Folha de S. Paulo


Leia a transcrição da entrevista de Renato Pereira à Folha e ao UOL - Parte 2

Segunda parte da íntegra da entrevista de Renato Pereira à Folha e ao UOL

No que diz respeito a ele estar próximo das pessoas e as pessoas se identificarem. Nesse caso, por exemplo, há uma pré-candidata à presidente no ano que vem que é a ex-senadora Marina Silva que, ela sim, tem uma identificação muito grande com as classes menos favorecidas pela sociedade pela origem própria que ela tem. Nesse caso, ela não está mais apetrechada do que o senador Aécio para se identificar com as pessoas?
Olha, eu tenho um profundo respeito pela figura da Marina Silva e pela trajetória dela em particular. Mas, se você considerar o perfil do eleitor da Marina Silva hoje é exatamente o oposto. Quem vota na Marina Silva é exatamente o cidadão de mais poder aquisitivo e mais instrução. A intenção de voto dela varia positivamente na proporção que você sobe de renda e sobe instrução. É claro que ela pode até se popularizar. Mas, na verdade, o eleitor mais típico dela é o eleitor bem formado e com poder aquisitivo alto.

No programa do PSDB nacional semestral desse segundo semestre que foi ao ar no dia 19 de setembro, em alguns momentos aparecem obras do governo federal que não foram executadas. A ideia é colar ou contrastar um pouco a imagem de competência ou incompetência gerencial no atual governo federal?
Eu acho que a ideia é o exercício de uma candidatura de oposição. Você tem que mostrar o que não está dando certo hoje. Uma das coisas que não está dando certo hoje são obras de infraestrutura que, quando existem, em sua maior parte, ou estão incompletas, ou foram abandonas, ou custam muito mais caro do que o planejado.
Em que medida essa, se for percebido assim, incompetência administrativa gerencial do governo Dilma ajuda a campanha da oposição?
Ajuda porque você tem aí, mais uma vez, um contraste.

Mas há mesmo essa incompetência?
Olha, você tem obras de infraestrutura... Primeiro você tem algumas obras de infraestrutura importantes que estão pela metade, para sair há muito tempo. Obras como a transposição do Rio São Francisco, ferrovias no Nordeste que estão para acontecer há muito tempo e estão pela metade...
Como é que se refere a isso na propaganda para o eleitor entender?
Como nós mostramos ontem. Você tem uma obra que é importante, só que já era para ter sido inaugurada em 2010. Nós estamos em 2013. Não só ela não foi inaugurada, como ela está deteriorada e, pelo fato de estar deteriorada, vai custar muito mais caro porque você vai ter que refazer toda uma parte dessa obra para poder entregá-la a tempo. Além disso, você tem toda uma agenda de obras que nunca foram sequer iniciadas. Então, os déficits de infraestrutura do país são muito importantes. Não apenas para os brasileiros, que não conseguem aí desenvolver, ter emprego, ou desenvolver as suas próprias empresas, ou seu próprio negócio, mas o próprio país, que perde competividade internacional porque os seus produtos custam muito mais caro por conta dos déficits crônicos de infraestrutura que o país apresenta até hoje.

O eleitor fica ofendido quando o candidato, seja de oposição ou não, aponta para o outro e diz: "Veja a incompetência de fulano de tal, que não terminou essa obra". Ele gosta? Não gosta? Como se trata esse tipo de crítica?
Fernando, tem uma diferença aí muito importante. Acho que o eleitor brasileiro não gosta é quando você fulaniza a discussão. Então, quando você começa a criticar pessoalmente, colocar o dedo na cara e dizer "a culpa é sua", "a responsabilidade é de não sei quem" etc., esse tipo de crítica ácida, pessoal, mais contundente é uma coisa que normalmente incomoda o eleitor brasileiro. Agora, a discussão de políticas públicas: "isto aqui não está funcionando por responsabilidade..."...
Mas fica o sujeito oculto assim?
De jeito nenhum. Não está funcionando hoje por conta do governo. De um governo que é comandado por um partido político que é o PT, certo? Então imagina. De modo algum. Mas a outra coisa é quando você vai para o exercício da política como ela é feita em geral no teatro político. Quando você vai para o Congresso Nacional, quando você vai para a arena política stricto sensu, normalmente a discussão é muito fulanizada. Você se refere ao seu adversário o tempo inteiro nominalmente, ao partido, não é? O objeto da crítica em geral é muito pessoal, certo? Quando você sai da arena política stricto sensu e vai para a eleitoral é muito que, na verdade, você traduza isso para a discussão das políticas. Muito menos do que para a discussão pessoal. Quando você vai para a discussão pessoal, você acaba criando obstáculos importantes para a comunicação com o eleitor.

