Folha de S. Paulo


Operação da Polícia Federal mira PT na Bahia e OAS

Jorge Araújo/Folhapress
SAO PAULO SP Brasil 12 04 2016 Os policiais federais cumprem mandados de busca e apreensão â€
Pela Lava Jato, policiais federais cumprem mandados de busca e apreensão em escritórios da OAS

A Polícia Federal deflagrou nesta terça (4) a Operação Hidra de Lerna, que investiga um suposto grupo criminoso responsável tanto pela possível prática de financiamento ilegal de campanhas políticas na Bahia quanto por esquemas de fraudes em licitações e contratos no Ministério das Cidades.

Entre os alvos estão a construtora OAS, também investigada na Lava Jato, o diretório do PT na Bahia e a empresa de comunicação Propeg.

Governador da Bahia, Rui Costa (PT) é um dos investigados na operação, que apura se o esquema de financiamento foi usado na campanha eleitoral dele ao governo do Estado em 2014. O ex-ministro Márcio Fortes (Cidades) também é investigado.

Segundo as investigações da superintendência da PF no Distrito Federal, a dona da agência Pepper, a publicitária Danielle Fonteles afirmou, em acordo de delação premiada, que manteve em 2014 uma conversa pessoal com Rui Costa, então candidato ao governo baiano. Segundo a empresária, Costa lhe propôs pagar um total de R$ 1,9 milhão para que ela atuasse em sua campanha eleitoral. Parte do pagamento, contudo, seria feito mediante "contrato fictício" com a empreiteira OAS.

Carlos Martins atua nas campanhas do PT na Bahia desde 2002. Atualmente, é secretário estadual de Desenvolvimento Urbano, responsável por gerir os principais contratos da OAS com o governo baiano, como a construção da avenida 29 de março – orçada em R$ 580 milhões. Na gestão Jaques Wagner, foi secretário da Fazenda entre 2007 e 2012.

Os detalhes dos pagamentos, segundo Danielle, foram acertados entre ela e o "tesoureiro/coordenador" da campanha de Costa, Carlos Martins. Do valor total, R$ 633 mil seriam custeados oficialmente pela campanha do petista (dessa parcial, apenas R$ 125 mil foram efetivamente desembolsados) e outros R$ 725 mil seriam bancados pela OAS. Os R$ 502 mil seriam pagos, segundo Danielle, por uma outra fonte ainda a ser definida, também "por fora" da contabilidade oficial, mas o débito nunca foi quitado.

Na investigação, a PF confirmou que a OAS assinou, por meio do executivo Charles Maia Galvão, um contrato de R$ 725 mil com a Pepper. Porém, Danielle disse que o valor era superfaturado e os serviços realizados pela agência corresponderam a cerca de 30% do valor do contrato. A análise bancária demonstrou que o valor foi depositado em parcelas na conta bancária da Pepper.

Uma segunda linha de investigação na Hidra de Lerna, que corresponde a outro inquérito no STJ, teve como princípio outa delação premiada, esta feita pelo empresário de publicidade Benedito Rodrigues, conhecido como Bené. Ele contou ter recebido R$ 1 milhão da agência de publicidade Propeg para que auxiliasse a empresa a obter um contrato de valor inicial de R$ 45 milhões (que pode ter atingido R$ 100 milhões com aditivos, segundo a PF) no Ministério das Cidades, à época ocupado por Mario Negromonte (PP-BA).

O depoimento de Bené, nesse ponto, foi contraditado em parte por outra delação premiada, fechada com a PF por uma funcionária do empresário, Vanessa Daniella Pimenta Ribeiro. Ela afirmou que a Propeg teria pago R$ 2 milhões, e não a metade declarada por Bené. A PF rastreou a movimentação bancária e localizou dois pagamentos, de R$ 1 milhão cada um, para duas empresas ligadas ao grupo de Bené. Essa contradição será avaliada ao final da investigação.

Sobre Márcio Fortes, a PF investiga outro ponto da delação de Bené. Segundo ele, 3% de contratos fechados no Ministério das Cidades eram pagos em propina para o então ministro. Sobre esse trecho da delação, a PF ainda busca comprovação.

A sede do PT na Bahia foi isolada para evitar que o local fosse foco de manifestações.

