Folha de S. Paulo


Em grampos, Lula reclama da imprensa a aliados

Os áudios de ligações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva interceptadas no âmbito da Operação Lava Jato ajudam a desvelar, entre outros elementos, alguns detalhes da relação do agora ministro-chefe da Casa Civil com parte da imprensa –e a visão que ele tem dela.

Na última segunda-feira (14), por exemplo, Lula contou a Jaques Wagner, hoje chefe do gabinete de Dilma Rousseff, que havia sugerido abordagens para um artigo de Mino Carta, diretor da "Carta Capital".

"Acabei de conversar com o Mino Carta aqui, pra ele escrever um artigo mostrando que teve duas coisas nesse movimento", afirmou Lula.

Na mesma data, o jornalista publicou texto no site da revista com críticas ao juiz Sergio Moro e à condução da Operação Lava Jato.

Dias antes, a comentar sua condução coercitiva para depor na Operação Aletheia, o ex-presidente diz a outro correligionário, Gilberto Carvalho: "Tiveram que me dar dez minutos no 'Jornal Nacional'".

Nas conversas com seus colegas de partido, Lula faz citações, sobretudo, a veículos do grupo Globo.

"Liga pro Nilo [Batista, advogado de Lula] e fala 'Nilo, ó, eu vi a matéria, manda esse Lauro Jardim tomar no c*, que você não pode fazer política citando Lauro Jardim'", pediu o ex-presidente ao deputado Wadih Damous (PT-RJ).

Em 28 de fevereiro, o colunista de "O Globo" havia publicado uma nota dando conta de uma suposta procura de Lula por mais um advogado.

Dois dias depois, em conversa com o ministro da Secretaria de Comunicação Social, Edinho Silva, o ex-presidente reclama de críticas à mudança do titular do Ministério da Justiça.

"O objetivo é encurralá-lo. Crítica da 'Veja', crítica do 'Globo', crítica da Globo... No fundo eles querem evitar que qualquer ministro acabe com o vazamento da Polícia Federal", afirma Lula. "É isso, é isso", responde Edinho.

A Jaques Wagner, o ex-presidente conta que o jornal carioca havia publicado um editorial sobre o caso "tentando cagar em cima do governo" –e que era "importante alguém responder".

Em outro telefonema, Lula recebe um pedido de Gilberto Carvalho para que leia a entrevista que seu ex-chefe de gabinete deu à Folha, publicada no último dia 7 –"enorme", segundo ele.

"Dá uma lida, Lula, pede pra alguém ver. Eu queria um comentário seu, porque meti bala, fui pra cima dos homens", afirma Carvalho. O ex-presidente responde: "Eu vou ver, eu vou ver".

Os grampos sugerem também que pessoas ligadas ao ex-presidente poderiam ter conhecimento prévio de supostos desdobramentos da Lava Jato.

Na noite de 6 de março, o prefeito de São Bernardo, Luiz Marinho (PT), ligou para o advogado Roberto Teixeira para dizer que tinha ouvido notícias de que repórteres da Globo estariam escalados para fazer plantão em frente à casa do ex-presidente e à Polícia Federal.

"E eu não sei o que fazer. Pode ser tudo, pode ser nada, entendeu?", diz Marinho.

PERSEGUIÇÃO

Após seu depoimento na Operação Aletheia, Lula reclamou, em conversa com Nelson Barbosa, ministro da Fazenda, de uma suposta perseguição da Receita Federal contra as contas de seu instituto –e disse que Barbosa deveria cobrar "o responsável" para que se fizesse o mesmo com outras empresas, incluindo algumas de mídia.

"Tão procurando pelo em ovo. Era preciso você chamar o responsável e falar 'Vocês estão fazendo o mesmo com a Globo, com o Instituto Fernando Henrique Cardoso, o mesmo com Gerdau, com o SBT, com a Record?! Ou só com o Lula, car*?!'", disse.

A repercutir o depoimento com a presidente Dilma Rousseff, Lula avalia que a imprensa pode estar por trás do processo: "É um espetáculo de pirotecnia sem precedentes, querida. Eles estão convencidos de que com a imprensa chefiando qualquer processo investigatório, eles conseguem refundar a República".


Endereço da página:

Links no texto: