Folha de S. Paulo


Odebrecht diz ter pago R$ 5,2 mi por propina em obra de Aécio

A Odebrecht diz ter pago R$ 5,2 milhões a um homem de confiança de Aécio Neves (PSDB-MG) entre 2007 e 2009, como pagamento pela sua participação na construção da nova sede do governo mineiro. A empreiteira disse entender que a propina iria para campanhas futuras do então governador tucano.

A informação está na delação de Benedicto Júnior, o BJ, ex-presidente de Infraestrutura da Odebrecht. Conforme a Folha revelou no começo do ano, BJ depôs e disse que recebeu pessoalmente de Aécio a instrução de procurar Oswaldo Borges da Costa Filho, então presidente da Codemig (Companhia de Desenvolvimento Econômico de MG), para discutir a divisão de trabalho da obra.

O senador nega o relato do ex-executivo, e afirma nunca ter pedido propina para empreiteiras. Ele é alvo de cinco pedidos de inquéritos por parte do ministro Edson Fachin, do Supremo; o caso da Cidade Administrativa é um deles.

Benedicto Junior, da Odebrecht, diz ter pago R$ 5,2 mi por propina em obra de Aécio

Segundo depoimento de BJ, quando Aécio assumiu o governo de Minas pela segunda vez, em 2007, ele o chamou para uma reunião e indicou Oswaldinho, como Costa Filho é conhecido. O ex-executivo então enviou um subordinado, o chefe da empreiteira em Minas, Sérgio Neves, para a missão.

Neves também é delator e corroborou a versão. Oswaldinho dividiu o projeto em três partes. O segundo lote caberia à Odebrecht, com participação da Queiroz Galvão e OAS. As outras líderes de lotes eram a Camargo Correa e a Andrade Gutierrez.

Neves relatou a BJ que teria de ser pago 3% de propina que, segundo Oswaldinho teria lhe dito, se direcionaria a campanhas futuras de Aécio. BJ autorizou o pagamento, por "confiar" no interlocutor, que é contraparente de Aécio (casado com a filha do padrasto do político).

A Odebrecht disse ter lucrado R$ 90 milhões no negócio, estimado em R$ 360 milhões. A Cidade Administrativa é um dos símbolos da gestão Aécio. Custou R$ 2,1 bilhões e foi inaugurada em 2010.

SETOR ELÉTRICO

Em outro pedido de inquérito, Fachin pede para apurar se Aécio recebeu R$ 50 milhões da Odebrecht e da Andrade Gutierrez para defender seus interesses na tramitação da obra das usinas hidrelétricas do rio Madeira (Santo Antônio e Jirau).

Segundo os delatores Marcelo Odebrecht (presidente do grupo) e Henrique Valladares (da área de energia), em uma reunião em fevereiro de 2008 ambos discutiram com Aécio o setor elétrico, e o então governador mineiro disse que eles seriam procurador por Dimas Toledo (que havia sido diretor da estatal energética mineira Furnas).

Na reunião não foi discutida propina, disse Valladares, mas quando ambos saíram Odebrecht disse que estava acertado que a empresa daria R$ 30 milhões e a Andrade, R$ 20 milhões. Aécio já negou em outras oportunidades tal acerto. Afirma que não tinha ingerência alguma sobre obras do governo federal. Os delatores não indicam qual vantagem teria sido auferida pelo acordo que relatam.

Segundo eles, os pagamentos parcelados em R$ 1,5 milhão e R$ 2 milhões foram feitos em contas no exterior, mas Valladares só se recorda de uma em Cingapura de nome "Accioly" —os investigadores querem saber se há alguma relação com um amigo de Aécio, o empresário Alexandre Accioly.

No mesmo despacho, Fachin lembra que outra delação, do diretor Alexandrino de Alencar, descreve valores idênticos a serem pagos com o mesmo fim para o então deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que por sua vez os teria distribuído entre si, o senador Romero Jucá (PMDB-RR), o deputado Sandro Mabel (PMDB-GO) e o deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP). Todos negam.

OUTRO LADO

O senador já negou várias vezes ter havido irregularidades na obra. Em nota recente, disse que "o edital de construção da Cidade Administrativa foi previamente apresentado ao Ministério Público e ao Tribunal de Contas do Estado e as obras auditadas durante sua execução por empresa independente contratada via licitação pública, não tendo sido apontada qualquer irregularidade durante todo o processo".

Em nota, o empresário Alexandre Accioly afirmou que não possui nem nunca possuiu qualquer conta ou estrutura financeira em Cingapura.

"Nunca recebi depósito em favor de terceiros em conta alguma no Brasil ou no exterior. Minhas declarações de bens comprovam a licitude dos recursos que ingressaram em minhas contas e que são resultado unicamente de minhas atividades empresariais", disse.

Accioly também afirmou que sempre agiu com ética e respeito a valores e princípios republicanos, e que vai ingressar com uma interpelação judicial e um processo criminal contra o ex-executivo da Odebrecht pelas afirmações.

A Folha não conseguiu contato por telefone com Oswaldinho.

INVESTIGAÇÃO

O ministro Edson Fachin determinou a abertura de inquérito contra oito ministros do governo Michel Temer (PMDB), 24 senadores e 39 deputados federais. Serão abertas 76 investigações pedidas pela Procuradoria-Geral da República após as delações da Odebrecht.

Entre os citados estão os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), e do Senado, Eunício Oliveira (PMDB). Dois dos principais aliados de Temer, Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secreraria-Geral), também estão na lista, que abrange ainda os senadores Romero Jucá e Renan Calheiros, do PMDB, e Aécio Neves (PSDB).

No total a relação tem 98 nomes e inclui três governadores e um ministro do Tribunal de Contas da União. Algumas suspeitas da Procuradoria são corrupção, falsidade ideológica, lavagem de dinheiro, fraude e cartel. Fachin remeteu 201 outros casos a tribunais de instâncias inferiores envolvendo citados sem foro no Supremo –entre os mencionados estão os ex-presidentes Lula, Dilma Rousseff e Fernando Henrique Cardoso.

Os inquéritos iniciam longo trâmite. Investigarão o teor das delações, que precisarão de provas adicionais para tornar-se efetivas. Ainda há as fases de denúncia e do processo, com ampla defesa, antes do julgamento.

Chamada - A lista de Fachin

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