Folha de S. Paulo


Ex-tucano substitui almirante investigado na Eletronuclear

Perto de completar 70 anos, em 28 de fevereiro do ano passado, o engenheiro Pedro José Diniz de Figueiredo, então diretor de Operações das usinas nucleares de Angra 1 e 2, no Rio, confidenciou a amigos que estava na hora de se aposentar.

Não faltavam desavenças com o presidente da Eletronuclear à época, almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva. Figueiredo vetava nomeações do superior em sua diretoria, motivo pelo qual quase foi afastado por duas vezes. Manteve-se no cargo graças às alianças criadas em 33 anos em cargos de chefia na estatal.

Cinco meses depois, Othon foi preso na 16ª fase da Lava Jato, sob suspeita de receber propina da empreiteira Andrade Gutierrez nas obras da usina de Angra 3. O engenheiro, principal desafeto do almirante nas reuniões de diretoria, o substituiu.

Nem a filiação por 20 anos ao PSDB impediu a escolha. Figueiredo deixou o ninho tucano em 16 de outubro de 2015, 19 dias após ser efetivado no cargo.

"Por volta de 2001/2002, solicitei ao representante a minha desfiliação. No ano passado, constatei que ainda estava filiado. Solicitei, então, que fosse providenciada a desfiliação, o que foi feito imediatamente. A minha filiação partidária não é motivo de vergonha", afirmou ele por e-mail -não quis conceder entrevista pessoalmente.

Visto na companhia como um profissional de perfil técnico, o engenheiro construiu uma boa relação com políticos e empresários nos 33 anos à frente das usinas.

'PREFEITINHO'

Pedrão, como é conhecido, assumiu a operação de Angra 1 em 1982, no governo do general João Figueiredo. Nas três décadas seguintes, o sergipano aumentou seu poder na companhia.

Decidia quem ia ou não morar nas casas dos empregados das usinas. Em 1997, assumiu a poderosa diretoria de Operações, responsável por 73% do orçamento da Eletronuclear. Funcionários da ocasião ouvidos pela Folha contam que nada escapava a Pedro Figueiredo.

Entre 2003 e 2013, 500 funcionários deixavam mensalmente a sede da Eletrobras e seguiam para Angra. Após cerca de duas horas de viagem, entravam na área da usina, passavam cinco minutos e obtinham um acréscimo de 10% nos vencimentos -adicional de periculosidade por exposição à radiação ionizante.

Uma sindicância interna resultou na demissão de um funcionário. Uma apuração interna apontou que 360 funcionários de 420 investigados não tinham direito ao benefício. A Controladoria Geral da União apura o caso.

"O diretor de Operação não é o responsável pelo acesso de empregados de outras diretorias. De qualquer maneira, em função da investigação da CGU, contratamos um novo perito para atestar a pertinência da necessidade do acesso à área controlada", disse o novo presidente da Eletronuclear, subsidiária da Eletrobras.

Ciente da entrada dos funcionários nas usinas, Figueiredo não é investigado no caso. A questão não foi vista como desabonadora na carreira do engenheiro.

O engenheiro fazia questão de morar próximo às usinas. Era bajulado por empresários e políticos locais que o viam como uma espécie de "prefeitinho" de Angra.

ESCOLHA

A prisão do almirante levou o Planalto a discutir cinco nomes para substituí-lo. Uma articulação entre o diretor administrativo da empresa, Edno Negrini, ligado ao PMDB, com o senador Delcídio do Amaral (PT-MS), levaram à escolha de Figueiredo.

Pesou na opção, segundo a Folha apurou, o fato do irmão, Duilio Figueiredo, presidir a Norte Energia, companhia mista formada por empresas públicas e privadas responsável pela gestão da usina de Belo Monte.
Foi quem contratou consórcio com dez empresas, entre elas, Andrade Gutierrez, Odebrecht e Camargo Correia, para a obra da hidrelétrica.

Em cinco meses na presidência da Eletronuclear, Figueiredo demitiu 32 funcionários com cargos comissionados. Três deles, com quem a Folha conversou, dizem que o engenheiro afirmou que a ordem partiu do ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga (PMDB). Ele nega.

"O ministro jamais pediu para contratar ou descontratar ninguém", disse. Apenas, oito comissionados foram mantidos na empresa. A Eletronuclear promete substituir todos por concursados.

OUTRO LADO

A assessoria da Norte Energia, responsável pela obra de Belo Monte, informou que o presidente Duilio de Figueiredo, irmão de Pedro, assumiu a presidência da empresa em julho de 2012. "Quando assumiu a presidência da Norte Energia, o contrato com as empreiteiras já estava em plena execução há mais de um ano."


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