Folha de S. Paulo


Efeito do mensalão em 2014 deve ser pequeno, diz marqueteiro de Aécio

O antropólogo e marqueteiro político do PSDB, Renato Pereira, diz não acreditar que o mensalão "tenha muito impacto" na eleição de 2014.

"A gente acabou de sair de uma eleição, em 2012, em que se teve todo o drama público do julgamento, acontecendo diante da televisão. Não vi nenhuma candidatura do PT sendo prejudicada por conta disso", diz ele.

http://www3.uol.com.br/module/playlist-videos/2013/renato-pereira-no-poder-e-politica-1379726875937.js

Em entrevista ao programa Poder e Política, da Folha e do UOL, Renato Pereira afirma que há "uma sobrevalorização enorme" a respeito do possível efeito eleitoral do julgamento do mensalão, que envolve políticos do PT e deve se estender durante 2014, ano de sucessão presidencial e de escolha de governadores, deputados e senadores.

Aos 53 anos, Renato foi escolhido pelo senador Aécio Neves (PSDB-MG) para fazer os programas de TV tucanos. Deve comandar no ano que vem o marketing aecista na corrida presidencial, junto com seu sócio, o também marqueteiro Chico Mendez.

Nascido na Suíça, filho de diplomatas, o marqueteiro acumula a experiência de ter cuidado da propaganda das campanhas vitoriosas do governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, e do prefeito da capital fluminense, Eduardo Paes, ambos do PMDB. Fez também as campanhas do candidato de oposição derrotado na Venezuela, Henrique Capriles.

Uma abordagem possível para o mensalão na campanha do ano que vem seria usar o caso para discutir a "impunidade" no país. "É um tema relevante do ponto de vista dos princípios. Mas não por seu peso eleitoral. O peso eleitoral acho que é reduzido".

O marqueteiro tucano acha que uma eventual candidatura a presidente de José Serra por outro partido ajudará a oposição. "É matemático", diz ele, afirmando que quando há mais concorrentes há também mais chances de levar a disputa para o segundo turno. Mas seria um desfecho ruim para o PSDB, que não demonstraria unidade.

O PSDB, avalia Renato, "perdeu sua identidade popular" nacionalmente. Ficou com a imagem de um partido sem agenda social. É como se "tivesse mais compromissos com a elite", algo que considera uma interpretação errada e propagada pelo PT.

"O PT conseguiu fazer isso com alguma competência nos últimos anos, manifestar sempre como via o PSDB, como via o passado do país. Parte de nossa tarefa agora é exatamente, de alguma maneira, atualizar a imagem do PSDB".

Confrontado com o fato de que parte da população se sente satisfeita com o estado do país, Renato diz que "o eleitor não é fiel a ninguém". Pelo seu raciocínio, o brasileiro tende a reconhecer que sua vida é hoje melhor do que foi em anos passados, mas sempre pensará mais sobre o futuro do que sobre o passado.

O marqueteiro pretende reforçar no imaginário do eleitor as dúvidas sobre o futuro e a qualidade de vida no país. A síntese dessa ideia-força é a frase, sempre repetida por Aécio Neves em entrevistas e propagandas: "Quem muda o Brasil é você". Ou seja, em vez de creditar ao governo as melhorias do país, mudar o eixo para os próprios cidadãos. Para Renato, a maioria dos eleitores teria hoje insegurança em relação ao futuro, por conta do crescimento econômico moderado ou muito baixo que coloca o rumo do país numa encruzilhada.

A seguir, trechos da entrevista:

Folha/UOL - O que tem sido positivo e negativo no marketing político no Brasil?
Renato Pereira - Começando pelo negativo, existe uma série de preconceitos em relação ao marketing político. Acho injustificado. É uma visão de que quem faz comunicação política distorce as coisas ou cria coisas diferentes do que elas são, que faz uma propaganda enganosa.

