Folha de S. Paulo


José Dirceu é condenado a 23 anos de prisão na Lava Jato

O juiz Sergio Moro, que conduz os processos da Lava Jato em Curitiba, condenou nesta quarta-feira (18) o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu a 23 anos e três meses de prisão pelos crimes de lavagem de dinheiro, corrupção ativa e organização criminosa pela participação no esquema de contratos superfaturados da construtora Engevix com a Petrobras.

Essa é a maior pena da Lava Jato dada por Moro em uma única condenação. Até então, o ex-diretor da Petrobras Renato Duque era quem tinha recebido a condenação mais alta em uma única ação penal, de 20 anos e oito meses em regime fechado.

Dirceu está preso desde agosto de 2015, quando ocorreu a 17a fase da Lava Jato, denominada Pixuleco. Neste mês, o ex-ministro teve negado pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) pedido que pleiteava sua saída da prisão –ele está detido no Complexo Médico Penal, em Pinhais, na região metropolitana de Curitiba.

Na sentença, Moro aponta que Dirceu é responsável por ter recebido R$ 15 milhões –a acusação do Ministério Público é que a alegada consultoria que Dirceu teria prestado para receber esse montante nunca foi efetivada, na prática.

Esse recurso de R$ 15 milhões, segundo a sentença, seria fruto de propina, com prejuízos para a estatal. "O custo da propina foi repassado à Petrobras, através da cobrança de preço superior à estimativa, aliás propiciado pela corrupção, com o que a estatal ainda arcou com o prejuízo no valor equivalente".

Pela denúncia do Ministério Público, que serviu de base para a condenação, a JD consultoria, da qual eram sócios Dirceu e seu irmão Luiz Eduardo, recebia propina de empreiteiras com contratos com a Petrobras a título de consultorias, mas sem efetivamente ter prestado o serviço.

Um dos delatores da Lava Jato, o lobista Milton Pascowitch afirmou ter atuado na intermediação de pagamentos da Engevix para Dirceu e para o PT. A empreiteira repassou R$ 53, 8 milhões à Jamp Engenharia, empresa de Pascowitch, como pagamento pelos contratos para refinarias da Petrobras.

Pascowitch pagou para o ex-ministro reformas e aquisição de imóveis, além de ter bancado a compra de uma parcela de uma aeronave.

"O mais perturbador, porém, em relação a José Dirceu", escreve Moro na decisão, "consiste no fato de que recebeu propina inclusive enquanto estava sendo julgado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal a Ação Penal 470, havendo registro de recebimentos pelo menos até 13/11/2013. Nem o julgamento condenatório pela mais Alta Corte do País representou fator inibidor da reiteração criminosa, embora em outro esquema ilícito".

Para o magistrado, Dirceu "agiu, portanto, com culpabilidade extremada". Moro também nega a possibilidade do ex-ministro recorrer em liberdade devido ao seu "histórico criminal" argumentando que ainda é desconhecida "a extensão de todas as suas atividades criminais" praticadas por ele e que o produto do crime não foi recuperado.

No processo do mensalão, Dirceu foi condenado a sete anos e onze meses de prisão. Na época, porém, ele era réu primário. Agora, o juiz Moro considerou a condenação anterior para elevar a pena do petista afirmando que ele "tem antecedentes criminais, já tendo sido condenado por corrupção passiva pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal na Ação Penal 470 [processo do mensalão]".

O advogado do petista, Roberto Podval, criticou a decisão do juiz e classificou a pena como "desproporcional". "Uma pena de 23 anos para um homem de 70 tem caráter de prisão perpétua. Infelizmente a defesa não conseguiu despolitizar o processo", disse o criminalista.

A decisão foi proferida em primeira instância e ainda cabe recurso.

O ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto também foi condenado. A pena proferida foi de nove anos de prisão.

GERSON ALMADA

Condenado a 15 anos em regime fechado, o sócio e ex-vice-presidente da Engevix Gerson Almada foi apontado como um dos articuladores da quadrilha que realizou desvios da Petrobras.

