Folha de S. Paulo


Ex-ministro de FHC diz que gravação é 'tentativa de golpe contra reformas'

Cecília Acioli - 12.dez.2012/Folhapress
RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL, 12-12-2012, 16h30: O cientista político e ex-ministro da Cultura, Francisco Weffort, durante entrevista em sua casa no Rio de Janeiro (RJ). Ele lança o livro
O cientista político e ex-ministro da Cultura Francisco Weffort, em sua casa no Rio de Janeiro

O cientista político Francisco Weffort, 80, diz diz acreditar que houve uma "tentativa de golpe contra as reformas" do governo Temer com a gravação dos áudios da conversa entre o presidente e o empresário Joesley Batista, dono da JBS.

Fundador do PT e secretário-geral do partido entre 1984 e 1988, Weffort deixou a sigla e foi ministro da Cultura do tucano Fernando Henrique Cardoso de 1995 a 2002.

Para ele, os diálogos não comprometem Temer e a paralisação das reformas são o maior risco do país no momento. Ele atribui o "golpe" a "segmentos políticos que se veem desfavorecidos por essas reformas".

Weffort argumenta que o fim do imposto sindical, debatido na reforma trabalhista, "acabaria com os 'sindicatos de carimbo' e com a 'pelegada'".

Ele também define a Operação Lava Jato como "o maior e o mais benéfico acontecimento político da história da democracia brasileira".

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Folha - Com a divulgação dos áudios da conversa entre Temer e o empresário Joesley Batista, o sr. acredita que o presidente tem condições de se manter no cargo?
Francisco Weffort - Eu acredito que sim. Nada das informações apresentadas, até o momento, envolve o presidente. Ele simplesmente participou de uma conversa, mas não se comprometeu com nada.

O conteúdo dos áudios não implica o presidente?
O cenário criado por esta operação de escuta, que afetou o presidente, deu origem também a uma investigação. Então, que se faça a investigação.

O sr. é favorável à renúncia?
Não sou favorável. Renúncia é ato de livre vontade de quem renuncia. Você não pode ter votação para renúncia. Só espero que isso não afete a votação das reformas.

O maior risco para o país seria a paralisação das reformas?
Sem dúvida. O maior risco seria não realizar reforma nenhuma. Na minha opinião, o que houve foi uma tentativa de golpe contra as reformas. Uma tentativa que frustrou-se, mas que era dirigida contra as reformas, [com o objetivo de] paralisar o Congresso e o país.

Quem seriam os autores desse golpe?
Isso depende de investigação. Não tenho a menor ideia de quem seriam os responsáveis.

Um golpe levado a cabo por grupos contrários às reformas?
Por segmentos políticos que se veem desfavorecidos por essas reformas.

Em 2016, o sr. defendeu o impeachment da presidente Dilma. Com um ano de governo Temer, o sr. acredita que o país esteja melhor do que antes? Por quê?
Sem dúvida, está melhor que antes. Pelo menos, o governo Temer tem um projeto de reformas em andamento e vamos, lentamente, saindo da recessão econômica.

Temer manteve na cúpula do Planalto nomes investigados na Operação Lava Jato. Isso não depõe contra o discurso de combate à corrupção?
A pergunta hoje é a de saber se a corrupção governamental continua. Parece que não. Quanto aos investigados -os que ainda se acham no atual governo e os que estão fora-, temos que esperar o fim das investigações.

A reforma política em tramitação no Congresso prevê o voto em lista fechada e o financiamento público de campanha. Como o sr. avalia essa proposta?
Sou contra o financiamento público de campanha. Sou a favor do voto distrital misto, no qual o eleitor tem direito a dois votos, um o de eleger seu candidato no distrito e outro o de escolher uma legenda partidária na sua região. Trata-se do atual sistema alemão.

Sabe-se que o voto distrital favorece a criação de grandes partidos, permitindo a formação de maiorias sólidas. E o segundo voto, de legenda, que não se limita ao distrito mas diz respeito a toda a região em que este se inscreve, permite a formação de minorias significativas. É claro que este sistema funciona com cláusula de barreira.

O voto em lista é uma bandeira antiga do PT, agora levantada também por outros partidos. O sr. acha que essa é uma tentativa de preservar os caciques no poder, já que a ordem na lista de eleitos cabe aos próprios partidos?
O voto em lista considerado isoladamente só serve às oligarquias partidárias.

Partidos atingidos na Lava Jato, como PT e PSDB, já criticaram a operação por supostamente ter motivações políticas ou atuar com vazamentos seletivos. O sr. concorda com as críticas?
Não concordo. Corrupção no Estado é algo mais grave do que o roubo comum, praticado entre particulares. É uma traição direta à democracia. Os procedimentos da Lava Jato são corretos.

A Lava Jato "passa o Brasil a limpo", como seus defensores afirmam, ou "criminaliza a política", como seus críticos sustentam?
A Lava Jato não criminaliza a política. Criminaliza os criminosos que operam na política e acaba com a impunidade da corrupção no Estado. É o maior e o mais benéfico acontecimento político da história da democracia brasileira.


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