E, na verdade, numa democracia jovem como é a democracia brasileira e com um eleitorado tão grande, a comunicação política acaba ajudando muito a engajar as pessoas. A fazer com que todos os cidadãos, de alguma maneira, tenham acesso aos princípios, às causas, aos valores, aos projetos dos partidos políticos das principais lideranças políticas brasileiras. Isso é muito importante para que as pessoas tenham interesse por política. Que tenham acesso aos principais debates. Que consigam distinguir entre projetos políticos alternativos ou opostos. Não tenho a menor dúvida sobre o valor do nosso trabalho. Gosto muito de política. E me orgulho muito do que eu faço e boa parte das pessoas do meu meio também.

Quem olha de fora tem a impressão de que o marketing tem uma fórmula fixa. Apresenta-se o candidato nos primeiros programas. Depois, vem algumas propostas. É isso mesmo?
Acho que não. Em nenhum dos nossos primeiros programas fizemos biografia de candidato.

Acho que tem maneiras diferentes de fazer. A linguagem que a minha equipe adota aqui menos publicitária do que normalmente é feito no Brasil. Não tem aí nenhum juízo de valor. Acho que há profissionais de altíssima categoria como o Duda [Mendonça], o João [Santana], que acabaram vindo para uma escola um pouco mais publicitária em que a forma é particularmente importante e a linguagem publicitária particularmente presente.

A gente adota uma coisa mais próxima do documental. Procuro aproximar um pouco mais o candidato da vida como ela é. É uma opção de linguagem.

Mas talvez a principal evolução no marketing político recentemente não seja o que se vê na televisão. Tem duas coisas novas importantes. Primeiro o investimento maciço no conhecimento do eleitor. Isso faz uma enorme diferença. Havia as ferramentas clássicas do conhecimento do eleitor que são as pesquisas quantitativas e as qualitativas. A gente tem cada vez mais usado todas as disciplinas ligadas a ciências sociais para entender com mais profundidade o que faz o eleitor se comportar de uma determinada maneira ou tomar determinadas decisões. Mas tenho usado cada vez mais as ferramentas das redes sociais para tentar entender empiricamente o quanto a abordagem funciona ou não.

Dê um exemplo. Seriam também pesquisas?
Seriam, mas raramente se faz pesquisas a posteriori que testam o que você fez. Por exemplo, eu disparo uma série de telefonemas falando sobre temas que são mais caros a uma região do Rio de Janeiro. Normalmente, você tinha uma ideia por pesquisas quantitativas e qualitativas, com uma distribuição geográfica e temas importantes para cada área do Rio e para cada classe social. Raramente você testaria depois qual foi o impacto real. Hoje, a gente já consegue testar.

Como?
Para um grupo é enviado um e-mail. Para outro, não - funciona como um grupo de controle. A gente testa depois nos dois grupos se houve alguma diferença em relação à perspectiva do nosso candidato.

Eu investigo empiricamente. Eu vou até os dois grupos e vejo se houve algum impacto.

Mas por que teria havido impacto no grupo que não recebeu nenhum estímulo?
Como a indústria farmacêutica testa o efeito de um remédio? Você tem um grupo de controle que toma placebo e tem um outro grupo que toma um determinado remédio. Ao longo do tempo, verifica-se a diferença entre eles.

Ou seja, envia-se um estímulo para um grupo de eleitores diretamente. Não se envia para outro grupo que é muito semelhante. Depois, procura-se quem não recebeu estímulo nenhum para ver se houve algum impacto?
Claro. Porque tem várias outras influências. Os telejornais, os comerciais que passam na televisão etc.

Deve custar uma fortuna para fazer isso...
Não. É um custo quase marginal dentro de uma campanha que tem investimentos muito maiores na produção de comercial de televisão.

Mas quantas pessoas são contatadas diretamente?
Você faz isso em grupos de controle que são menores em escala. Aí tem uma ferramenta da estatística para poder controlar com uma escala menor. É algo que vem sendo feito também nos Estados Unidos de dez anos para cá.

Como é se chama esse tipo de controle?
São pesquisas empíricas. Você delimita alguns grupos e procura verificar o impacto da tua abordagem. Estou falando em relação à abordagem individualizada porque esse é outro aspecto que mudou. Algumas pessoas chamam de "microtargeting".