Os sócios do empreiteiro José Antunes Sobrinho e Cristiano Kok foram absolvidos dos crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro e corrupção porque, segundo o juiz Sérgio Moro, não tiveram participação na articulação do esquema já que os negócios da Petrobras eram conduzidos por Almada.

Dos três sócios da Engevix, dois deles, Almada e Antunes Sobrinho, chegaram a ficar presos em Curitiba (PR), mas hoje se encontram em prisão domiciliar. Os três executivos tentam negociar um acordo de delação premiada e de leniência com o Ministério Público Federal com o objetivo de salvar a empresa.

Mesmo com a absolvição, envolvidos na defesa dos empreiteiros afirmam que as negociações com os procuradores devem continuar porque há interesse em prosseguir com a leniência.

Carlos Kauffmann, defensor de Antunes Sobrinho, disse que "a decisão do juiz reflete uma criteriosa análise da prova do processo e traz a todos os sentimento de justiça".

Essa é a segunda condenação de Almada. No ano passado ele foi condenado a 19 anos de prisão em outra ação penal.

O assessor de José Dirceu Roberto Marques, o Bob, também foi absolvido do crimes de lavagem. Condenado a três anos e meio por formação de quadrilha, ele ficará em regime aberto e terá que pagar uma multa de cinco salários mínimos. Concursado da Assembleia Legislativa de São Paulo, ele teve o direito de manter seu cargo.

O advogado de Bob, Maurício Vasques afirmou que irá recorrer à imputação de organização criminosa: "A sentença não indica para a prática de qual crime Roberto Marques teria se associado. Além disso, o juiz argumenta que ele esteve na sede da Hope, o que é absurdo e já foi devidamente afastado no processo".

Leia aqui a íntegra da decisão do juiz Sergio Moro

OUTRO LADO
A Engevix afirmou, por meio de nota, que Antonio Ruiz Filho, defensor de Kok, disse em momentos anteriores que "esperava pela absolvição [do cliente], já que a prova do processo não permitiria outra solução".

A defesa de Gerson Almada informou que vai se manifestar "apenas por ocasião de recurso a ser apresentado a tribunal competente."

O advogado de Milton Pascowitch, Theo Dias, afirmou que "a condenação já era esperada nos termos do acordo" e que eventuais aspectos da decisão ainda poderão ser analisados.

A defesa de Pedro Barusco disse que não comentaria a decisão.

O advogado Flávio D'Urso, que defende Vaccari Neto, disse que o ex-tesoureiro foi absolvido do crime de lavagem de dinheiro e condenado pelo crime de corrupção "exclusivamente com base em delação premiada sem que houvesse qualquer prova no processo a confirmar tal delação".

O criminalista deve recorrer da decisão, por entender que a sentença "é injusta" e que o ex-tesoureiro "é inocente".

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Veja as condenações e absolvições proferidas por Moro:

  • José Dirceu - condenado a 23 anos e três meses por formação de quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro
  • Fernando Hourneaux - condenado a 16 anos e dois meses por formação de quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro
  • Gerson Almada - condenado a 15 anos por corrupção ativa e lavagem de dinheiro
  • Renato Duque - condenado a dez anos por corrupção passiva
  • João Vaccari Neto - condenado a nove anos por corrupção passiva
  • Luiz Eduardo de Oliveira e Silva - condenado a oito anos e nove meses por formação de quadrilha e lavagem de dinheiro
  • Júlio César dos Santos - condenado a oito anos por formação de quadrilha e lavagem de dinheiro
  • Roberto Marques - condenado a três anos por formação de quadrilha
  • Milton Pascowitch - condenado a regime semi-aberto diferenciado por formação de quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro
  • José Adolfo Pascowitch - condenado a regime aberto diferenciado por formação de quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro
  • Pedro Barusco - condenado por corrupção passiva, mas com pena suspensa por causa de colaboração em delação premiada
  • Cristiano Kok - absolvido.
  • José Antunes Sobrinho - absolvido
  • Júlio Gerin de Almeida Camargo - absolvido
  • Olavo Horneaux de Moura Filho - absolvido

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