Folha de S. Paulo


Bretas diz que provas devem ser mantidas em delações problemáticas

Urbano Erbiste - 15.dez.2016/Agência O Globo
O juiz Marcelo Bretas, para quem não haveria a 'moda do compliance' se honestidade fosse padrão
O juiz Marcelo Bretas, para quem não haveria a 'moda do compliance' se honestidade fosse padrão

O juiz da 7ª Vara Criminal Federal, Marcelo Bretas, responsável pelos processos da Lava Jato no Rio, disse nesta terça-feira (12) que a "honestidade não deveria ser uma moda no país", mas sim uma praxe de toda a sociedade.

Bretas deu uma palestra na Faculdade São José, instituição privada em Realengo, zona oeste do Rio.

O magistrado falou por cerca de uma hora e meia e fez uma crítica ao que ele classificou como uma moda do "compliance", que são setores nas empresas criados para garantir as melhores práticas do mercado e evitar desvios como a corrupção.

Bretas afirmou que não haveria essa "moda" se a honestidade fosse tratada como algo corriqueiro no país.

"Hoje está na moda ser honesto. As empresas têm agora seus setores de compliance. A honestidade não pode ser moda", disse ele a uma plateia de universitários da graduação.

Apesar de criticar a suposta nova tendência, ele diz ser benéfico para o país o momento de combate à corrupção. Afirmou ainda que o trabalho da Justiça e dos órgãos de investigação do Brasil tem sido exemplo para outras nações . "Países desenvolvidos querem saber o que estamos fazendo", disse.

Ele citou as propostas que serão levadas ao conselho de Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas) que pretendem tornar a corrupção crime contra a humanidade.

Durante sua fala, o magistrado ressaltou diversas vezes que não se referia a casos específicos sob sua responsabilidade. Ele não mencionou nenhum político de maneira explícita, mas as referências ficaram claras.

"Vou repetir que não estou citando nenhum caso concreto. Um secretário de Saúde, por exemplo, que desvia milhões, envia dinheiro para exterior e deixa de pagar médicos, comprar materiais, reduz o atendimento de doenças complexas...Quantas pessoas esse cidadão hipotético atingiria? É incalculável", disse ele, que afirmou concordar com o desejo da ONU em classificar corrupção crime contra humanidade.

Bretas falou em caso hipotético, que, porém, se assemelha ao do ex-secretário de Saúde do Estado do Rio, Sérgio Côrtes, preso por suspeita de integrar esquema de desvio de recursos da saúde na gestão de Sérgio Cabral (PMDB), também preso. Cabral e Côrtes negam as acusações.

TEMER

A única menção explícita foi ao presidente Michel Temer. Ele disse que o país vive a "situação insólita" de ter um presidente denunciado pela PGR (Procuradoria Geral da República) no exercício do mandato.

Bretas ressaltou, contudo, que o "amadurecimento das instituições" permitiu que a investigação não ensejasse instabilidade política. Bretas lembrou que a bolsa de valores têm tido recordes de transações nos últimos dias.

"Isso significa que o investidor, que havia perdido a confiança no Brasil nos últimos dez anos, voltou a acreditar no país, no trabalho que tem sido feito", disse.

DELAÇÃO

Bretas reservou parte de sua palestra para defender o instituto da delação premiada, que está sob ataque em razão das polêmicas em torno do acordo firmado com os executivos da J&F Joesley Batista e Ricardo Saud.

Também sem mencionar o caso específico, Bretas afirmou que os acordos são regidos por lei e reforçou que, no caso de mau uso por parte dos delatores, as provas produzidas são mantidas no processo.

"Essa negociação ocorre dentro da lei. Temos que ter muito cuidado com o que tem sido dito porque uma mentira contada muitas vezes se torna verdade. Calma, se ele [delator] fez algo de errado, a lei pune", disse.

O magistrado disse que os ataques às delações são feitos por aqueles que desejam sair impunes de processos criminais. Bretas afirmou que é natural que agentes públicos que estejam vendo "seu castelo de cartas cair" combatam o instituto da delação. "Você acha que essa pessoa está feliz? Ele vai fazer tudo que puder para barrar a delação".

Bretas reforçou em sua fala a proximidade das eleições de 2018 e pediu aos presentes que estudassem bastante a atuação dos candidatos. "Não podemos franquear o direito de escolher nosso candidato ao próximo", disse.


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