Isso significa tanto telefonar como ir diretamente até a pessoa?
Direto pessoalmente, no porta a porta, na carta, no e-mail, no telefonema...

Quantos visitadores são necessários para ir pessoalmente?
Na pesquisa empírica, centenas de pessoas abordadas. O esforço de fazer essa pesquisa do ponto de vista financeiro e operacional é pequeno. Particularmente pequeno se você comparar o esforço que você faz para chegar na comunicação porta a porta. Ou na mensagem telefônica, ou na mensagem por e-mail, que são instrumentos cada vez mais usados.

Mas essa abordagem individualizada é uma novidade dos últimos 10, 13 anos no Brasil. Aqui, sempre se privilegiou o antibiótico: a televisão. Como se a televisão resolvesse tudo. Na verdade -no meu ponto de vista, da equipe que trabalha comigo-, o ideal é que você faça uma combinação entre as duas coisas. As mídias que permitem você segmentar e trabalhar com as pessoas num plano quase que individual. E com a mídia que te dá a grande direção, o farol, os grandes temas, a direção geral para onde a campanha está indo, que aí claramente [é] a televisão.

Que importância num país como o Brasil tem ainda a TV na eleição de 2014?
Uma importância tremenda. Mas numa eleição com margens pequenas, todas as técnicas de abordagem individual passam a ter uma diferença determinante.

A grande massa do eleitorado ainda é de uma faixa de renda mais modesta. São mais pobres e se informam pela TV. Nesse grupo, que diferença faz usar essas novas técnicas?
Faz uma enorme diferença.

Por quê?
Porque há técnicas que permitem abordar o eleitorado mais pobre. Por exemplo, o porta a porta. Na Venezuela [na campanha do oposicionista Henrique Capriles], a gente fez uma campanha em desigualdade de condições absurdas. Você tinha um governo com três canais de televisão próprios, com toda a mídia institucional. Lá você compra mídia, então também a verba de publicidade oficial para comprar mídia durante a campanha era muito superior à da oposição. A desigualdade de capacidade na televisão para falar com o eleitor era absurda. No mínimo de 10 para 1. Como é que a campanha do Capriles respondeu? Essencialmente com o porta a porta.

Quantas pessoas foram usadas no porta a porta?
Não éramos nós que usávamos o porta a porta. A gente ajudava a municiar o porta a porta. A campanha do Capriles tinha o seu próprio dispositivo, muito militante.

Quantos militantes?
Não sei exatamente. Alguns milhares de pessoas. Mas o esforço do próprio candidato também foi absurdo. O Capriles fazia porta a porta durante toda a pré-campanha, durante a campanha todo santo dia...

Porta a porta é o candidato indo a um bairro e batendo de casa em casa?
Bate de casa em casa e conversa pessoa a pessoa. O que eu estou [tentando dizer é] tem duas coisas importantes: Primeiro o efeito direto do porta a porta feito pelo próprio candidato ou pelos militantes. E tem o impacto simbólico na comunicação de massa que é você mostrar alguém que realmente chega ao nível do cidadão, conversa, conhece profundamente, vai à sua casa, entra na sua casa, sabe o que está falando.

Fernando Henrique Cardoso ficou com a imagem do presidente do real. Estabilizou a economia, a inflação foi controlada. Luiz Inácio Lula da Silva é o presidente do social, do Bolsa Família, que ajudou os mais pobres. Agora veio Dilma Rousseff. Que imagem fica para ela?
Ela se coloca como uma continuação do governo do Lula. Ou seja, que tem um compromisso social como central da sua gestão. Até o próprio slogan do governo, "País rico é país sem pobreza", manifesta claro compromisso central com a redução da desigualdade e o compromisso social.

Mas está ficando essa imagem?
Eu queria dar um passinho atrás. Não acho que haja uma diferença de essência em relação ao compromisso social entre PT e PSDB. Esse é um ponto. Como é que isso aconteceu historicamente? Acho que o PSDB perdeu a sua identidade popular, quando se fala nacionalmente. Regionalmente, o PSDB continuou muito forte, muito capaz de vencer eleições. E localmente também, nos municípios. Agora, nacionalmente acabou de alguma maneira se configurando uma imagem de um partido que não está tão comprometido assim com a agenda social, e de um partido que talvez tivesse mais compromissos com a elite, digamos assim. Essa imagem que o eleitor mediano brasileiro passou a ter.

