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Não há base legal para impeachment de Dilma, diz Nelson Barbosa

Pedro Ladeira/Folhapress
BRASILIA, DF, BRASIL, 10-03-2016, 09h00: O ministro Nelson Barbosa (Fazenda) participa de evento comemorativo dos 30 anos do Tesouro Nacional, no auditório do STJ. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, PODER)
O ministro Nelson Barbosa (Fazenda)

Em audiência na comissão especial da Câmara que analisa o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, disse nesta quinta-feira (31) não haver "base legal" para o pedido e que não se pode falar em crime de responsabilidade fiscal quando o governo fez o "maior contingenciamento da história".

"Não há que se falar de flexibilidade fiscal, de irresponsabilidade fiscal, de irregularidade fiscal ou de crime de responsabilidade fiscal no momento em que o governo fez o maior contingenciamento [congelamento de recursos] da história. O governo cortou o máximo do que foi possível cortar de suas despesas discricionárias [não obrigatórias]", disse o ministro.

Segundo Barbosa -que foi ministro do Planejamento entre janeiro e dezembro de 2015-, o que os decretos de crédito suplementar fizeram foi "apenas ampliar o leque em que era possível usar um valor menor de despesas discricionárias".

O ministro afirmou que os decretos estavam de acordo com a lei orçamentária de 2015 e que a criação de um crédito suplementar "não implica necessariamente num aumento de despesa financeira".

"Esses créditos suplementares não alteraram o limite financeiro, não alteraram o decreto de contingenciamento de 2015. Muito pelo contrário. Eles foram adotados depois de o governo aumentar o corte de despesas", disse.

Sobre o questionamento do TCU (Tribunal de Contas da União) em relação às pedaladas fiscais, Barbosa afirmou que, "quando a determinação do TCU se tornou formal e final, imediatamente o governo mudou a metodologia de pagamento de equalização de taxa de juros, mudou a metodologia de reembolso do FGTS e pagou todos os valores de exercícios anteriores apontados pelo TCU".

Segundo ele, os "atos fiscais (...) estavam de acordo com o entendimento do TCU na época em que eles foram praticados. Uma vez mudado o entendimento, também mudaram os atos."

"Com base nesses fatos e não em opinião, eu considero não haver base legal para o pedido de impedimento da presidente", declarou.

DESACORDO

Assim como Barbosa, o professor da UERJ Ricardo Lodi Ribeiro destacou que o processo de impeachment deve se basear em fatos deste mandato da presidente, a partir de 2015.

"É preciso lembrar que a decisão do presidente da Câmara limitou a decisão da comissão ao atual mandato de 2015. (...) Se esta Casa tratar de fatos anteriores, estará julgando em desacordo com a Constituição, em desacordo com a lei do impeachment", disse Lodi Ribeiro.

Segundo o professor, o Congresso "não está autorizado" a aprovar o impeachment por não haver crime de responsabilidade.

"Nenhum dos atos constitui crime de responsabilidade. Por essa razão, não está autorizado o Parlamento a encerrar o mandato da presidente da República. Falta de apoio parlamentar, impopularidade e o conjunto geral da obra não alicerça pedido de impeachment."

CONFUSÃO

Depois da exposição dos dois, foi dada a palavra aos parlamentares, mas eles quase não abordaram as questões técnicas, se limitando a repetir os discursos inflamados contra e a favor da presidente. Como nas sessões anteriores, houve vários bate-bocas, com troca de acusações e insultos.

O deputado Fernando Francischini (SD-PR) questionou Barbosa sobre o grampo em que Lula solicitou a ele que atuasse na Receita Federal devido a supostos abusos que estariam sendo cometidos na investigação contra o ex-presidente. Não houve tempo, na sessão, para a resposta de Barbosa. Na saída da comissão, questionado por jornalistas o ministro se recusou a responder à questão.

Em determinados momentos, o clima tenso deu lugar a risos com gafes cometidas por deputados. Marco Feliciano (PSC-SP), por exemplo, trocou "má gestão" com "má gestação". Miguel Haddad (PSDB-SP) confundiu TCU (Tribunal de Contas da União) com "TSU", órgão inexistente.

Houve confusão também antes do início da fala do professor da UERJ Ricardo Lodi Ribeiro. O deputado Julio Lopes (PP-RJ) questionou o fato de Lodi Ribeiro ser apresentado como professor titular de direito financeiro da universidade, quando é adjunto, e de ser sócio do ministro do STF Luís Barroso num escritório de advocacia –na verdade, hoje ele é sócio de Rafael Barroso Fontelles, sobrinho do ministro.

Lodi Ribeiro disse estar na audiência "como professor". "Foi esse o convite que me foi formulado. (...) Não estou aqui enquanto advogado, não estou aqui para exercer a defesa da presidente Dilma, até porque esta defesa compete à Advocacia Geral da União", disse o advogado.

A declaração sobre a defesa de Dilma foi rebatida por parlamentares a favor do impeachment aos gritos de "AGU não é da Dilma".

A decisão da presidente de confiar à AGU, um órgão de governo, sua defesa, tem sofrido críticas. A defesa vinha antes sendo feita pelos advogados Flávio Caetano e Márcia Pelegrini.

A audiência da comissão do dia anterior, em que foram ouvidos os advogados Miguel Reale Jr. (ex-ministro do governo FHC) e Janaina Paschoal, autores da denúncia, também foi tumultuada e terminou em empurra-empurra entre deputados.

Os depoimentos de hoje foram os últimos da comissão especial. Dilma tem até segunda-feira (4) para apresentar sua defesa. A partir daí, a comissão votará o relatório do deputado Jovair Arantes (PTB-GO) em até cinco sessões.


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