Antigamente não havia uma lei para ser aplicada a todas as eleições. Entre 1988 e 1997, cada pleito teve uma regra diferente. Vigorava a insegurança jurídica.
Em 1997 veio a Lei Geral das Eleições (lei 9.504), pretendendo regrar, de forma geral e perene, as votações brasileiras. Na prática, isso não deu tão certo assim.
Se antes havia uma lei nova para cada eleição, hoje temos quase três a cada pleito.
O Código Eleitoral, a Lei de Inelegibilidades, a Lei dos Partidos Políticos e a Lei 9.504/97 foram alteradas 29 vezes nos últimos 20 anos, período em que tivemos apenas 10 eleições.
É possível afirmar que todo ano par é de eleição e quase todos os ímpares são de reformas eleitorais. A última, por exemplo, veio em um combo com duas leis e uma emenda à Constituição.
Uma de suas polêmicas está no autofinanciamento de campanha (uso do dinheiro do próprio candidato).
Em 2017 o Legislativo incluiu um limite de autofinanciamento correspondente a 10% da renda bruta auferida pelo candidato no ano anterior. Se, por exemplo, um candidato a presidente da República ganhou R$ 70 milhões, poderia usar no máximo R$ 7 milhões.
Entretanto, o presidente Michel Temer vetou este limite de 10%. No caso hipotético, para presidente da República seria possível que o candidato utilizasse até R$ 70 milhões de seu próprio dinheiro na campanha, portanto.
Neste mês, no entanto, o Legislativo revogou parte do veto presidencial, trazendo de volta o limite de 10%.
A derrubada do veto levou a uma dúvida: qual o limite de autofinanciamento para as eleições de 2018? Nesse momento, não podemos ter certeza da resposta.
Com a controvérsia jurídica, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Gilmar Mendes, afirmou que caberá à corte definir os limites do autofinanciamento para 2018. A questão poderá parar no Supremo Tribunal Federal.
Um ponto essencial é que a derrubada do veto presidencial se deu a menos de um ano da eleição, que ocorrerá em 7 de outubro. O artigo 16 da Constituição impede a imediata aplicação de normas que alterem o processo eleitoral caso não haja, no mínimo, um ano de intervalo entre a mudança e a eleição.
Por isso, não seria possível aplicar este limite de 10% de autofinanciamento para a eleição de 2018.
Em outras palavras, os efeitos da alteração deveriam ser aplicados apenas em eleição que ocorra além de um ano.
Isso porque a derrubada do veto deveria ser equiparada à entrada de um novo dispositivo legal -que neste caso, poderia ser aplicado somente a partir das eleições municipais de 2020.
A não ser, obviamente, que o TSE e/ou o STF entendam que mudar regras de financiamento não alteram o processo eleitoral. Ou que o veto presidencial não gerou efeito algum.
O que não há dúvidas é que entraremos no ano eleitoral sem ter certeza sobre qual é o limite do autofinanciamento de campanha.
A volatilidade da lei eleitoral deixa todos mais confusos e inseguros -incluindo juízes, promotores e advogados que atuam no âmbito eleitoral.
A incerteza tende a distanciar cada vez mais a população do jogo democrático e das regras eleitorais. Afinal, em tantas eleições que tivemos, não conseguimos fazer, sequer, duas com as mesmas regras eleitorais.
DIOGO RAIS é professor de Direito Eleitoral da Universidade Presbiteriana Mackenzie