Folha de S. Paulo


Para senador do PT, ajuste fiscal deu base para farsa do impeachment

Evaristo Sa/AFP
Senator Lindbergh Farias, from Workers Party (PT), speaks during the Senate impeachment trial of Brazilian suspended President Dilma Rousseff at the National Congress in Brasilia on August 25, 2016. The impeachment trial of Brazil's first woman president, Dilma Rousseff, got underway Thursday with high expectations that the suspended leader of Latin America's biggest economy will be sacked within days. / AFP PHOTO / EVARISTO SA ORG XMIT: ESA384
O senador Lindbergh Farias (PT-RJ) durante discurso no Senado Federal no impeachment de Dilma

Às vésperas da votação do processo de impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff, o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) afirma que a política de ajuste fiscal do ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy, que ocupou o cargo em 2015, contribuiu para o enfraquecimento do governo dela.

O petista, um dos principais membros da tropa de choque anti-impeachment, diz que o resultado do julgamento no Senado não está definido.

Lindbergh é o líder da oposição ao presidente interino, Michel Temer (PMDB), no Senado. Para ele, a população vai perceber que a elite brasileira quer tirar Dilma de olho numa "pausa democrática" para aplicar medidas voltadas ao mercado.

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Folha - Por que a presidente Dilma Rousseff não conseguiu barrar o processo?
Lindbergh Farias - Estou convencido de que o que unificou uma parcela grande do Parlamento e do setor empresarial contra Dilma foi o medo da Lava Jato. A segunda coisa é que tem também, por trás desse processo, um projeto, a nosso ver, que vai atacar profundamente os direitos dos trabalhadores.

O governo Dilma não conseguiu dar uma resposta à altura nas ruas. Ela falhou?
O que atrapalhou foi o ajuste do Levy. Ele fez logo um choque de tarifas de energia elétrica e de gasolina no início do ano [2015]. Essa política de ajuste colocou a economia em baixa e as pessoas que tinham votado em Lula e Dilma quatro vezes se distanciaram. Acho que aquele erro é que deu base para pegarem um pretexto qualquer e passarem por cima. O impeachment é uma farsa. Mas sem isso aí [ajustes de Levy], não teriam acumulado forças para fazer essa farsa prosperar.

Qual sua estimativa de placar de votos no julgamento do Senado?
É muito difícil avaliar porque há senadores que conversam com Temer e Dilma. Eles dizem: "se tiver os seis votos a mais [o mínimo necessário para cassar é 54], eu vou". Fica esse jogo. É errado quando acham que o jogo já está ganho. Existe chance sim. Aqui, a gente terá 28 votos ou 21. Estamos trabalhando, mas tem gente que diz que, se for para perder, prefere ficar com Temer porque ele usou muito a máquina [pública] nesse período.

Como será o discurso da presidente Dilma no Senado?
Ela quer fazer um discurso para o país, para a História. A presença é um fato muito forte. O Brasil vai parar para escutar. Tem muita gente que estava insatisfeito com Dilma mas também não quer o Temer. Ela vai mostrar que não cometeu crime de responsabilidade e aparecer como vítima de um Parlamento muito desgastado.

Como vai convencer os senadores disso?
Tem muito senador que está votando pelo impeachment, mas sabe que não tem crime de responsabilidade. Eu acho que, para virar voto, é preciso uma fala de grande impacto na opinião pública.

Diante da hipótese de o impeachment se concretizar, qual será o papel do PT no governo Temer?
Em um cenário de derrota, a gente tem que fazer uma oposição muito firme. Nenhuma negociação com esse governo golpista. Vamos tentar renovar nossa aliança com os movimentos sociais, sindicais. Temos que voltar a fazer uma oposição aguerrida. Retomar as ruas com força pelo país.

O PT é capaz de retomar as ruas?
Não tenho dúvida de dizer que, se esse golpe passar, vamos levantar as ruas. Voltar a ter greve geral, porque é muita retirada de direitos o que querem fazer. Vai ter resistência e povo organizado. Vamos nos preparar para esse ciclo, voltar a ser uma esquerda mais esquerda.

Acha que Temer terá condições de encaminhar, até o fim do ano, as propostas que tem prometido?
Ele é muito fraco, não aguenta pressão. Veja esses vários projetos de reajuste [salarial]. Como ele está citado em muitas delações, não tem coragem de barrar.

E o PSDB começa a se diferenciar dele, porque estão muito preocupados com eleições. Começam a perceber que fizeram um mau negócio ao se juntar ao PMDB. O PSDB foi o partido mais prejudicado pelo impeachment. Eles achavam que a eleição de 2018 seria deles. Mas acabaram sócios minoritários de um governo de crise.

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RAIO-X

Idade
46 anos

Cargo
Senador pelo PT do Rio de Janeiro

Trajetória
Foi presidente da UNE, deputado federal por dois mandatos e prefeito de Nova Iguaçu (RJ)


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