Por que aconteceu isso?
Acho que primeiro pelo PSDB não estar mais na Presidência. Quem está exercitando a Presidência da República é o PT, e durante os últimos dez anos houve uma melhoria de vida de uma parcela importante da população. É normal que se atribua a quem está gerindo o país neste momento. Então o PT naturalmente se beneficiou disso e o PSDB, por definição, já estava mais distante, e era quem exatamente antecedeu o PT. Além disso...

Mas o PSDB poderia ter feito alguma ação para não ser prejudicado por isso...
Claro, mas é sempre um pouco mais difícil quando você está no exercício da oposição. Não dispõe de todos os mecanismos de comunicação que estão acessíveis a quem é o incumbente.

O PT, enquanto não esteve no governo, sempre teve essa imagem de que, entrando no governo, iria cuidar do social...
Mas também tinha a imagem de radical. Também tinha a imagem de oposição por oposição. Tinha uma série de coisas negativas que só conseguiu desconstruir quando teve a chance de ter uma eleição de mudança pela frente e aproveitar bem a oportunidade que teve. É normal padecer de alguns males quando você está na oposição, particularmente porque a sua história também passa a ser contada com alguma eficiência por aqueles que estão no exercício do poder. Acho que é algo que também aconteceu ao PSDB. O PT conseguiu fazer isso com alguma competência nos últimos anos, manifestar sempre como ele via o PSDB, como via o passado do país. Então parte de nossa tarefa agora é exatamente, de alguma maneira, atualizar a imagem do PSDB.

O PSDB vai usar a imagem do ex-presidente Fernando Henrique em 2014?
Usar a imagem do Fernando Henrique é essencial. É um presidente que deixou um legado importantíssimo. É uma das lideranças centrais do PSDB. Quando você de alguma maneira oculta a sua própria origem, os seus próprios líderes, você não está fazendo um bem assim mesmo.

É óbvio que há contextos em que é mais difícil portar determinadas bandeiras. Mas tentar evitá-las, ocultá-las, é sempre um erro.

É claro que é uma questão mais de ênfase. No ano que vem, o eleitor brasileiro está muito mais interessado em discutir o futuro do que discutir o legado.

Você tem um país com milhões de pessoas que conseguiram mudar de vida muito por conta do seu próprio esforço. Conquistaram trabalho, abriram o seu próprio negócio, estão estudando, conseguiram entrar na universidade. Essas pessoas estão preocupadas com o quê? Com o próximo passo delas. Qual é a perspectiva que o país tem e que minha família tem. Como é que vou continuar prosperando.

Quando há uma eleição, o eleitor faz uma reflexão, ainda que de forma inconsciente: "Eu estou melhor ou estou pior do que estava há 4, 8 anos?". Em geral, as pessoas acham que melhoraram de vida. Esse é um obstáculo intransponível para a oposição?
Eu acho que são duas perguntas que o eleitor se faz. Tem a pergunta "poxa, eu estou vivendo melhor ou estou vivendo pior em relação ao passado?". É uma pergunta importante. Hoje, a maior parte da população brasileira vai dizer: "Estou vivendo melhor do que eu vivi no passado".

Mas a pergunta mais importante não é essa. A mais importante é: "Qual é a minha perspectiva de dia seguinte?" ou "qual é a minha perspectiva de futuro?".

Se você pergunta hoje ao cidadão se acha que a vida vai melhorar ou piorar nos próximos meses, a maior parte dos brasileiros tem insegurança em relação ao seu futuro.

Se você perguntar se os preços vão continuar aumentando ou vão diminuir, dois terços vão dizer que os preços vão continuar aumentando.

A incerteza em relação ao futuro hoje é muito significativa. Acho que vai vencer a eleição quem for capaz de transmitir confiança, segurança em relação à perspectiva de futuro dos cidadãos e das famílias brasileiras.

