Folha de S. Paulo


Análise

Tom de ataques é estratégia para conquistar deputados

Walterson Rosa/FramePhoto/Folhapress
Michel Temer em pronunciamento após a denúncia da Procuradoria-Geral da República, nesta terça (27)
Michel Temer em pronunciamento após a denúncia da Procuradoria-Geral da República, nesta terça (27)

Michel Temer mirou apenas o Congresso quando decidiu que faria o mais violento ataque já desferido por um presidente a um procurador-geral da República.

Emparedado por acusações que o ligam diretamente ao recebimento de uma mala com R$ 500 mil em propina, Temer decidiu ignorar a opinião pública e apostar no espírito de corpo dos parlamentares para conquistar os votos que poderão salvar seu mandato no plenário da Câmara.

O discurso feito no Palácio do Planalto nesta terça (27) foi direcionado a esses deputados. Para sobreviver no cargo, Temer só depende que 172 deles não apareçam ou votem contra a aceitação da denúncia por corrupção passiva apresentada por Rodrigo Janot.

Ao afirmar que o procurador faz acusações sem provas em busca de "destruição e vingança", o presidente atendeu a cobranças por um enfrentamento direto com Janot feito por ministros e aliados que se sentem ameaçados.

Temer encampou esse discurso por entender que sua única saída está no apoio de sua base no Congresso –mesmo acreditando que essa estratégia levará a própria PGR (Procuradoria-Geral da República) a contra-atacar.

Nesse sentido, auxiliares presidenciais acreditam que novas denúncias esperadas contra Temer para os próximos dias, por obstrução de justiça e formação de organização criminosa, devem ser ainda mais duras.

Adotando tom agressivo e insinuando que Janot recebeu dinheiro nas negociações da delação da JBS, o presidente pretende acirrar o embate entre a classe política e o procurador. Segundo a lógica, os deputados se lançariam em um movimento de autopreservação e blindariam Temer.

O presidente deu um recado aos parlamentares ao dizer que a PGR abriu um "precedente perigosíssimo" ao fazer acusações baseadas em "ilações". Assim, tenta apontar desvios de Janot que, em tese, poderiam atingir políticos investigados por corrupção, incitando-os a reagir em conjunto ao procurador.

Outro ponto central da defesa de Temer na Câmara será convencer os deputados de que Janot cometeu abusos ao abrir uma investigação a partir de uma prova que considera ilegal –a gravação da conversa entre o presidente e o empresário Joesley Batista, que diz ter mandado pagar propina a Temer.

Para tentar derrubar essa peça, a equipe do peemedebista quer resgatar a decisão do ministro Teori Zavascki que anulou a validade da escuta telefônica que captou a célebre ligação da então presidente Dilma Rousseff para o ex-presidente Lula, no auge da crise de 2016.

Na ocasião, Teori determinou que a gravação não poderia ser usada como prova em processos porque havia sido feita depois do encerramento do prazo estabelecido em autorização judicial.

Temer quer argumentar aos deputados que a gravação feita por Joesley padece de vício semelhante, uma vez que o empresário não tinha aval prévio da Justiça para registrar a conversa.

A decisão de partir para a guerra e atacar os métodos de Janot é estratégica porque tem prazo de validade. O mandato do procurador termina em setembro e é Temer quem escolherá seu sucessor.


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