É por isso que o senador Aécio Neves na propaganda vai falar "a administração do governo federal, a administração do PT", e não vai dizer "a presidente Dilma deixou essa obra se deteriorar"?
Em geral, sim. Pode até falar. Mas você tem uma diferença de ênfase que é importante. Você não fulanizar é muito importante. E vice-versa. Para a candidatura da situação também. Você ficar nominando os seus adversários te dá um tom agressivo desnecessário e que acaba incomodando o eleitor.
Mensalão, que impacto vai ter no ano que vem na eleição?
Não creio que tenha muito impacto, assim como já não teve no passado. A gente acabou de sair de uma eleição, em 2012, em que se teve todo o teatro, no bom sentido da palavra, mas todo o drama público do julgamento, acontecendo diante da televisão, e eu não vi nenhuma candidatura do PT sendo prejudicada por conta disso.

Ou seja, o mensalão não tem impacto significativo no ano que vem?
Na minha opinião, acho que tem uma sobrevalorização enorme em relação a isso. E basta você ver a experiência recente. Lembre de 2012, não teve um impacto tão grande assim.

Isso significa que talvez seja ineficaz a candidatura da oposição, no caso do PSDB, citar o caso do mensalão, portanto?
Você tem distinções aí. O mensalão é um episódio importante para o país, tanto em relação ao passado recente do país como também que país você quer.

Mas é um tema que merece estar na propaganda do PSDB, do senador Aécio Neves?
Se você pensar no efeito estritamente eleitoral, talvez não, mas como eleição não é feita apenas de temas que têm um efeito específico eleitoral, é feita também de valores, de princípios.

Mas hoje, olhando hoje, vai ter algum programa em que o senador Aécio Neves vai falar: veja o caso do mensalão...
Fernando, é muito cedo pra dizer isso. O que eu consigo te de dizer é que, na minha opinião, não é um tema particularmente relevante para o eleitor brasileiro. E, como ponto de prova, só lembrar 2012.

Ou seja, portanto a tendência seria não utilizar na campanha?
Não posso dizer isso, porque como eu te disse, uma campanha não é feita só de temas que têm ume relevância eleitoral. Você tem questões de princípios também que muitas vezes são importantes de se manifestar, independente do peso eleitoral que possa vir a ter ou não.

Mas o que pode ser dito hoje então sobre o uso ou não do mensalão?
Que é muito cedo. Posso dizer que...

É muito cedo pra dizer se o mensalão vai ser ou não vai ser usado na campanha?
Muito cedo, muito cedo.

Há também acusações nesse campo de corrupção contra o PSDB também. Há um caso que vai, em tese, algum dia ser julgado no Supremo, que é o chamado mensalão mineiro. Há um caso recente agora de cartel de empresas que vendem trens para o metrô, e que envolve alguns governos do PSDB. Esses casos acabam se neutralizando e, no final, não têm impacto significativo?
Olha, eu nunca avaliei especificamente se eles acabam se neutralizando, então é uma hipótese a se testar. O que até hoje eu realmente avaliei objetivamente é, particularmente, o impacto do mensalão sobre as eleições e sobre o comportamento, a decisão do voto do eleitor. Então, na sua maioria, se tirando um eleitor de classe média mais alta, que já tem uma visão sobre a política muito crítica, tirando esse eleitor, em geral esses temas não têm uma penetração tão grande assim.

Se a eleição fosse hoje, que tipo de abordagem se daria para esse tema? Teria que ser dada, teria que falar desse tema?
Acho que você tem que falar desse tema porque é um tema presente, é incontornável, faz parte do cenário político atual. Além disso, eu acho que ele tem algum significado em relação ao projeto de país que você tem. Acho que uma das questões importantes do Brasil é a impunidade. Então esse é um tema relevante do ponto de vista dos princípios? É relevante. Então por isso é meio incontornável que o tema apareça, mas não por seu peso eleitoral, o peso eleitoral acho que é reduzido.

Pelas suas análises, pesquisas, do eleitorado, quais dos nomes que têm sido citados como pré-candidatos a presidente serão competitivos em 2014?
Acho que temos quatro candidatos competitivos em 2014. Temos Dilma, temos Aécio, temos Marina e temos Eduardo.

Joaquim Barbosa, se viesse a ser candidato, seria competitivo?
Não creio.

José Serra, se viesse a ser candidato, seria competitivo?
Mais difícil de responder a essa pergunta. Se você considerar aspectos das últimas pesquisas, que a gente tem, mais difícil responder. Talvez fosse.