Mas Aécio Neves consegue incorporar tudo isso e transmitir essa segurança ao eleitor para o futuro?
É um processo. As janelas de comunicação de que dispõe o PSDB e o senador Aécio Neves hoje ainda são modestas. Você tem na mídia de massa algumas oportunidades -uma oportunidade a cada semestre [nos programas partidários].

Na mídia espontânea, quando o senador aparece em entrevistas e toda uma iniciativa agora no campo digital de criar canais próprios de comunicação com o eleitor brasileiro. É um processo. Acho que no ano que vem e ao longo da campanha é quando de fato vão existir as condições necessárias para uma comunicação mais próxima nessa direção. Agora, é um caminho que já se iniciou e tem esses objetivos.

O senador Aécio foi modesto no trabalho até agora de nacionalizar o seu nome?
Acho que não. Em primeiro lugar havia uma tarefa política importante de gestão dentro do próprio partido, de articulação política dentro das próprias bases do PSDB. Foi um trabalho muito bem conduzido até agora. Tinha de ser a prioridade do senador durante os últimos meses.

A partir de agora começa uma agenda mais voltada para o eleitor, para fora.

Se o eleitor hoje tende a dizer que hoje está melhor do que nos anos passados, por que então trocaria o grupo político que já está no poder?
Porque está tudo dando mais ou menos certo. Se for uma força que está dando certo, eu te diria que sim. Mais ou menos dando certo, já são outros quinhentos.

Tudo certo foi em 2010, com a eleição de Dilma Rousseff?
Claro. Ali era uma eleição de continuidade escancarada. Você tinha a economia crescendo muito, um momento de boom das famílias brasileiras tendo uma renda melhor, com acesso a muito mais bens de consumo, a mais alimentos, sentindo-se empoderadas, com mais direitos.

Agora, esses milhões de pessoas que conseguiram prosperar não são fiéis a ninguém. A preocupação delas é com o próximo passo, como vai ser o dia de amanhã. É a coisa mais normal do mundo. A principal coisa que a gente pensa é como é que é o nosso dia amanhã. Estamos tranquilos? Vamos continuar bem? A nossa família vai continuar direito, nossos filhos vão seguir adiante? Se você começa a ter incerteza e insegurança em relação a isso, se o seu salário começa a não conseguir pagar a renovação do teu aluguel, começa a não conseguir botar os mesmos alimentos que botava em casa, o teu padrão de vida começa a ser um pouquinho comprometido, você começa a ter insegurança.

Mas sobre a economia, mesmo os mais pessimistas concordam que este ano não será tão ruim como o ano passado...
Ainda bem.

...E que em 2014, como em todo ano eleitoral, a economia ficará um pouco mais aquecida. Esse cenário não muito favorável à reeleição de Dilma Rousseff?
Se houvesse uma retomada do crescimento muito expressiva. A perspectiva de economistas é que a gente cresça na casa dos 2%. Ninguém no PSDB torce por um mau desempenho do país. E nós não estamos falando hoje com um eleitor ou com um país que está em crise. Ou com um eleitor que é um coitadinho. Nós não estamos falando de Itália, de Portugal, de economias em crise. Nós estamos falando com um país que está numa encruzilhada. Uma economia que está andando de lado, com famílias que conseguiram prosperar até um certo ponto, mas agora estão tendo dificuldades de renovar suas expectativas de continuar progredindo. E que têm dúvidas, incertezas e inseguranças importantes em relação ao seu futuro. Não creio que essas incertezas se transformem em certezas daqui para o ano que vem. A não ser que houvesse uma mudança substantiva do quadro econômico brasileiro.

Qual será a síntese do discurso de Aécio Neves em 2014?
A síntese é "quem muda o Brasil é você". Por quê? Por duas razões. A grande mudança nos últimos anos -redução da desigualdade e a emergência de milhões de brasileiros- se deve em grande parte ao esforço de cada uma dessas pessoas. Os brasileiros conquistaram um melhor lugar ao sol graças ao mérito próprio.

