Folha de S. Paulo


Escritório panamenho no Brasil providenciava registros de offshores

Arnulfo Franco/Associated Press
A marquee of the Arango Orillac Building lists the Mossack Fonseca law firm in Panama City, Thursday, April 7, 2016. Earlier on Wednesday the Panamanian based law firm filed a complaint with Panamanian prosecutors, alleging that the 11.5 million documents revealed in the leak were stolen by a hacking attack from somewhere in Europe. (AP Photo/Arnulfo Franco) ORG XMIT: PAN107
Placa da Mossack Fonseca na Cidade do Panamá

Centro de um escândalo que atingiu líderes mundiais, o escritório panamenho Mossack Fonseca vendia no Brasil pacotes de serviços que incluíam a indicação de diretores laranjas de offshores e a abertura de escritórios físicos no exterior.

Milhares de documentos da filial brasileira foram apreendidos na fase Triplo X da Lava Jato, deflagrada em janeiro, que ainda não resultou em ações na Justiça.

O juiz Sergio Moro afirmou em despacho que a divisão brasileira do escritório panamenho montava offshores para envolvidos no escândalo da Petrobras.

No último domingo (4), um megavazamento de documentos da Mossack Fonseca, apelidado de "Panamá Papers", revelou dados de offshores que constrangeram figuras como o primeiro-ministro britânico David Cameron, o presidente argentino Mauricio Macri e o presidente russo Vladimir Putin. Também provocou a renúncia do primeiro-ministro da Islândia.

Dois meses antes do escândalo, quatro funcionários da empresa no Brasil foram alvos de mandado de prisão na Lava Jato.

Um deles, a gerente administrativa Renata Pereira Britto, disse em depoimento que a Mossack Fonseca no Brasil possuía "empresas de prateleira" em estoque, já constituídas pela matriz no Panamá, ofertadas aos clientes.

"Muitos deles, não querendo aparecer como sócios, preferem que seja registrada em nome de terceiros. Para isso, a Mossack Fonseca Brasil oferece um serviço de diretores já contratados", disse ela, na ocasião.

Os papéis da filial brasileira apreendidos na Lava Jato mostram que nomes de diretores se repetem em diversas empresas sem aparente ligação. Segundo a gerente administrativa, essas pessoas eram funcionários panamenhos do próprio escritório.

Os documentos apreendidos pela Lava Jato também mostram dezenas de fichas de clientes brasileiros do serviço, incluindo empresários, advogados e profissionais do mercado financeiro. Nas fichas, o padrão é anexar opções de requisitos de paraísos fiscais pelo mundo: além do Panamá, constam Ilhas Virgens Britânicas, Bahamas, Seychelles e Samoa.

Uma das fichas apreendidas pela Lava Jato é a do conselheiro do Tribunal de Contas paulista Robson Marinho, como revelou o jornal "O Estado de S. Paulo". Alvo de ação penal e suspeito de receber propina da Alstom, ele diz na inscrição, datada de 2012, que ficou sabendo dos serviços oferecidos pela Mossack no Uruguai.

Outro documento apreendido pela Lava Jato mostra uma tabela dos serviços oferecidos pelo escritório no Brasil. Os valores são modestos. A articulação de um "conselho fundacional" para uma empresa no exterior saía por até US$ 850. A assistência para abertura de uma conta bancária custava US$ 1.500. O serviço mais caro é o de instalação de um escritório físico: US$ 19,2 mil (mais US$ 1.000 se quiser uma 'placa de bronze' na sala). Em um dos papéis, há um termo de compromisso em que o escritório assume que indicará diretores a uma offshore, mas eles serão indenizados em caso de ação na Justiça.

ATIVIDADE ENCERRADA

As duas pessoas apontadas como administradores da Mossack Fonseca no Brasil são consideradas foragidas pela Justiça: a panamenha Maria Mercedes Riano Quijano e o venezuelano Luiz Fernando Hernandez Rivero, alvos na fase Triplo X.

Segundo a advogada deles no Brasil, Heloísa Herrera, os dois eram apenas subordinados da matriz panamenha e tiveram seus vínculos rompidos em razão da Lava Jato.

A advogada afirma que a representação no Brasil, que tinha sede na avenida Paulista, foi obrigada a encerrar as atividades depois da operação. Sergio Moro proibiu Renata Pereira Britto e Ricardo Honorio Neto, apontado como "sócio" do escritório, de voltar a atuar na empresa.

Sobre as suspeitas a respeito das atividades desenvolvidas pelos dois na empresa, a advogada afirmou que vai se manifestar apenas na Justiça.

A reportagem não conseguiu localizar representantes da Mossack Fonseca no país. Em comunicado divulgado nesta semana, a matriz no Panamá disse que frequentemente rejeita clientes que não provam a origem de seus recursos e que previne o "mau uso" dos serviços. "É comum para empresas estabelecer entidades comerciais em diferentes jurisdições por uma série de razões legítimas."

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OS SERVIÇOS DA MOSSACK NO BRASIL

US$ 19,2 mil
é o valor cobrado pela unidade brasileira Mossack Fonseca para a instalação de um escritório

US$ 1.000
é o custo para instalação de uma placa de bronze

US$ 1.500
é quanto vale assistência da empresa para abertura de uma conta bancária


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