Folha de S. Paulo


Investigadores dizem que dono de avião repassava propina a Campos

Danilo Verpa -10.mar.2014/Folhapress
SAO PAULO - SP- 10.03.2014 - O governador de Pernambudo e candidado a presidencia da republica Eduardo Campos e Marina Silva durante encontro com ambientalistas em SP. (Foto: Danilo Verpa/Folhapress, PODER)
O então candidato à Presidência Eduardo Campos, que morreu em 2014 em uma queda de avião

Preso pela Polícia Federal por envolvimento num esquema de lavagem de dinheiro, João Carlos Lyra Pessoa de Melo Filho, um dos donos do avião usado pelo ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, intermediou o pagamento de propina para campanhas de Campos e do senador Fernando Bezerra Coelho, ambos do PSB.

A informação consta no despacho da juíza Amanda Araújo, da Justiça Federal em Pernambuco, ao qual a Folha teve acesso. O documento autorizou a Operação Turbulência, deflagrada pela PF nesta terça (21), e que levou para a cadeia quatro pessoas, entre elas João Carlos Lyra.

De acordo com a investigação, funcionários da construtora Camargo Corrêa apontaram Lyra como o interposto do pagamento de suborno pela empresa a Eduardo Campos e Fernando Bezerra.

"Ele foi reconhecido pelos ex-empregados da Camargo Corrêa[...] como sendo a pessoa encarregada de entregar a propina devida por aquela empreiteira ao ex-governador Eduardo Campos e ao senador Fernando Bezerra Coelho em virtude das obras da Refinaria Abreu e Lima[...], e ainda se enfatiza que ele se apresentou formalmente como o único adquirente do avião", sustentam os investigadores.

O trecho em questão não especifica em qual período os dois políticos pernambucanos teriam sido beneficiados pelos repasses. De acordo com a PF, porém, o esquema em que Lyra estava envolvido vigorou entre 2010 e 2014, período em que movimentou aproximadamente R$ 600 milhões.

Batizada de Turbulência, a operação identificou um esquema de lavagem de dinheiro com a utilização de mais de uma dezena de empresas, parte delas fantasma, que teriam abastecido os caixas das campanhas dos dois então candidatos do PSB.

De acordo com a investigação, além de Lyra, outros dois cabeças da quadrilha eram os verdadeiros donos do avião Cessna Citation, que caiu em Santos (SP) em 13 de agosto de 2014, quando transportava Campos e assessores, no meio da corrida eleitoral daquele ano.

Dois delatores da Operação Lava Jato, Roberto Trombeta e Rodrigo Morales, ambos ligados à empreiteira OAS, afirmaram em seus depoimentos que Lyra era o ponto de contato da empresa com diversos beneficiários de propina do esquema de corrupção na Petrobras.

"Aponta-se que foi reconhecido pelos operadores financeiros Roberto Trombeta e Rodrigo Morales, antes referidos, como sendo uma pessoa que viabilizaria o dinheiro em espécie para pagamento de vantagem indevida, efetuado pela construtora OAS, cobrando taxa de 2% sobre o montante total, indicando, em contrapartida, as contas de diversas pessoas físicas e jurídicas investigadas nesses autos para recebimento de recursos", diz o despacho.

Segundo Trombeta e Morales, o operador de Campos atuava com uma espécie de venda de dinheiro vivo e, conforme atesta a investigação, acumulou vultuosas quantias com a atividade ilegal.

"Há provas cabais (documentos de transferência ou depósitos bancários) de que, somente com esse esquema criminoso, João Carlos Lyra teria sido beneficiado em sua conta pessoal com R$ 2.850.000,00 (dois milhões, oitocentos e cinquenta mil reais), além do que ele seria detentor de um expressivo patrimônio de veículos, lanchas e jet skis, aparentemente não compatível com seus rendimentos declarados", afirmam os investigadores.

OUTRO LADO

Procurado pela Folha, o presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira, afirmou que "todos os recursos que entraram na campanha de Eduardo Campos em 2014 foram registrados na Justiça Eleitoral". O TSE (Tribunal Superior Eleitoral), porém, ainda analisa a prestação de contas da campanha de Campos e Marina Silva, sua vice e que, após o acidente, assumiu a cabeça de chapa.

"Não há nada que tenha sido feito de outra maneira. Se há problema, precisa ser apurado", disse Siqueira, que coordenou a campanha até a morte do ex-governador. Ele acrescentou ainda que confia na conduta de Campos e que é preciso "provar essas acusações".

O senador Fernando Bezerra Coelho, por sua vez, classificou como ilações os elementos da investigação e disse que jamais foi citado por qualquer pessoa da Camargo Corrêa.

"Passado mais de um ano, o inquérito segue sem prova alguma sobre a suposta participação do senador em qualquer atividade ilícita, estando tal investigação calcada em informações conflitantes fornecidas por delatores e sem qualquer documento comprobatório", argumentou.

A respeito de Operação Turbulência, Bezerra também negou relação com os fatos.

"[O senador] reafirma que não foi coordenador das campanhas de Eduardo Campos nem em 2014, à Presidência da República, nem em 2010; não tendo, portanto, exercido qualquer função financeira nas campanhas de Campos", justificou em nota.

A Camargo Corrêa disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que "reitera que firmou acordo de leniência homologado pela justiça para prestar esclarecimentos e corrigir irregularidades".

Confira a íntegra da nota do senador Fernando Bezerra:

"A defesa do senador Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE) afirma que são totalmente imprecisas as ilações feitas pela Procuradoria da República em Pernambuco, nos autos da medida cautelar relacionada ao Inquérito 163/2016 ("Operação Turbulência"), que contrariam frontalmente os depoimentos anexados ao Inquérito 4005 ("Operação Lava Jato").

Diferentemente do que foi divulgado pelo Ministério Público Federal (MPF) naquele estado, Fernando Bezerra não foi citado por qualquer pessoa ligada à Construtora Camargo Correia - muito menos, como sendo receptor de recursos da empresa - conforme atestam testemunhas cujos depoimentos constam das páginas 859 e 890 a 891 do Inquérito 4005/STF.

Sobre esta investigação (4005), passado mais de um ano do referido inquérito, ele segue sem prova alguma sobre a suposta participação do senador em qualquer atividade ilícita, estando tal investigação calcada em informações conflitantes fornecidas por delatores e sem qualquer documento comprobatório.

Em relação à "Operação Turbulência" - deflagrada nesta terça-feira (21) - Fernando Bezerra Coelho volta a repudiar a vinculação do nome dele a esta investigação e reafirma que não foi coordenador das campanhas de Eduardo Campos nem em 2014, à Presidência da República, nem em 2010; não tendo, portanto, exercido qualquer função financeira nas campanhas de Campos."


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