU, pelo modelo de gestão, a gente precisava empoderar áreas que não existiam no serviço público. Por exemplo, a área de cultura no Estado, um Estado forte culturalmente como Pernambuco, você precisa ter uma política para o cinema, você precisava ter uma política para a música, para as artes e tinha que ter uma equipe que cuidasse da estruturação da área cultural.

Precisava ser um secretário?
Precisava porque esse é o nome da função de confiança que tinha. Agora o que eu posso te dizer é o seguinte: nós diminuímos o número de cargos, a expressão do número de cargos de confiança sobre a folha. Ou seja, a gente não criou nenhum cargo novo, diferente do que houve na União. Nós pegamos os cargos existentes e redistribuímos eles para cumprir um programa de governo. Num modelo de gestão que fez exatamente meta, remuneração variável, transparência na gestão, participação popular, de um modelo de gestão que foi premiado como um dos casos de êxito. A ONU dá cinco prêmios anuais de excelência e gestão e deu ao governo de Pernambuco por montar esse sistema.

Deixa só eu problematizar aqui. No plano federal, o ex-presidente Lula e a presidente Dilma que continuou a política do presidente Lula, argumentam o seguinte, tal como o senhor: era necessário, vamos dizer, empoderar determinados setores com cargo de ministro para dar relevância àquele setor. Por exemplo, a Secretária de Igualdade Social, que combate o racismo, a Secretária das Mulheres, a dos Direitos Humanos, que não eram ministérios e viraram ministérios porque o ex-presidente Lula e, agora, a presidente Dilma dizem "é muito importante que sejam ministérios para dar um sinal para a sociedade da nossa prioridade". Não é a mesma coisa que o sr. fez em Pernambuco?
Não, porque o governo federal em regra ele não executa, a execução se dá através de Estados e municípios, ele define políticas, estruturas políticas, programas e pode fazer a execução através dos Estados e da União. São situações completamente distintas.

Quando a gente olha os 39 ministros do atual governo, as pastas que a gente imagina que poderiam ser extintas e virarem apenas secretárias de algum ministério são exatamente essas da área social. Poderiam estar todas agrupadas, digamos até, no Ministério da Justiça. É lógico esse meu pensamento, faz sentido ou não?
Eu acho que a estrutura tem que refletir o programa. Nós primeiro vamos terminar o programa, porque você não pode fazer uma estrutura sem saber para fazer o quê. Nós vamos definir um programa e com base no programa vamos definir a estrutura.

Porque veja só, a gente olha a Esplanada dos Ministérios, em Brasília, Ministério da Fazenda vai ter, Ministério dos Transportes, da Justiça, Relações Exteriores, são os clássicos, Indústria e Comércio, aí quando a gente olha aqueles que são os mais novos, são esses justamente que eu citei, são secretarias que viraram ministério, com status de ministério. É licito supor que, no seu governo, eventual se o sr. vencer, essas secretarias seriam agrupadas em um ministério só?
Não fizemos esse debate sobre a estrutura. Eu acho que a gente não é só...

O sr. está falando de 15 a 20 ministérios.
Não é só diminuir o número de ministérios, é mais do que isso. É conceber um modelo de gestão que tenha transparência, que tenha metas, que possa formar uma equipe com pessoas sérias, capazes, competentes, que sejam líderes, que inspirem as equipes e não essa partilha que, muitas vezes, a gente assiste ser feita de colocar no ministério alguém que foi indicado só porque o partido A está fazendo bloqueio da votação no Congresso ou coisa do gênero. Nós precisamos, mais do que diminuir o número de ministérios, de um programa para ser cumprido, de um time que entusiasme o Brasil, que dê exemplo, que selecione boas pessoas para que a gente possa dar conta da missão, que é fazer mais com menos, é aumentar a produtividade do setor público. Nós precisamos, a população fala da redução da carga tributária, do outro lado quer mais serviço e com qualidade. Como é que você vai dar conta desse desafio se você não melhora a produtividade do serviço público? Como é que se melhora a produtividade botando gente incompetente, que não tem capacidade, que não tem liderança, que não conhece a área?

Falando nisso, estamos falando aqui de coligações que sustentam o governo, porque um governo precisa fazer política, porque são três poderes na República e há uma integração grande, pelo menos, entre o Executivo e o Legislativo, não é? No Legislativo estão os partidos que vão, eventualmente, dar sustentação a um governo, ao seu ou de quem for eleito. O atual governo tem uma base ampla de partidos no papel que o apoia, eles estão representados, em certa medida, nos ministérios. O sr. está dizendo que isso não vai ser a lógica do seu governo? O número de partidos que o sr. terá de apoio, eventualmente, no Congresso, não estarão todos na Esplanada, até porque nem haverá 39 ministérios, é isso?
Eu acho que essa lógica está superada pelos fatos, pela história, pelo tempo, pela manifestação da população.

