Folha de S. Paulo


Em grampo, prefeita de Ribeirão fala de suposta compra de votos na Câmara

Edson Silva - 3.out.2014/Folhapress
RIBEIRAO PRETO, SP, BRASIL, 03-10-2014: Prefeita Dárcy Vera assina contrato de obras do PAC em Ribeirão Preto no palacio Rio Branco.( Foto: Edson Silva/Folhapress) ***REGIONAIS***EXCLUSIVO***
A prefeita de Ribeirão Preto, Dárcy Vera (PSD), investigada em operação contra corrupção

Grampos que constam de uma investigação do Ministério Público paulista e da Polícia Federal em Ribeirão Preto (SP) indicam que a prefeita Dárcy Vera (PSD) tem usado a distribuição de cargos, numa triangulação feita com uma empresa suspeita, para comprar apoio político dos vereadores na Câmara.

Nos grampos, autorizados pela Justiça e obtidos pela Folha, Dárcy diz a Marco Antônio dos Santos, seu braço direito na prefeitura, que vai demitir funcionários terceirizados indicados por vereadores que não votarem conforme seus interesses.

Santos era secretário municipal da Administração e acumulava a superintendência do Daerp (Departamento de Água e Esgotos de Ribeirão Preto), além de ser presidente do diretório local do PSD.

Ele é um dos 11 presos temporariamente nesta quinta (1º) pela operação Sevandija, do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) e da PF.

"Chega. Vota contra, pode votar contra. Fica à vontade. Mas tira todos os seus cargos do governo hoje [...] O cara tá cheio de gente no governo. Manda embora", diz Dárcy, sobre o vereador Giló (PTB), que é genro dela. A conversa com Santos é de 15 de junho.

áudio 1

De acordo com a apuração, Giló e outro vereador da base do governo, Maurílio Romano (PP), não votaram a favor de um projeto que autorizava a transferência de recursos de um fundo municipal, o Funinst, para o Tesouro –o que amenizaria as dificuldades financeiras do município.

"Peita os caras", ordena a prefeita ao secretário. "Manda os quase 60 embora do Maurílio pra ver se ele aguenta essa campanha [...] Ele não consegue segurar 60 pessoas desempregadas, na rua."

"Não brinca comigo, não", diz Dárcy, referindo-se a Maurílio. "Se eu abrir a boca só elege dois na Câmara da nossa base. Só elege dois. E eu não tô brincando. Acaba com a minha carreira eu vou acabar com a carreira de todo mundo", completa a prefeita.

Santos tenta dissuadi-la de cortar os cargos, mas diz que "se é para bater, de uma vez só, eu bato". Ainda em junho, o projeto de lei acabou sendo aprovado na Câmara.

Em outro áudio, de 30 de junho, Santos diz a Dárcy que Maurílio não quer votar as contas dela de 2012 e 2013, que haviam sido rejeitadas pelo Tribunal de Contas. Ela se queixa de que o vereador descumpre o combinado.

Santos afirma que, se a prefeita quiser, ele pode demitir todos os funcionários indicados pelo vereador, "inclusive da terceirizada, e [aí] ele não vota mais nada". "Quer dizer que a gente vai ter que ficar amarrado nesse filho da p...?", responde Dárcy.

áudio 2

Segundo a investigação, a "terceirizada" a que o diálogo se refere é a empresa Atmosphera, que teria contratos irregulares com a prefeitura, conforme já apontado pelo Tribunal de Contas.

Os contratos com a empresa saltaram de R$ 4 milhões, em 2009 –primeiro ano da gestão Dárcy–, para mais de R$ 10 milhões em 2016.

A suspeita é que o Executivo use a Coderp, empresa mista de tecnologia controlada pela prefeitura, para contratar a Atmosphera, por meio de licitações fraudulentas, para abrigar funcionários terceirizados que deveriam ser contratados em concurso público. Esses funcionários –cerca de 700 hoje– são indicados por aliados de Dárcy, sobretudo vereadores.

OUTRO LADO

A advogada Maria Cláudia Seixas, que representa a prefeita Dárcy Vera (PSD), afirmou que ela é a maior interessada no esclarecimento do caso. Questionada sobre os áudios, disse desconhecê-los.

"Ainda não tive acesso a esse material, nem tenho como comentar. Posso dizer que a Dárcy está colaborando."

Nesta quinta (1º), quando a operação foi deflagrada, a advogada disse que a busca e apreensão de documentos na casa da prefeita "transcorreu dentro da normalidade".

A prefeitura informou nesta sexta (2) que houve uma reforma administrativa para substituir secretários presos ou destituídos da função por determinação da Justiça.

A Folha não localizou a defesa do ex-secretário Santos. Os vereadores Giló e Maurílio também não foram localizados. À imprensa local Giló disse que está "tranquilo".


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