Folha de S. Paulo


Lava Jato atinge obras em São Paulo, diz procurador-geral

Luiz Carlos Murauskas/Folhapress
O novo procurador-geral de Justiça do Ministério Público de SP, Gianpaolo Smanio
O novo procurador-geral de Justiça do Ministério Público de SP, Gianpaolo Smanio

O novo procurador-geral de Justiça do Ministério Público de São Paulo, Gianpaolo Poggio Smanio, 51, afirmou que o órgão está recebendo do Ministério Público Federal (MPF) informações da Operação Lava Jato que atingem obras do governo paulista.

Nomeado chefe do Ministério Público pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) em abril, Smanio disse que sua prioridade será combater a criminalidade e a corrupção.

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Folha - O sr. já escolheu sua bandeira prioritária?

Gianpaolo Smanio - O combate à criminalidade e à corrupção. Já fazemos parte do Núcleo Nacional de Combate à Criminalidade do Ministério da Justiça. Definimos como prioridade o tráfico de armas e de drogas. Definimos a participação do Gaeco [grupo de combate ao crime organizado] de São Paulo, porque há notícia de envolvimento do PCC [nesses crimes]. Portanto, em São Paulo, a gente tem uma experiência enorme de combate a crime organizado.

O sr. vem da área criminal. Em sua posse, o sr. falou do foco no combate ao crime. Que medidas já está implementando?

Temos feito a integração das estruturas de investigação. Temos hoje núcleos de integração para combate a sonegação fiscal, crime organizado, corrupção. Já estamos trabalhando de forma integrada, com promotores do interior e da capital, com os grupos como o Gaeco, o Gedec –que é o grupo de combate a crime econômico–, e também integrando a área cível, de improbidade.

Essa integração não ocorria?

Sempre aconteceu. O que é preciso é aperfeiçoar. Antes, ela se dava pela atuação dos promotores. Quero criar núcleos e estruturas institucionais de integração. Isso já começa a aparecer. Hoje temos expectativa de recuperar R$ 380 milhões de sonegação e de R$ 3 bilhões a R$ 4 bilhões na área de improbidade.

O sr. vai estimular o compartilhamento de informações com o MPF na Operação Lava Jato?

Já estamos fazendo isso. Tanto na merenda como na Lava Jato nós já atuamos com o MPF, já temos recebido e fornecido informações. E fizemos também convênios com a Receita Federal e o TCE.

Quando o sr. fala da Lava Jato, quais os principais pontos de diálogo com o MPF?

As questões que envolvem o Estado de São Paulo. Várias delações se referem a algumas questões do Estado que já estão chegando para nós.

Seriam grandes obras viárias?

As informações estão vindo, estão na fase de investigação, mas envolvem as obras, envolvem várias coisas.

Como está a apuração da merenda? Por que o presidente da Assembleia, Fernando Capez [PSDB], e seus assessores suspeitos não foram ouvidos?

Esse procedimento corre perante o Tribunal de Justiça. São as medidas determinadas pelo desembargador que comanda o processo que estão sendo feitas. Estamos na fase investigativa. Vamos ouvi-los ao final dessa etapa.

Há um sentimento em alguns setores da sociedade de que o Ministério Público de São Paulo é mais condescendente com o governo estadual do que o MPF com o governo federal.

Posso garantir que essa é uma percepção que não corresponde à realidade. Temos uma atuação, ao longo do tempo, muito eficiente e voltada à proteção do patrimônio. Temos ações propostas contra todas as questões trazidas: o cartel de trens, o Metrô, a merenda. Posso afirmar que não há nenhuma condescendência. O que pode ocorrer é que o tamanho dos escândalos que hoje ocorrem na área federal é muito maior do que os que se encontram aqui.

O sr. é próximo do ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, já escreveu livros com ele. O ministro defende um endurecimento de penas para adolescentes que cometerem infrações. O sr. é a favor? Qual modelo o sr. defende?

