Folha de S. Paulo


Fiz uma lambança, diz ex-procurador sobre caso JBS

Pedro Ladeira/Folhapress
BRASILIA, DF, BRASIL, 29-11-2017, 12h00: Reunião da CPMI da JBS destinada a ouvir o ex-procurador Marcelo Miller (FOTO). O senador Athaídes Oliveira (PSDB-TO) preside a sessão e o relator é o deputado Carlos Marun (PMDB-MS). No senado federal. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, PODER)
O ex-procurador Marcello Miller na CPMI da JBS

O ex-procurador Marcello Miller afirmou em depoimento na CPI da JBS que "fez uma lambança" ao ter participado das negociações de acordo de delação premiada e leniência da empresa e seus executivos.

Ele se defendeu de acusações e disse que não cometeu crime, mas admitiu ter ajudado os irmãos Joesley e Wesley Batista antes de ter deixado oficialmente o Ministério Público.

Miller negou que tenha orientado Joesley a gravar o presidente Michel Temer.

"Eu não cometi crimes. Eu não cometi nenhum crime. Eu fiz uma lambança e é por isso que eu estou aqui", afirmou o depoente nesta quarta-feira (29).

"Olha, eu tenho um filho de cinco anos, eu acredito em algumas coisas. Pela vida do meu filho, eu não mandei gravar o presidente, não", disse Miller.

O ex-procurador é um dos principais personagens da polêmica que provocou a suspensão dos acordos de dois delatores da JBS.

A delação dos empresários provocou a mais grave crise política do atual governo. Temer foi denunciado duas vezes, sob acusação de obstrução de Justiça, corrupção passiva e organização criminosa.

Miller atribui a "lambança" ao fato de não ter medido as interpretações que poderiam vir do fato de ele ter participado antes da exoneração.

"Eu acho que o que aconteceu foi o seguinte: ao refletir sobre a situação, analisei que não havia crime e não havia ato de impropriedade, mas não me atentei para as interpretações que poderia suscitar. Não me atentei".

Miller formalizou o pedido de saída do Ministério Público na semana de 20 de fevereiro. A exoneração só saiu no Diário Oficial nos primeiros dias de abril.

Sua atuação, de acordo com mensagens apreendidas e e-mails revelados por quebra de sigilo, começou na primeira quinzena de fevereiro.

O ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot chegou a pedir sua prisão. O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Edson Fachin, relator do caso, não concedeu. A PGR (Procuradoria Geral da República) nunca recorreu.

Os acordos de Joesley Batista e Ricardo Saud estão suspensos. Eles estão presos desde o começo de setembro.

Miller afirmou à CPI que considera não ter traído o Ministério Público.

"Eu não trai o Ministério Público, de jeito nenhum. Isso não aconteceu. De fato, eu comecei a ter contato com a JBS antes da exoneração. Foi quando comecei a ter diálogo, respondia perguntas, refletia sobre o caso, não estou negando nada disso. Tudo que eu incentivava a fazer era o que eu faria se tivesse no exercício de alguma atribuição. Eu estava incentivando eles a falarem a verdade", afirmou.

AMIGOS

O ex-procurador disse aos parlamentares que nunca foi o "braço-direito" de Janot.

Admitiu, porém, ter amizade com Eduardo Pelella, chefe de gabinete do ex-procurador-geral da República.

Miller negou que tenha contado a um dos dois que estava trabalhando na delação e na leniência da JBS.

"O doutor Pelella não teve nenhuma conhecimento da atividade preparatória que desempenhei em fevereiro e março. Janot menos ainda", disse.

O ex-procurador ainda rebateu declarações recentes de Janot, que disse que ele teria agido por ganância.

"Eu não agi por ganância. Se fosse por ganância, eu teria ido advogar na área criminal. Os honorários são muito maiores. Eu nunca quis isso. O então procurador-geral foi extremamente infeliz. Eu morei num apartamento alugado de 40 metros quadrados, quando morei aqui [em Brasília] trabalhando com ele".

CONFISSÃO

A quebra do sigilo de e-mail de Miller revelou que ele tinha em sua caixa de mensagens um roteiro com orientações sobre como os executivos e advogados da JBS deveriam se portar para fechar o acordo de delação, como revelou a Folha no início deste mês.

Antes, logo que o caso foi levantado, após a delação da empresa se tornar pública, tanto a PGR quanto Miller negavam que havia tido alguma ajuda no processo.

Em depoimento à PF, o ex-procurador havia dito que ajudou para não ser "descortês", mas que havia feito somente reparos "linguísticos e gramaticais" a uma espécie de esboço de um primeiro documento do delator Ricardo Saud, diretor de Relações Institucionais do grupo comandando pelos irmãos Joesley e Wesley Batista.


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