Lula, que ainda é sempre uma possibilidade de voltar a ser candidato no lugar da presidente Dilma, pelo PT, seria um incômodo maior para a oposição?
Acho que o Lula tem mais força eleitoral do que a presidente Dilma, eu não tenho a menor dúvida. Então, respondendo à tua pergunta, sim.

Se Lula fosse candidato, seria mais difícil vencer a eleição?
Eu acho que sim, acho que o Lula, se você coloca o Lula, é só ver as últimas pesquisas agora, nos cenários em que foi colocado o presidente Lula, pelo Datafolha, ele tinha um desempenho, saía melhor que a presidente Dilma. Então, é um candidato com mais força eleitoral aparente do que a presidente Dilma.

Então o PSDB vai torcer pra não ter Lula como candidato?
Não, acho que o PSDB tem que jogar contra quem tiver que jogar.

O PSDB é um partido, não é novidade, como todos os outros, com as suas idiossincrasias e divisões internas. Eu citei o ex-governador, ex-prefeito, ex-senador José Serra, que não esconde o seu incômodo no momento atual dentro do PSDB. Ele gostaria de ser candidato, dá mostras disso. Se Serra ficar no PSDB, não sair, não for candidato, e não ajudar na campanha de Aécio, isso vai atrapalhar? Sim ou não, em que medida?
Fernando, esse é o tipo da questão que eu realmente tenho dificuldade em responder, porque eu não tenho um conhecimento interno do PSDB, mínimo que seja.

Mas e do ponto de vista do eleitor, se Serra se engaja na campanha de Aécio e percorre o Brasil, ou São Paulo, e realmente entra na campanha, ele ajuda?
Eu nunca testei essa hipótese objetivamente, até agora, em termos de investigação de pesquisa e tal, mas creio que sim, porque você tem um partido mais unido, com as suas forças trabalhando lado a lado, imagino que sim. Mas para te responder objetivamente teria que avaliar esse cenário, coisa que eu ainda não fiz.

Mas, com a potencialidade do voto de cada um, o que que seria possível projetar com o seu conhecimento, embora não tenha ainda investigado?
Não consigo projetar isso agora com clareza de jeito nenhum.

Se ele vier a ser candidato por outro partido, é bom ou ruim para o cenário eleitoral do ano que vem, pra oposição?
Acho que pra oposição, como um todo, quanto mais nomes você tiver capazes de atrair o eleitor para uma alternativa de oposição, melhor. Não é à toa que quem está no governo hoje, o PT, tem procurado exatamente evitar ter muitas candidaturas de oposição. Então isso é uma coisa matemática mesmo. Quanto mais candidaturas de oposição você tiver, mais chance você tem de ter segundo turno, mais chance você tem de ter mais votos no campo de oposição.

Mas no caso de José Serra, que também hoje é tucano, essa diáspora no PSDB, eventual, um sendo candidato por um partido, outro ficando no PSDB, no caso, Aécio, aí essa vantagem matemática também é benéfica pra oposição?
Para a oposição ou para o PSDB?

*Pro PSDB e pra oposição em geral.
Olha, pra oposição em geral, aí, num raciocínio puramente matemático, diria que sim, independente se você me perguntar não só do Serra, colocar uma outra figura da oposição de outro partido. Bom, se o PPS quiser ter candidato próprio, se outro partido que está no campo da oposição agora resolver ter candidato próprio. Isso é positivo? Bom, se são candidatos que têm algum tipo de nicho eleitoral minimamente relevante, claro que sim, porque você tende a garantir mais votos para a oposição.

Mas para o PSDB em particular?
Pro PSDB eu acho que na verdade aparecer como um partido que está unido é mais positivo do que ter líderes que são importantes trabalhando em partidos separados. Acho que pro PSDB, tenho a impressão que é melhor que esteja todo mundo junto no mesmo barco.

Tem sido comum nas eleições no Brasil temas de caráter moral, religioso, o debate às vezes fica impregnado por isso, como aborto, drogas, casamento gay. É inevitável que esses temas sempre apareçam nas eleições?
Não tenho a menor dúvida disso, é completamente inevitável. Primeiro porque você tem segmentos importantes da sociedade brasileira com uma agenda clara em relação a esses temas, acho que uma das mudanças sociais importantes que aconteceram no Brasil nos últimos anos, praticamente nos últimos 20 anos, é a emergência do segmento evangélico. Você tem um contingente hoje muito importante de brasileiros que professam religiões pentecostais, e isso é importante, para boa parte delas, a agenda que tem a ver com comportamento moral é particularmente relevante. Então, é normal que assim seja.
Além disso, você ainda tem todo o jogo habitual de uma eleição, em que muitas coisas são feitas de modo oportunista para trazer temas como esse e colar no adversário. Infelizmente isso faz parte do jogo também. Por isso que eu acho inevitável que isso vá acontecer novamente. Mesmo em eleições municipais e estaduais isso acaba acontecendo, o que dirá na eleição presidencial.

