Folha de S. Paulo


Agência Lupa: Michel Temer ataca com dados equivocados

Eduardo Anizelli/Folhapress
BRASILIA, DF, BRASIL, 27-06-2017, 15h30: O Presidente Michel Temer, faz discurso acompanhado de Deputados Federais, no Palacio do Planalto, em Brasilia. (Foto: Eduardo Anizelli/Folhapress, PODER)
O presidente Michel Temer em pronunciamento nesta terça (27)

Em discurso pós-denúncia, o presidente Michel Temer falou sobre áudios de Joesley e criticou a Procuradoria. Confira dados equivocados.

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"Ele [o ex-procurador Marcelo Miller] ganhou milhões em poucos meses (...) Podíamos concluir, nessa hipótese que estou mencionando, que talvez os milhões não fossem unicamente para o assessor de confiança [de Janot]"

CONTRADITÓRIO Logo em seguida, no mesmo pronunciamento, o presidente Michel Temer disse que possui "a mais absoluta convicção" de que não pode "denunciar sem provas" nem "fazer ilações". Em suas palavras: "Não posso ser irresponsável. Não posso criar falsos fatos para atingir objetivos subalternos".

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"E vocês sabem que quem deixa a procuradoria tem que fazer uma quarentena. Se não me engano, de dois ou três meses"

FALSO A Lei Complementar nº 75 de 1993, que regulamenta a carreira de procurador, não faz nenhuma menção à quarentena, ou seja, à necessidade de quem deixa o cargo passar um determinado tempo para retomar funções fora da Procuradoria. O decreto 4.187 de 2002 fala sobre o "impedimento de autoridades exercerem atividades após a exoneração do cargo que ocupavam", mas exclui os membros do MPF. São os juízes que precisam se submeter à quarentena. Isso está previsto no artigo 95 da Constituição. A informação foi referendada pela Procuradoria da República no Distrito Federal.

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"Esse senhor [ex-procurador Marcelo Miller] (...) abandona o MP para trabalhar em empresa que faz delação premiada ao procurador-geral da República"

VERDADEIRO, MAS Em seu discurso, Temer disse que o ex-procurador da República Marcelo Miller é "homem da mais estrita confiança" do procurador-geral, Rodrigo Janot. Miller realmente integrou a força-tarefa da Operação Lava Jato e participou de um grupo de trabalho sobre leniência e colaboração premiada dentro do Ministério Público Federal. Além disso, também é fato que Miller pediu exoneração do cargo de procurador em março de 2017 e que foi afastado de forma definitiva um mês depois, em 5 de abril. Neste ano, ele se tornou sócio do escritório Trench, Rossi e Watanabe, que atua no combate à corrupção corporativa. Segundo a Procuradoria da República no Distrito Federal, esse escritório representou a holding J&F nas negociações do acordo de leniência da controladora da JBS com o Ministério Público Federal -mas não participou do processo de delação que Joesley fez à PGR. Hoje a Procuradoria investiga a atuação de Miller no caso.

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"Interessante que eu descobri o verdadeiro Joesley [Batista], o bandido confesso, junto com todos os brasileiros, quando ele revelou os crimes que cometeu ao MP"

CONTRADITÓRIO Três dias depois da divulgação do conteúdo da delação da JBS, o presidente Michel Temer fez um pronunciamento oficial e minimizou o conteúdo da gravação feita por Joesley no Palácio do Jaburu. Apesar de ter ouvido do empresário que ele ªteria segurado juízesº, Temer afirmou que não havia acreditado na "narrativa" de Joesley. Na época, não classificou o dono da JBS como um criminoso. Disse que ele era "um conhecido falastrão, exagerado". Depois, em entrevista à Folha, o presidente retomou o discurso. Disse que Joesley era uma "uma pessoa que se jacta de eventuais influências". A primeira vez em que Temer se referiu ao empresário como bandido ocorreu no dia 19 de junho, um mês depois da revelação da delação da JBS.

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"Agora mesmo, na pesquisa feita seriamente pela Polícia Federal, está dito que existem 120 interrupções [no áudio gravado por Joesley Batista], o que torna a prova inteiramente ilícita"

FALSO A Polícia Federal fez uma perícia nas gravações entregues por Joesley Batista à Procuradoria Geral da República e identificou "294 descontinuidades". A PF explica, no entanto, que elas são compatíveis com as interrupções "no registro das amostras de áudio" e que isso teria ocorrido por pressão ou atrito no gravador que estava oculto nas roupas de Joesley. A polícia concluiu também que "não foram observados elementos que indiquem a existência de adulterações" no áudio. O laudo aponta que a gravação é "consistente com a maneira em que se alega ter sido produzida a gravação". Ainda vale ressaltar que não há nenhuma decisão judicial relativa a este caso que classifique o áudio de Joesley como "ilegal". Na abertura do inquérito contra o presidente Michel Temer, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin classificou as provas como legais. O posicionamento, no entanto, foi monocrático, decidido somente por ele.

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OUTRO LADO

Procurado, o presidente Michel Temer não se manifestou até a publicação desta reportagem. O ex-procurador Marcelo Miller disse que "não cometeu nenhuma irregularidade". O procurador-geral, Rodrigo Janot, afirma que a denúncia contra Temer "é pública e baseada em fatos".


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