A ação cumpriu 16 mandados de busca e apreensão. Em razão do foro por prerrogativa de função de alguns investigados, foram todos deferidos pela Ministra Maria Thereza Rocha de Assis Moura, do STJ (Superior Tribunal de Justiça).

A casa de Negromonte (PP), em Salvador, foi alvo de buscas. A Polícia Federal também fez busca e apreensão em um apartamento no bairro da Vitória e em uma casa no bairro de Stela Maris.

Na Vitória, os policiais foram ao prédio onde morava o publicitário Fernando Barros, dono da Propeg, endereço onde ainda mora a sua ex-mulher.

Além de ter sido a principal agência de publicidade a atuar nas campanhas carlistas, a Propeg ganhou contratos no governo federal durante os governos Lula e Dilma. Atualmente, possui um contrato de publicidade com a Secretaria de Comunicação do Governo Federal.

A Hidra de Lerna deriva de três colaborações premiadas feitas no âmbito da Operação Acrônimo, já homologadas pela Justiça e em contínuo processo de validação pela Polícia Federal. Tem como origem dois novos inquéritos em tramitação no STJ e cuja distribuição entre os ministros da corte ocorreu de forma automática.

O nome Hidra Lerna remete à figura da mitologia helênica, que ao ter a cabeça cortada ressurge com duas cabeças. Para os investigadores, a Operação Acrônimo, ao chegar a um dos líderes de uma organização criminosa, se deparou com uma investigação que se desdobra e exige a abertura de dois novos inquéritos.

OUTRO LADO

Em nota, o Ministério das Cidades disse que não recebeu nenhuma notificação sobre a operação da Polícia Federal. "Em poder das informações, a pasta terá condições de avaliar do que se trata e capacidade de instaurar, imediatamente, processos administrativos disciplinares para investigar a denúncia."

A nota afirma que o ministério vai colaborar "com todas as informações necessárias para garantir eficiência e transparência na aplicação dos recursos citados".

Presidente do PT na Bahia, Everaldo Anunciação afirma que o partido vê a ação da PF com surpresa: "Nunca tivemos nenhuma ligação com a Propeg".

O petista ainda acusou a Polícia Federal de agir com sensacionalismo: "Eles interditaram a rua inteira, arrombaram a sede e depredaram nosso patrimônio, numa ação desnecessária".

Procurado, o ex-ministro das Cidades e hoje conselheiro do Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia, Mário Negromonte, afirmou à Folha que não conhece o teor do inquérito, mas negou ter cometido qualquer tipo de irregularidade: "Não tenho nenhum envolvimento neste negócio".

Segundo ele, a Polícia Federal levou apenas dois telefones celulares antigos seus: "Não encontraram nada, nenhum documento", disse.

A Propeg, agência de publicidade comandada por Fernando Barros, é conhecida na Bahia pelas relações estreitas com o grupo do senador Antônio Carlos Magalhães (1927-2007), de quem fazia as campanhas políticas e tinha contas do governo estadual.

Em nota, a agência confirmou que a PF fez buscas nos seus escritórios em Salvador Brasília e em casas de executivos da empresa. A empresa afirma que "tem auxiliado, por iniciativa própria, desde junho deste ano, as autoridades judiciais para esclarecer e apurar os fatos investigados". Diz ainda que "age com correção, respeito às leis e seguindo as normas do mercado publicitário".

A Propeg diz que a apuração não possui "qualquer conexão com o Partido dos Trabalhadores, o Governador do Estado da Bahia e com a empresa OAS".

LEI ELEITORAL

A operação ocorre no dia em que termina a restrição a prisões durante o período eleitoral. Por lei, até as 17h desta terça, nenhum eleitor pode ser preso ou detido, salvo em flagrante delito ou em virtude de sentença criminal condenatória por crime inafiançável ou por desrespeito a salvo-conduto.

GOVERNADOR
O governador da Bahia Rui Costa (PT) afirmou ter recebido com "estranheza e indignação" a notícia de que ele estaria sendo investigado pela Polícia Federal e disse que "está à disposição da sociedade e das autoridades competentes para prestar os devidos esclarecimentos".

Ele ainda afirmou que suas contas da sua campanha de 2014 foram aprovadas pelo TRE (Tribunal Regional Eleitoral) por unanimidade e negou ter qualquer relação pessoal ou profissional com a Propeg.


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