Então esses temas estarão presentes de novo?
Estarão presentes de novo.

Não é um debate às vezes reducionista esse?
Totalmente.

Como fazer para os principais candidatos tentarem tanger um pouco isso daí, não deixar que isso domine o debate sucessório?
Não sei, Fernando, mas assim, é difícil, porque na hora da disputa mesmo, em que o calor aumenta, acho difícil ter qualquer nível de compromisso entre as candidaturas, de tratar isso de maneira... Eu diria assim, teoricamente, a melhor maneira de fazer isso é você... tratando isso exatamente de acordo com o que você de fato acredita. É trazer o debate como ele é, o que muitas vezes acontece é que você acaba tendo uma distorção, tendo os candidatos tendo vários passos atrás em relação a declarar o que realmente pensa em relação a temas como esse com medo de ofender A, B ou C.

Não vai ser diferente agora né.
É, por isso que eu acho também que é um pouquinho inevitável que assim seja.

A lei eleitoral no Brasil obriga aos candidatos todos que eles sejam convidados por emissoras de TV se querem fazer debates. Todos os candidatos cujos partidos têm representação no Congresso Nacional. Isso, nas eleições recentes, sobretudo em reeleições, tem produzido um cenário no qual o candidato que é o governante, em geral fica lá no topo das pesquisas, e se recusa a fazer debate no primeiro turno. Então é provável que, no ano que vem, 2014, a presidente Dilma Rousseff considere a possibilidade de não aceitar convites para debater no primeiro turno. Isso poderia ser contornado com um debate na internet dos principais candidatos, porque a lei permite. O sr. acredita que haverá ou não debate no primeiro turno?
Eu acredito que haverá, porque eu tenho a impressão de que a equipe da presidente Dilma vai compreender que será um erro mais grave do que no passado evitar debate no primeiro turno. Uma coisa é você ir a todos os debates, é perfeitamente compreensível que você não vá a todos os debates, até porque senão você não faz outra coisa a não ser ir a debate. Tem convite o tempo inteiro. Mas participar de debates do primeiro turno, no momento em que o Brasil, cada vez mais, tem a sua população querendo participar, conversar, ser ouvida, poder influenciar o rumo dos acontecimentos, você querer dizer "não debatam no primeiro turno", acho difícil.

Na internet seria uma opção fazer só com os dois ou três primeiros colocados?
Seria, mas eu tenho assim... Se tivermos aí quatro ou cinco candidatos mais competitivos, acho que até cinco dá pé, com quatro particularmente, então se você considerar aí Dilma, Aécio, Marina, Eduardo, quatro candidatos, você consegue ter um bom debate entre quatro candidatos. Quando você vai pra seis, sete, aí a história começa a ficar esquisita.

Nesse caso, como já tem quatro, são três contra um em geral, porque é um do governo e três contra. Então quem está no governo vai sempre argumentar, "olha, eu vou ficar em desvantagem enorme, se tiver quatro ou cinco candidatos, pra que que eu vou num debate desses?".
Bom, aí é uma desigualdade totalmente circunstancial porque a desigualdade real é a desigualdade de tempo de televisão entre a situação e todas as forças de oposição, entre as verbas de comunicação de quem está na situação pra oposição, então a desigualdade é muito mais na direção oposta do que nessa. Agora, meu ponto não é esse não. Eu acho que, no momento que a gente está vivendo, imaginar que você pode ter uma figura como um presidente evitando qualquer debate no primeiro turno sem que isso lhe crie problemas, acho difícil que a equipe de comunicação da presidente vá recomendar uma história dessas. Eu tenho essa impressão.

Renato, quem vai ganhar a eleição pra presidente ao no que vem?
Não sei. Acho que a gente vai ter uma eleição bastante competitiva.

Como é que você acha que os candidatos competitivos chegam ao final do primeiro turno, na faixa de pontuação?
Também é difícil imaginar, mas eu tenho a convicção de que a gente vai ter um segundo turno entre Aécio Neves e Dilma Rousseff.

E quem fica em terceiro?
Muito difícil. Muito difícil. Não sei te responder essa pergunta. Aí é puro chute. Não sei. Acho que pode ser Marina, acho que pode ser Eduardo.

Tá imprevisível.
Acho muito difícil de prever. Não me arriscaria a essa previsão, não.

Renato Pereira, publicitário, responsável pelo marketing do PSDB, muito obrigado.
Eu que agradeço.


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