Sou contra a diminuição da idade penal, mas entendo que o ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente] deveria se preocupar com esse envolvimento dos menores [com o crime] e com sanções mais eficientes. Acho que o menor que se envolve num crime hediondo poderia ficar mais tempo submetido às medidas do ECA [como a internação], e os maiores que atraem os menores para a criminalidade devem ter sanções mais graves. Concretamente, eu faço a defesa do aumento do tempo de internação dos jovens que praticam crimes hediondos.

Como devem ser tratados pequenos traficantes, na sua opinião?

Nós entendemos que tráfico de drogas é crime hediondo. Essa divisão de pequeno, grande traficante e traficante primário é uma divisão que pode servir na hora de aplicar a pena. Mas o tráfico em si é um crime hediondo. Nosso posicionamento no Ministério Público é pela repressão ao tráfico.

E no caso de usuários?

Nossa legislação atual sobre usuários tem, a meu ver, a melhor das soluções, porque o uso continua sendo crime, mas as sanções não são de prisão. A descriminalização de drogas não pode ser pautada como uma política pública. A política pública para que os jovens não usem drogas é uma política separada da área criminal, não pode misturar ou tratar a área criminal como se ela fosse uma política pública, porque ela não é. A área criminal serve para que a gente trate as questões que a sociedade considera graves com uma resposta que a legislação considera adequada. Tem penas alternativas, tem tratamento médico. Me parece que a solução é separar a questão penal da política pública.

Recentemente, houve mortes de crianças e jovens por forças policiais. O Ministério Público tem sido eficiente no controle externo das polícias?

Sim. Temos promotores designados para todos esses casos acompanhando a investigação. Além disso, temos trabalho constante de fiscalização do trabalho das polícias. Evidentemente que o controle nunca vai conseguir impedir eventual erro, porque não é função do Ministério Público.

Como o sr. vê a participação de integrantes ou ex-integrantes do Ministério Público no Executivo? Em São Paulo, por exemplo, há muitos casos.

O Supremo já definiu que só aqueles que entraram [no Ministério Público] antes de 1988 podem participar do Executivo. Essa participação ocorre a nível pessoal. O governador convida pessoalmente pessoas das mais variadas atribuições para formar o governo. Isso não afeta o Ministério Público, que continua tendo atuação independente, autônoma. Os promotores e procuradores têm garantias legais de atuação.

Como o sr. avalia o auxílio-moradia a membros do Ministério Público e como se justifica esse auxílio para quem tem casa própria?

O pleito que o Ministério Público faz é de valorização profissional. Entendemos que a valorização dos representantes do Ministério Público é uma valorização da sociedade. Tudo aquilo que a sociedade investe, o Ministério Público traz de volta. Temos recuperação de bens, então, o orçamento do Ministério Público retorna em número muito superior àquilo que nós recebemos. Agora, a forma de vir o subsídio é definida por lei e por decisão judicial. Pleiteamos um aumento de subsídio. Se a forma desse aumento vem por uma decisão do Supremo ou por decisão legislativa, são questões que têm seus próprios meios de solução. O auxílio-moradia vem por decisão do Supremo. Então, nos cabe cumprir.

Neste mês, chegou à Comissão de Constituição e Justiça da Câmara a PEC 251/2016, que propõe eleições diretas para procuradores-gerais. Qual sua posição? O sr. entende que o atual sistema, com nomeação pelos governadores, compromete a independência do órgão?

A escolha pelo governador não compromete a autonomia do Ministério Público, porque existem instrumentos de autonomia e independência. Mas eu sou favorável à eleição direta do procurador-geral, porque a instituição já amadureceu para que ela mesma possa fazer valer a sua vontade. Os controles do Ministério Público são externos, então, não há mais necessidade dessa nomeação por parte do governador.

Como o sr. vê o cenário político nacional, marcado pelo impeachment e pela polarização?

Institucionalmente é importante marcar que a democracia brasileira está seguindo seu caminho de amadurecimento, as instituições estão cada vez mais atuantes. Esses embates políticos são naturais dentro de uma democracia e têm soluções que devem ser pela via democrática. Não tenho dúvida de que o impeachment segue as regras constitucionais de solução.


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