O segundo ponto tem a ver com a agenda mais liberal que o PSDB carrega em relação à economia. É uma visão de que o agente da mudança não é essencialmente o Estado. O agente da mudança está na sociedade. São os indivíduos, são as empresas, é a sociedade civil organizada....

É difícil introduzir esse tipo de ideia num país tão acostumado a olhar para o Estado como um grande senhor e esperar que ele resolva tudo...
Isso tem mudado. Se tem uma das coisas que mais têm mudado no país é exatamente essa cultura do brasileiro médio. Há mudanças importantes em relação ao comportamento, como se vê o mérito, o valor das coisas. Há 30 anos, o sonho do brasileiro médio era se tornar funcionário público. Era ter estabilidade, era não ter que se preocupar. É um certo estereótipo. Aposentar-se aos 50 anos.

Hoje, o sonho de muitos brasileiros é ter o seu negócio próprio. É conseguir progredir graças ao seu esforço. O sonho de muitos brasileiros é fazer com que os seus filhos consigam ir além. Como? Estudando mais. Tendo acesso a uma educação de qualidade. São mudanças culturais importantes acontecendo no Brasil. São as coisas mais interessantes e mais positivas que vêm acontecendo no nosso país nos últimos anos.

A maioria do eleitorado já enxerga mesmo o Estado desse jeito, mais distante e não como o senhor provedor de tudo no Brasil?
Eu não recorto o problema dessa maneira. Acredito que boa parte do eleitorado brasileiro, a chamada nova classe média, tem uma profunda convicção de que está conseguindo mudar de vida porque está ralando, trabalhando e se esforçando para isso.

Tem consciência de que o esforço está sendo recompensado. Não é que o cidadão médio brasileiro não valoriza o papel do governo. Claro que valoriza. Só que a gente está dizendo que o papel do governo é ser um parceiro seu. O papel do governo é dar as condições para que você tenha sucesso do seu jeito. É oferecer infraestrutura de qualidade, é oferecer educação de qualidade, é administrar a economia com competência. A gente dá as condições, mas o sujeito da mudança do progresso é você. Não sou eu que te guio.

Os adversários de Aécio Neves questionam o estilo de vida dele que não seria compatível com o de um candidato a presidente. Esse aspecto da vida pessoal do senador o prejudicará na campanha?
Isso tem um efeito bastante limitado porque não é plenamente verdadeiro. Ele é uma liderança política brasileira com uma gestão admirável em Minas Gerais. Tem um legado efetivo como gestor. Foi governador duas vezes. Pegou Minas como um Estado praticamente falido.

Do ponto de vista pessoal, você tem um candidato leve, com espírito jovem, capaz de se comunicar muito bem. Capaz de chegar ao nível de proximidade das pessoas e conversar com intimidade, com naturalidade.

Acabamos de fazer um programa [partidário do PSDB para a TV, em 19.set.2013]. Se tem uma coisa que nos diferencia um pouquinho em relação a outras escolas de comunicação brasileira é que raramente usamos teleprompter. Na televisão, o senador Aécio Neves fala espontaneamente o tempo inteiro.

Mensalão: que impacto terá no ano que vem, na eleição?
Não creio que tenha muito impacto, assim como já não teve no passado. A gente acabou de sair de uma eleição, em 2012, em que se teve todo o drama público do julgamento, acontecendo diante da televisão. Não vi nenhuma candidatura do PT sendo prejudicada por conta disso.

Ou seja, o mensalão não terá impacto significativo em 2014?
Acho que tem uma sobrevalorização enorme em relação a isso. E basta você ver a experiência recente. Lembre-se de 2012. Não teve um impacto tão grande assim.

Será ineficaz a candidatura do PSDB citar o caso do mensalão?
Você tem distinções. O mensalão é um episódio importante para o país, tanto em relação ao passado recente do país como também que país você quer.

Mas merece estar na propaganda do PSDB, do senador Aécio Neves?
Se você pensar no efeito estritamente eleitoral, talvez não. Mas eleição não é feita apenas de temas que têm um efeito específico eleitoral. É feita também de valores, de princípios.

