Folha de S. Paulo


Cidade natal de Temer não segue ação de impeachment e tem dia normal

Marcus Leoni/Folhapress
Cleusa Maria Tamer, 65, sobrinha do vice-presidente Michel Temer, em Tietê (SP)
Cleusa Maria Tamer, 65, sobrinha do vice-presidente Michel Temer, em Tietê (SP)

A memória de Michel Temer parece esmaecer na cidade onde ele nasceu. As ruas de Tietê, a 150 km de São Paulo, seguiram num ritmo pacato no dia em que o Senado começou a discutir a abertura do processo de impeachment, o que deve suspender Dilma Rousseff da Presidência por até seis meses e fazer de Temer o presidente interino.

Não houve grande evento para o dia da votação. O Tietê Esportiva Clube, associação que exibe jogos esportivos e outros eventos televisivos, não teve programação alguma. No Bar do Massa, um dos mais populares da cidade, a TV passou a tarde sintonizada no SBT –exibiu, entre outros, o folhetim infanto-juvenil "Cúmplices de Um Resgate".

"Michel quem?", perguntou o frentista de um posto Shell a 500 metros da chácara da família de Temer, que estava trancada e vazia. Outras seis pessoas, das dezenas abordadas pela reportagem, desconheciam o tieteense que deve chegar à Presidência da República.

Locais afirmam que ele visita a cidade esporadicamente, e não costuma pernoitar ali. A última vez foi em fevereiro deste ano. "A cidade não vibra por ele", diz Cleusa Maria Tamer, 65, sobrinha do vice. "Talvez seja porque ele foi para São Paulo cedo, com 16 anos, ou pelo fato de ele ser muito tímido. Mas não há um orgulho por ele ser filho desta terra."

Enquanto Cleusa conversava com a reportagem, seu neto assistia na TV da sala a um desenho animado. Quando seu marido chegou, mudou para um canal de notícias que exibia ao vivo a votação do Senado. "Assisti à votação da Câmara, mas hoje preferi acompanhar mais a distância. É muita repetição", diz Tamer, que define o tio como "muito carinhoso com crianças, ainda que tente fazer brincadeiras e acabe sendo bem sem graça".

"O Doutor Michel", disse o aposentado Mario Sá, 77, "vai mostrar o caráter de Tietê para o Brasil". Os conterrâneos com idade suficiente para ter conhecido Temer na cidade empregam o vocativo "doutor" antes do seu nome, e muitos deles já despiram o "vice" do seu cargo. "O presidente doutor Michel vai ser bom para a economia. Bom para o rico e para o pobre também, não só para o pobre", diz a aposentada Maria Nunes, 73.

A praça central da cidade, que tem uma placa com poesias do político junto ao coreto, já estava vazia às 19h.

A reportagem procurou o diretório municipal do PMDB, que preferiu não se pronunciar sobre o futuro de Temer.

CORRIDA DA MÍDIA

O único movimento excepcional na cidade era de equipes de reportagem garimpando detalhes da vida do futuro presidente. Um deles é amigo desde criança: James Milanelo, 75, dono de uma revendedora de carros onde também é possível comprar vinhos e cachaças locais. Ele deu quatro entrevistas em um só dia. "Na semana passada a 'IstoÉ' esteve aqui. Antes disso, foi o [jornal] 'Zero Hora'. Hoje, além de vocês, veio 'O Globo', o SBT e um jornal de Santa Catarina."

Desde que o processo de impeachment começou a andar, ele brinca que, quando chega em casa, ouve da mulher: "E aí, em quantas TVs vou te ver hoje?". Segundo ele, Temer acompanha o noticiário que versa sobre ele. "Outro dia, disse que tinha umas bobagens numa entrevista minha que publicaram e ele falou 'Bobagem nenhuma, James'", conta o amigo.

O ramo materno da família de Temer se reuniu, mas manteve TV, rádio e internet desligados. A família Suaid havia combinado o encontro para gravar um vídeo para ser mandado pela internet para os parentes de Btaaboura, vilarejo no Líbano de onde vieram os ancestrais de Temer. "Disseram que vai passar na TV libanesa", disse Andrea Suaid.

"Um repórter do Egito veio nos entrevistar na semana passada", disse Maria Suaid, 80, cuja avó era irmã da avó de Temer. "Eu ia fazer quibe e tabule, comida árabe, mas acabei indo para o dentista e não deu tempo de ver a votação, nem de fazer a comida."


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