Folha de S. Paulo


Futuro ministro pede indiciamento de Janot por 'armação contra Temer'

Pedro Ladeira - 12.set.2017/Folhapress
O deputado Carlos Marun (PMDB-MS), defensor do presidente Temer, é escolhido como relator da CPMI da JBS no Congresso, em Brasília
O deputado Carlos Marun (PMDB-MS), um dos principais defensores do presidente Temer

A poucos dias de ocupar um dos principais ministérios do Palácio do Planalto, o deputado Carlos Marun (PMDB-MS) atacou as investigações que atingem o presidente Michel Temer.

Relator da CPI da JBS, Marun propôs do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot e de seu ex-chefe de gabinete Eduardo Pelella.

Chefe da tropa de choque de Temer no Congresso, o deputado assume na quinta-feira (14) a Secretaria de Governo, pasta responsável pela articulação entre Executivo e Legislativo.

"Houve uma conspiração para afastar o presidente, e a intenção da PGR era interferir na sua própria sucessão. Isso é uma atividade ilícita, para a qual cabe indiciamento", disse Marun.

Em sessão desta terça-feira (12), ele apresentou o relatório final da CPI. A previsão é que o texto seja votado na manhã de quarta-feira (13).

Ele sugere ainda que, por se tratar de "armação", as provas obtidas como desdobramento da delação da JBS sejam invalidadas.

Gravado pelo empresário e delator Joesley Batista, Temer foi denunciado pela Procuradoria pelos crimes de corrupção passiva, organização criminosa e obstrução da Justiça. As acusações foram suspensas por decisão de maioria da Câmara e devem ser retomadas apenas quando o peemedebista deixar o Palácio do Planalto, em 2019.

SEM POLÍTICOS

Além de Janot e Pelella, os irmãos Wesley e Joesley Batista devem ser alvo de indiciamento. O pedido atingirá ainda o ex-procurador Marcello Miller e o executivo da JBS Ricardo Saud. Pelo texto de Marun, nenhum político será acusado.

Mais relatórios serão apresentados na comissão.

Outro documento foi apresentado pelo deputado Wadih Damous (PT-RJ), que propôs um projeto de lei para modificar a delação premiada.

Os deputados e sub-relatores Fernando Francischini (SD-PR) e Hugo Leal (PSB-RJ) também divulgarão seus pareceres.

Devido a divergências, integrantes da CPI devem se reunir na noite desta terça para construir um acordo em torno de um único texto. Francischini e Leal querem demover Marun da ideia de indiciar o ex-PGR. Eles argumentam que não há indicativos de crime por parte de Janot.

Ao fim da sessão, o peemedebista reconheceu que poderá mudar de ideia, se for convencido pelos demais integrantes da comissão.

Em meio às discussões houve ainda protestos de alguns dos presentes, sobre os objetivos da comissão, que não deve indicar nenhum político.

"Indiciar o Janot? Essa é a intenção real dessa CPI", disse o deputado João Alberto (PSDB-BA). Em críticas à atuação da comissão, o tucano disse que a CPI foi esvaziada. Por último, em tom de ironia, desejou "boa viagem" a Marun como ministro. "Boa viagem, que faça um bom serviço", disse.

Quando a Câmara barrou o prosseguimento da segunda denúncia da PGR contra Temer, em outubro, Marun comemorou com uma dancinha em plenário.

Marun dança

A CPI não tem poder de indiciar, mas sim de sugerir providências às autoridades competentes, como a Polícia Federal, o Ministério Público e tribunais de contas. Caberá a estes órgãos definir se seguem a orientação dos parlamentares.

REAÇÃO DE DODGE

Após evento no CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) na manhã desta terça, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, limitou-se a dizer que vai analisar o relatório da CPI. Dodge foi questionada sobre o interesse da instituição em dar prosseguimento ao indiciamento de Janot.

"Nós não recebemos ainda nenhum indicativo da CPMI nesse assunto. Assim que recebermos haverá análise adequada sobre o tema", respondeu. Dodge e Janot são vistos como adversários dentro da PGR.

Em seguida, jornalistas perguntaram à procuradora-geral se o resultado da CPI representa uma tentativa de intimidar o Ministério Público.

"Não me cabe fazer nenhuma consideração sobre a intenção [dos parlamentares]. O que posso lhes dizer é que, quando receber esses documentos, haverá a análise adequada no momento oportuno", disse Dodge.

A procuradora-geral também sinalizou que não deve dar um novo parecer sobre o pedido de Janot de rescindir os acordos de delação de Joesley e Saud.

"Essa [a rescisão do acordo] é uma questão que está posta para o STF na seguinte perspectiva: o procurador-geral Rodrigo Janot rescindiu o acordo e submeteu essa rescisão à homologação do STF exatamente porque esta era uma das cláusulas pactuadas nesse acordo: de que, se houvesse rescisão, essa rescisão ia ser submetida à homologação do Supremo. É o que estamos aguardando", afirmou.

REPÚDIO

A ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República), que representa os membros do Ministério Público Federal, divulgou uma nota repudiando o relatório de Marun. Para o presidente da entidade, José Robalinho Cavalcanti, a CPI "se afastou dos propósitos constitucionais e utilizou seus recursos para investigar e retaliar os investigadores, encerrando seus trabalhos de forma parcial e melancólica, sem apresentar qualquer resultado".

"Não há prova capaz de embasar o ilógico e inconstitucional indiciamento proposto pelo relator e que, espera-se, não seja referendado pela CPMI [...] Trata-se, portanto, de um relatório político, que padece de grave imprecisão jurídica, apresentado por um parlamentar que, não por acaso, irá se tornar ministro em 48 horas", diz a nota.

A ANPR também afirmou que o relatório em separado apresentado pelo deputado Wadih Damous (PT-RJ), que propõe indiciar três procuradores da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba que não atuaram no caso JBS, "deixa mais uma vez evidente a intenção da CPMI de exorbitar seu foco inicial".

"A CPMI encerra os seus trabalhos comprovando, infelizmente, a parcialidade com que se firmou desde o início. Não ouviu nenhum dos políticos que foram indicados como participantes do esquema da JBS. Mudou o foco completamente para investigar e retaliar apenas os investigadores, mostrando que tinha a intenção meramente política de defesa do governo."


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