Quem vai falar isso para os partidos?
Eu estou falando já aqui, você já está publicando no UOL. Eles todos vão estar lendo. Na verdade, você sabe que esse processo que vem desde a Nova República, na verdade, desde a transição para a democracia, ele passou pelo ciclo da transição econômica e ele passou agora nesse último ciclo. Nós precisamos ler claramente que ele está superado, ele é insustentável. Nós precisamos, para que o Brasil saia do caminho errado, entre no caminho certo, nós precisamos que a sociedade volte a olhar para Brasília e se reconhecer. E a sociedade não vai se reconhecer em Brasília se a gente continuar criando ministério, provendo esses cargos da forma que estão sendo colocadas as pessoas para geri-los. Nós precisamos juntar os bons no Brasil, apostar que a sociedade vai apoiar quem assume esse compromisso e cumpre esse compromisso e se a sociedade vai apoiar, esse apoio da sociedade vai se refletir no Congresso Nacional. Eu não tenho a menor dúvida disso, a menor dúvida. Veja bem, Fernando, você viu o segundo semestre de 2012 o Congresso, mesmo a presidenta tendo uma base muito ampla, votar muita pouca coisa. O primeiro semestre de 2013 muita pouca coisa. Quando a população foi para a frente do Congresso, o Congresso em 15 dias votou o que não votou em um ano.

Agora, essa lógica de governar com vários partidos e dar a eles cargos funcionou em certa medida, no Brasil inteiro, em vários governos, inclusive no seu, em Pernambuco também um pouco, não funcionou? Por que o sr. tinha 17 partidos na sua coligação que o elegeu. Eles, em certa medida, estavam representados no seu governo.
Absolutamente.

Não?
Se você for ver o que nós fizemos em Pernambuco foram acordos de programa. Eu disputei a eleição em 2010, o PV disputou a eleição comigo, apoiando a Marina, na época, Sérgio Xavier, do PV, um militante histórico do PV.

Foi seu secretário?
Passada a eleição, tive 83% dos votos. Ele me fez observações críticas ao governo, sugestões, que terminaram por me levar a chamá-lo para me ajudar. Ele apresentou 14 pontos que o governo deveria ter compromisso na questão ambiental e foi trabalhar conosco. É uma visão diferente. Você vai na Alemanha, terminou a eleição, os partidos se reúnem e discutem questões programáticas.

O sr. acha possível ter uma dezena de partidos, mas com base em programa?
Se não tiver os partidos, vai ter pessoas, que estão nesses partidos, mas que vão ver algo certo, direito, sendo feito. Ele vai chegar em casa, as pessoas no prédio dele, na comunidade que ele representa, vão dizer "aposta nesse governo, as coisas estão sendo feitas de maneira direita, eu vi ser nomeado para a pasta da educação alguém que expira confiança, que conhece a educação, que vai fazer um trabalho bonito, não vamos desperdiçar essa oportunidade". A própria presidenta Dilma, Fernando, teve no primeiro ano do governo dela, em 2011 e até um pedaço de 2012, ela teve uma torcida extraordinária do Brasil para fazer alguma coisa diferente. Essa oportunidade, ela deixou passar.

Isso tudo que o sr. está falando, na teoria, parece realmente que tem muita lógica. Agora, na prática, quem acompanha Brasília sabe que as coisas não são tão simples assim. O sr. disse, por exemplo que, apesar do grande apoio a presidente não conseguia aprovar determinadas coisas no Congresso, quando a população foi às ruas, em junho de 2013, o Congresso rapidamente atuou. Só que esses episódios, de a população ir às ruas, são muito raros no Brasil. Teve esse de junho de 2013, antes desse teve o impeachment, em 1992, depois teve Diretas Já, em 1984. Não é uma coisa que acontece todos os anos, esperar que a população fique pressionando o Congresso.
Fernando, eu vi no Estado e ainda existe isso em vários Estados do Brasil, diretor de escola ser indicado por deputado, diretor regional de uma determinada região de educação...

E os pais das crianças reclamam?
...Ser indicado pelo deputado mais votado federal. Eu vi isso ser quebrado no meu Estado. Você não acha que teve político achando ruim não? Teve muito político achando ruim, mas foi quebrado. O governo que me antecedeu construiu eleição direita, eu construir certificação de um ano, curso para ser candidato, tinha que ter certificação de capacidade para ser diretor com eleição na escola. E o diretor regional da educação, que antes era indicação de político, ser feito por comitê de busca, que é uma espécie de headhunter da academia. Ou seja, isso no sertão de Pernambuco. Como é que no Brasil nós vamos continuar a chamar para ser diretor das agências que regulam telefonia, energia, a questão de transporte, as pessoas na base da indicação, muitas vezes da aliança do empresário com o partido político, para botar quem vai fiscalizar um setor, para defender o consumir e a economia dessa forma? No século 21, as pessoas acordando cedo, trabalhando muito, pagando muito imposto e vendo lugares estratégicos da nação serem apropriados por partido e a gente vai ficar achando que isso vai ficar desse jeito. Ora, Fernando, se a gente pensasse assim, que não era possível, até hoje a gente tinha um general, designado por alguém, sem ser eleito, comandando o Brasil, a gente tinha ficado na ditadura militar. Se a gente achasse que não era possível, a gente ainda estava com inflação de 200%, ao mês. Eu acho que a gente derrotou uma Ditadura, a gente derrotou uma hiperinflação, colocamos o tema social na mesa do Brasil, é preciso colocar o tema de melhorar a política. Ou melhora a política, ou não melhora nada nesse país.


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