Folha de S. Paulo


Justiça mantém oculto valor da propina da linha 5 do Metrô

Marcelo Justo - 10.ago.2008/Folhapress
ORG XMIT: 484601_1.tif Estação do Capão Redondo da linha 5-lilás do metrô. De 110 mil usuários nos dias da semana, número deve cair para 37 mil passageiros aos domingos e feriados.(São Paulo, SP, 10.08.2008. Foto de Marcelo Justo/Folhapress)
Estação do Capão Redondo da linha 5-lilás do metrô

A juíza Simone Casoretti negou um pedido do governo de São Paulo para revelar documentos que informam qual foi o valor da propina e quem foi o funcionário público que a Camargo Corrêa subornou para fazer as obras da linha 5 - lilás do Metrô, uma licitação de R$ 3,5 bilhões, em valores atualizados.

A decisão contrasta com as de juízes da Lava Jato, que tornam públicas informações sobre valores de suborno e quem embolsou o montante.

A negativa ocorreu no processo em que a empreiteira propôs um acordo judicial no qual confessa os crimes de cartel e superfaturamento, conforme a Folha revelou no último sábado (1).

A empresa propõe duas medidas para fechar o acordo: o pagamento de R$ 24,3 milhões para ressarcir a prática de cartel e a retirada de uma ação judicial na qual cobrava R$ 27 milhões do Metrô por supostos prejuízos nessa obra para compensar o sobrepreço.

A Fazenda Pública, que representa o governo, queria saber o valor da propina para calcular se o ressarcimento é proporcional aos danos.

O CARTEL

Os R$ 24,3 milhões que a Camargo Corrêa propõe a reembolsar ao Estado são 1/15 do prejuízo estimado na obra pelo Ministério Público, de R$ 326,9 milhões. As outras empresas que participaram da obra pagariam o restante.

A Camargo Corrêa afirma na proposta que dividiu a obra com Odebrecht, Andrade Gutierrez, OAS e Queiroz Galvão.

A Andrade Gutierrez vai confirmar a narrativa da Camargo na continuidade de sua delação na Operação Lava Jato, segundo a Folha apurou.

A Folha havia revelado em 2010 quem seriam as empresas vencedoras da licitação, feita em 2008 pelo então governador, José Serra (PSDB).

A negativa da juíza foi uma mudança de opinião no mesmo dia. Na última segunda-feira (3), ela havia mandado o Ministério Público juntar em 24 horas dois documentos que citam os valores pagos e o beneficiário do suborno. Horas depois, no entanto, alterou a decisão.

A Folha apurou que o funcionário citado é Sérgio Brasil, diretor do Metrô que cuidava das licitações e inclui na concorrência, após o acerto do suborno, que só empresas que tinham experiência com tatuzão poderiam fazer os lotes mais caros da obras. Era isso que as cinco empreiteiras grandes queriam.

Em entrevista à Folha, a juíza disse que os dois anexos sigilosos do acordo nem faziam parte da ação até esta quinta-feira (6).

Só ontem os documentos foram entregues pelo Ministério Público. O acordo entre o promotor Marcelo Milani e a Camargo Corrêa foi assinados no dia 13 de junho.

O promotor queria que os documentos continuassem sob sigilo até que a juíza homologasse o acordo.

"Não tem sentido o sigilo nesse caso. O governo e o Metrô têm de saber o valor da propina para estimar o prejuízo", diz Gustavo Badaró, professor de direito da USP. Isso é necessário, segundo ele, porque a propina é um percentual do valor do contrato e precisa ser ponderada na avaliação do ressarcimento.

A juíza discorda dessa visão. "O ressarcimento não tem nada a ver com propina, que será objeto de outra ação".

Ela disse que concordou em manter os anexos fora do processo para evitar que investigados destruam provas.

"Não vai haver nada sigiloso nos próximos dias. Concordo que os valores da propina devem ser públicos", diz Simone Casoretti. "Esses anexos não entraram no processo porque não estavam aqui".

Procurado, o promotor não quis se manifestar sobre o sigilo dos documentos.


Endereço da página:

Links no texto: