Folha de S. Paulo


ANÁLISE

Entre mesuras, duelo põe até as mulheres e os filhos no meio

Reprodução
Depoimento Lula
O ex-presidente Lula em depoimento a Sergio Moro

O embate começou com o juiz Sergio Moro falando ao ex-presidente Lula -e também aos espectadores do vídeo- não existir desavença pessoal entre eles. Foi expressamente para negar a cena de duelo antecipada em capas de revista e, na realidade, pelo país inteiro.

"Quem faz acusação é o Ministério Público e não o juiz, certo? Por conta dessa acusação, podem ser feitas perguntas difíceis ao senhor. É normal, não significa que essas perguntas contenham afirmações de fato."

E Lula, se apresentando tão sincero quanto o antagonista: "Não tem pergunta difícil, doutor. Quando alguém quer falar a verdade, não tem pergunta difícil".
No longo conflito passivo-agressivo que se seguiu, o juiz usou muito a expressão "certo", para levar Lula a concordar ou não com as afirmações que fazia.

E o ex-presidente usou muito a expressão "doutor", para caracterizar ou, mais provavelmente, para enquadrar e isolar Moro.

Em representações muito díspares, o juiz se repetia e estendia nas perguntas, tomando a maior parte do tempo só com a voz.

E o ex-presidente era monossilábico e vago nas respostas, dialogando mais através das mudanças de semblante, ele que ocupava a tela o tempo todo.

As mesuras iniciais de parte a parte, de suposto respeito mútuo e pela Justiça, foram se desfazendo aos poucos, com as menções cada vez mais recorrente às respectivas famílias.

O juiz perguntava sem trégua sobre a mulher do ex-presidente, morta em fevereiro, e este recorria sem parada à mulher para dizer que pouco ou nada sabia. Algumas farpas, aqui e ali, começaram a vazar o rancor.

Lula afirmou que Moro falava de sua mulher "toda hora, sem ela poder estar aqui para se defender". E Moro afirmou não estar "acusando ela de nada".

ACUSAÇÃO X DEFESA - Os argumentos do Ministério Público Federal e do ex-presidente Lula

Noutro momento, Lula apelou para uma metáfora com filhos que escondem nota baixa, ao argumentar por que não teria sido informado sobre malfeitos. O juiz comentou que ele, Moro, sabia a nota de seus filhos.

Noutro, o ex-presidente afirmou que a mulher não comentou com ele uma visita ao apartamento, porque, "não sei se o senhor tem mulher", mas elas nem sempre contam o que vão fazer.

Depois de mais de quatro horas de vídeo, no que seria o diálogo derradeiro, ambos tiraram as luvas. O ex-presidente questionou o vazamento para a imprensa de conversas suas com a mulher e dela com os filhos.

Moro reagiu, dizendo não ter relação nenhuma com o que a imprensa publica ou não publica. Lula afirmou de bate-pronto que "o vazamento foi o senhor que autorizou" e que a mesma imprensa que o ataca agora poderá vir a atacar Moro, "se tiver sinais de que serei absolvido".

O juiz atravessou dizendo já ser hoje, na verdade, "atacado por blogs que supostamente patrocinam o senhor". E encerrou a partida.

No embate que prosseguiu por televisão e mídia social, os enunciados atiraram para todo lado, indicando que o confronto resultou mesmo mais de forma -e pessoal- que de conteúdo.

Os próximos passos da ação penal


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