O ministro Alexandre de Moraes pediu vista (mais tempo para estudar o caso) e o STF (Supremo Tribunal Federal) interrompeu, nesta quinta (1°), a análise de uma questão de ordem que visa restringir o foro privilegiado garantido aos políticos. Quatro dos 11 ministros já votaram a favor da restrição.
Na quarta (31), quando a análise do assunto começou, o relator, Luís Roberto Barroso, votou pela restrição do foro privilegiado somente para políticos acusados de crimes cometidos no exercício do mandato em vigor e relacionados a ele.
Hoje, se um cidadão sem mandato comete um crime e depois é eleito deputado federal ou senador, por exemplo, o processo que tramitava em primeira instância sobe para o STF. Quando esse mesmo cidadão deixa o mandato, se o processo não tiver sido concluído ainda, ele volta à primeira instância.
Essas idas e vindas entre diferentes instâncias da Justiça, que os ministros Barroso e Marco Aurélio chamaram de "elevador processual", sobrecarregariam os tribunais superiores e atrasariam o desfecho dos processos, aumentando a chance de os crimes prescreverem (ficarem sem punição).
VISTA
A previsão era retomar a discussão nesta quinta com o voto de Edson Fachin, mas houve uma inversão e o primeiro a falar foi Moraes. "Não há dúvida que há disfuncionalidade no sistema de foros", iniciou.
Mas prosseguiu comparando o Supremo, ao qual se atribui morosidade no combate à corrupção, com a primeira instância do Judiciário.
"Me pergunto se há um histórico de primeira instância de combate efetivo às elites políticas e à corrupção. Não. Uma das chagas brasileiras é exatamente o não combate à corrupção", disse. "Não é possível estabelecer conexão entre impunidade no Brasil e ampliação do foro privilegiado."
Diante da complexidade do tema, segundo Moraes, ele pediu mais tempo para analisá-lo.
Em seguida, Marco Aurélio, Rosa Weber e a presidente da corte, Cármen Lúcia, pediram para adiantar seus votos e acompanharam o relator, pela restrição do foro.
Marco Aurélio criticou o vaivém dos processos nas diferentes instâncias da Justiça quando políticos assumem ou deixam o mandato. "A Constituição enseja isso? Para mim, não. A fixação de competência, para mim, está atrelada à data do cometimento [do crime]", disse, acrescentando que a prerrogativa de foro visa proteger o mandato.
"Já manifestei em mais de uma oportunidade, em sessão da Primeira Turma, que o instituto do foro especial, pelo qual não tenho a menor simpatia, mas que se encontra albergado na nossa Constituição, só encontra razão de ser para a dignidade do cargo, e não para a pessoa que o titulariza, o que evidencia, a meu juízo, a absoluta pertinência de uma interpretação no mínimo restritiva que vincule o instituto aos crimes cometidos no exercício do cargo e em razão do cargo", afirmou Rosa.
Cármen Lúcia disse que, como é hoje, está "caracterizada situação de mutação constitucional, uma vez que foro não é escolha. Prerrogativa não é privilegio".
Para reforçar sua tese como relator, Barroso afirmou que, se não fizesse diferença para o político ser processado no Supremo ou em outra instância, "não haveria empenho em manter" o foro –o que, para ele, mostrou-se uma característica comum a pessoas de todos os partidos.
"Se [o foro] não assegurasse impunidade, não haveria disputa por cargos que garantissem foro no Supremo. Manter a jurisdição no Supremo é bênção, a meu ver com acerto, porque supõe-se que vai haver mais celeridade na primeira instância", disse Barroso.
"Não há argumento capaz de desfazer realidade óbvia que, por lei, por medida provisória, se quer assegurar foro no Supremo e há de haver alguma razão para isso", completou o relator.
Não há prazo para Moraes devolver os autos e o julgamento ser concluído.
NO CONGRESSO
Nesta quarta, enquanto o STF iniciava as discussões sobre o assunto, o Senado aprovou em segundo turno uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que põe fim ao foro privilegiado para parlamentares e outras autoridades.
Os ministros afirmam que as decisões do Supremo sobre extensão do foro e a PEC que acaba com foro para a maioria dos cargos não são contraditórios.
Caso STF e parlamentares decidam de modo diferente sobre o foro privilegiado, vale a mudança determinada pelo Congresso. Mas a interpretação do Supremo sobre o alcance do foro valerá então para os cargos que mantiverem prerrogativa de foro na corte –os presidentes da Câmara, do Senado e da República– por crimes cometidos durante o cargo e em razão dele.
Os magistrados evitam falar sobre o entendimento do STF antes de o julgamento terminar. No entanto, nos bastidores afirmam que cada ministro terá que analisar o inquérito pelo qual for responsável e verificar se é o caso de remetê-lo a outra instância.