Mas haverá algum programa em que o senador Aécio Neves falará: "Veja o caso do mensalão..."?
É muito cedo para dizer isso. Na minha opinião, não é um tema particularmente relevante para o eleitor brasileiro. E, como ponto de prova, só lembrar 2012.

A tendência seria não utilizar na campanha?
Como eu disse, uma campanha não é feita só de temas que têm ume relevância eleitoral. Há questões de princípios muitas vezes importantes de se manifestar, independente do peso eleitoral que possa vir a ter ou não.

Há também acusações nesse campo de corrupção contra o PSDB. O chamado mensalão mineiro. Esses casos acabam se neutralizando?
Nunca avaliei especificamente se acabam se neutralizando. É uma hipótese a se testar. O que eu realmente avaliei objetivamente é o impacto do mensalão sobre as eleições e sobre a decisão do voto do eleitor. Na sua maioria, tirando um eleitor de classe média mais alta, esses temas não têm uma penetração tão grande assim.

Que tipo de abordagem se daria então para esse tema?
Tem que falar desse tema porque é um tema presente, é incontornável. Uma das questões importantes do Brasil é impunidade. É um tema relevante do ponto de vista dos princípios. Mas não por seu peso eleitoral. O peso eleitoral acho que é reduzido.

Quais dos nomes já citados como pré-candidatos a presidente serão competitivos em 2014?
Temos quatro candidatos competitivos em 2014: Dilma, Aécio, Marina [Silva] e Eduardo [Campos].

Joaquim Barbosa seria competitivo?
Não creio.

José Serra seria competitivo?
Mais difícil de responder a essa pergunta. Se você considerar aspectos das últimas pesquisas, talvez fosse.

Lula seria um incômodo maior para a oposição?
Acho que o Lula tem mais força eleitoral do que a presidente Dilma. Não tenho a menor dúvida. Então, respondendo à tua pergunta, sim.

Se Lula fosse candidato, seria mais difícil a oposição vencer a eleição?
Acho que sim. Se você coloca o Lula, é só ver as últimas pesquisas, ele é um candidato com mais força eleitoral do que a presidente Dilma.

Se José Serra ficar no PSDB e se engajar na campanha de Aécio, ajuda?
Nunca testei essa hipótese em pesquisa, mas creio que sim. Porque você tem um partido mais unido, com as suas forças trabalhando lado a lado. Imagino que sim.

Se Serra vier a ser candidato a presidente por outro partido, é bom ou ruim para a oposição?
Acho que para oposição, quanto mais nomes você tiver capazes de atrair o eleitor, melhor. Isso é uma coisa matemática: quanto mais candidaturas de oposição você tiver, mais chance tem de segundo turno, mais chance de votos no campo de oposição.

Mas e para o PSDB?
Para o PSDB, aparecer como um partido que está unido é mais positivo do que ter líderes que são importantes trabalhando em partidos separados. Para o PSDB é melhor que esteja todo mundo junto no mesmo barco.

Acesse a transcrição completa da entrevista: Primeira parte segunda parte

A seguir, os vídeos da entrevista (rodam em smartphones e tablets):

1) Principais trechos da entrevista com Renato Pereira (12:08);

2) 'Serra candidato ajuda oposição, mas é ruim para PSDB' (2:24);

3) PSDB perdeu identidade popular, diz Renato (2:14);

4) Efeito do mensalão será pequeno em 14, diz Renato (3:49);

5) Eleitor não é fiel a ninguém, afirma Renato (4:35);

6) Vida pessoal de Aécio não terá impacto, diz Renato (1:38);

7) 'Candidatos não revelam o que pensam de temas morais' (2:24);

8) Renato: FHC é essencial, mas eleição é sobre o futuro (3:20);

9) Marqueteiros são alvo de preconceito, diz Renato (1:53);

10) Contato individual com eleitor será relevante em 14 (3:03);

11) Renato: Uso narrativa documental, pouco publicitária (1:44);

12) Quem é Renato Pereira? (2:00);

13) Íntegra da entrevista com Renato Pereira (80 min.);

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