O presidente interino Michel Temer já dera demonstração, ainda vice-presidente, da escassa prioridade atribuída à ciência e à tecnologia. Ao nomear Gilberto Kassab (PSD) para a pasta, agora hibridizada com o setor de comunicações, confirma as piores expectativas da comunidade científica.
Temer cometeu a barbeiragem de convidar um bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus, Marcos Pereira, para ocupar o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). Seu PRB tem 22 deputados federais, vários ligados à igreja.
O vice nada inovou, em sua imperícia. Repetiu Dilma, que chegou a entregar o ministério responsável por pesquisas sobre mudanças climáticas a um cético do aquecimento global, Aldo Rebelo (PC do B).
Pereira é criacionista, professa a convicção religiosa de que tudo no mundo é obra divina. Mas diz respeitar sua antítese científica, o darwinismo, "uma posição pessoal". Não, bispo, evolução não é crença, é fato.
Um ministro capaz de tamanha confusão conceitual careceria das credenciais mínimas para a pasta. A derrapada de Temer levou alguns a concluir, com excesso de criatividade, que o vice teria apenas posto um bode na sala.
Bode mesmo surgiu em seguida. Temer não só pôs no cargo um estranho à comunidade científica e recém-ministro de Dilma, Kassab, como ainda o presenteou com uma fusão com a pasta das Comunicações.
A Academia Brasileira de Ciências e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, apoiadas por outras 13 associações, alertaram Temer para o óbvio: a pesquisa científica será eclipsada pelo emaranhado de interesses pesados em torno de concessões de rádio e TV, internet, correios etc.
Um ministério específico para ciência talvez nem seja imprescindível para adotar as políticas corretas de incentivo a esse insumo crucial do desenvolvimento. As opções de Temer, porém, indicam mais descaso com ele do que visão estratégica.