Ao optar por um antipetismo com tempero vários graus de ardência acima da faixa na qual costuma operar, Geraldo Alckmin faz uma opção lógica, ainda que arriscada, enquanto se consolida como o candidato tucano ao Planalto.
Consolida é o termo porque Arthur Virgílio, o resiliente prefeito manauara, decidiu levar até o fim sua postulação por prévias, mesmo sob risco de virar o Eduardo Suplicy do PSDB. Mas a chance de Alckmin não ser o presidenciável do partido em 2018 é igual a zero hoje.
Ao dizer que as "urnas condenarão o PT, que jogou pela janela nossa autoestima" e falar na "audácia dessa turma", Alckmin se dirige ao eleitor que protagonizou as eleições municipais de 2016, quando a onda anti-PT varreu o país na esteira do petrolão e do impeachment de Dilma Rousseff. Como todas as pesquisas indicam, esse eleitorado que rejeita Luiz Inácio Lula da Silva e seu partido migrou em boa parte para a pré-candidatura de Jair Bolsonaro (PSC, em breve Patriotas).
Então os tucanos precisam buscar recuperar seu lugar nesse polo. A equação fica complicada porque Bolsonaro não cresceu apenas no antipetismo, mas sim na onda de indignação geral contra a classe política —o fato de ele ser um político por profissão é apenas uma das ironias do processo. E, para esse eleitorado, o PSDB de Alckmin e, principalmente, do enrolado Aécio Neves não se diferencia do PT, do PMDB, PP ou qualquer outra "sopa de letras", como define o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Alckmin, aliás, seguiu o conselho dado por FHC em entrevista recente à Folha, de evitar a demonização de adversários cuja base eleitoral pode ser atraída, nem que seja apenas no segundo turno. A lição de Hillary Clinton praticamente chamando os eleitores de Donald Trump de toscos em 2016 é eloquente. A crença em que Bolsonaro desidratará naturalmente hoje é menos consensual entre políticos, mas ainda majoritária e também entra nessa conta.
O discurso do governador paulista também mirou franjas do eleitorado mais pobre que é lulista, mas não necessariamente petista. O apelo à inclusão social e pelo combate das desigualdade hoje é monopólio quase exclusivo de Lula no imaginário popular, mas o fato de que o tucano é mais popular entre mais pobres do que mais ricos dá esperanças a seus aliados. Mas não é casual o discurso neste sábado de FHC pedindo para o partido se "reconectar com as ruas".
Há riscos para a tática alckmista. Político conciliador, com imagem de comedimento e recato pessoal segundo pesquisas internas do PSDB, ele terá de apostar na ideia de que é um nome de união nacional em contraposição ao radicalismo que Lula tirou da prateleira desde que foi colocado nas cordas por sucessivos problemas com a Justiça. Mas, com Bolsonaro mordendo pedaços do eleitorado antipetista, o governador teve de falar mais grosso, algo que não lhe é natural em público.
Como disse FHC, "o marqueteiro não pode mudar muito a pessoa, porque dá errado", numa referência indireta à Dilma de 2014. O desafio dos tucanos é encontrar um ponto de equilíbrio ao condimentar o proverbial chuchu a ser servido à população na campanha. O recente episódio no qual gritou com um político que o atacava durante evento acendeu luzes amarelas entre seus estrategistas: Alckmin berrando impropérios em palanques não soa, digamos, natural.
Além disso, os discursos da convenção deixaram clara a dificuldade que o partido terá para explicar sua associação com o governo Temer, ainda que caciques como FHC minimizem o problema. O que não dá é criar narrativas alternativas, para usar um eufemismo, como fez Alberto Goldman ao dizer que o PSDB nunca embarcou no governo.