Folha de S. Paulo


Delcídio diz que banqueiro topou pagar R$ 1,5 mi para calar delator

O senador Delcídio do Amaral (PT-MS) disse em seu acordo de delação que o banqueiro André Esteves aceitou ajudar a comprar o silêncio do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró porque temia que viessem à tona as propinas que um sócio dele pagou à BR Distribuidora para ter essa bandeira numa rede de postos de gasolina.

Esteves, que está em prisão domiciliar e alegava ser vítima do maior erro da Operação Lava Jato, teria aceitado pagar R$ 1,5 milhão ao advogado que defendia Cerveró, Edson Ribeiro, segundo o relato de Delcídio.

O senador afirma que "André Esteves, em principio, disse que tinha interesse nos pagamentos para o custeio da família Cerveró, em pagar os honorários advocatícios". O defensor de Cerveró chegou a preparar um contrato que seria celebrado com uma das empresas de Esteves para justificar a saída legal dos recursos, ainda de acordo com Delcídio.

As negociações entre o senador e o banqueiro começaram em setembro do ano passado, depois que um dos filhos do pecuarista José Carlos Bumlai, chamado Maurício Bumlai, desistiu de ajudar Cerveró, segundo o relato de Delcídio.

Maurício chegou a pagar R$ 250 mil ao advogado de Cerveró, em cinco parcelas, mas interrompeu os pagamentos quando soube que o lobista Fernando Soares, o Baiano, citara José Carlos Bumlai em sua delação. Ou seja, o silêncio de Cerveró já não servia para nada no caso de Bumlai porque um outro delator entregara o papel dele na intermediação de contratos da Petrobras, no caso o fornecimento de sonda para exploração de petróleo, negócio que rendeu R$ 1,6 bilhão para o grupo Schahin.

Leia a íntegra da delação:

Leia a íntegra da delação

Delcídio conta que procurou a família Bumlai a pedido do ex-presidente Lula. O senador relata que Lula pediu ajuda a ele para "segurar" a delação de Cerveró porque as revelações atingiriam o seu amigo pecuarista.

De acordo com o senador, "o motivo fundamental para sua intervenção na engrenagem voltada ao embaraço da delação de Nestor Cerveró consistia em evitar que viessem à tona fatos supostamente ilícitos com o envolvimento do próprio depoente [Delcídio], além de José Carlos Bumlai e de Lula".

Delcídio diz que houve uma "chantagem explícita" por parte de Lula, realizada inicialmente sobre ele e depois sobre a família Bumlai. O objetivo da "chantagem", de acordo com Delcídio, era comprar o silêncio de Cerveró" e, assim, favorecer não apenas José Carlos Bumlai, mas também o próprio Lula".

MEU BANCO É MEU NOME

Delcídio relata que Esteves aceitou participar da operação para silenciar Cerveró porque queria evitar que o seu nome aparecesse na Lava Jato como pagador de suborno.

O banqueiro dizia que não queria se envolver com propina porque "meu banco é meu nome".

Foi por essa razão, segundo o senador, que o banqueiro repassou a um sócio numa rede de 120 postos de gasolina, chamado Carlos Santiago, a tarefa de pagar propina à BR Distribuidora para que a rede passasse a operar com essa bandeira. Como a BR é loteada politicamente, conseguir operar com a bandeira da distribuidora requer apoio político. No caso dos postos, o senador Fernando Collor (PTB-AL) é alvo de uma investigação no Supremo, na qual é acusado pelo doleiro Alberto Youssef de ter recebido R$ 3 milhões nesse negócio.

Cerveró forneceu outros valores em sua delação. Ele diz ter ouvido do empresário Pedro Paulo Leoni Ramos que Esteves e seu sócio pagaram de R$ 6 milhões a R$ 10 milhões para obter a bandeira da BR para a rede de postos.

O senador diz ainda que o banqueiro é um dos principais mantenedores do Instituto Lula. "Isso se deve ao fato de Lula ter sido um grande sponsor [patrocinador] dos negócios do BTG".

Delcídio, no entanto, diz não saber da participação de Lula num outro negócio suspeito que Esteves teria participado, a compra de uma parte da Petroáfrica. Segundo Delcídio, o BTG Pactual pagou US$ 1,5 bilhão por 50% da Petroáfrica, mas o negócio valia US$ 2,7 bilhões, de acordo com avaliação que ele diz ter ouvido de auditores da Petrobras.

Delcídio, Esteves e o advogado de Cerveró, Edson Ribeiro, foram presos em 25 de novembro do ano passado. Delcídio saiu da prisão depois de fazer delação. Esteves cumpre prisão domiciliar em São Paulo desde 17 de dezembro, quando o Supremo libertou-o do presídio Bangu 8.

OUTRO LADO

A assessoria do banqueiro André Esteves informou que ele nunca empregou a expressão "meu banco é meu nome", citada pelo senador Delcídio do Amaral (PT-MS) na delação. "Nunca falei essa frase para ninguém", afirmou o banqueiro, segundo a sua assessoria. A frase não traduz a situação do banco, que não é só de Esteves, mas de um grupo de 239 sócios.

Esteves nega que tenha topado pagar R$ 1,5 milhão para calar o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró. A defesa do banqueiro diz que ele nunca participou dos fatos narrados por Delcídio.

O advogado de Maurício Bumlai, Damian Vilutis, diz que seu cliente nega a versão relatada por Delcídio, de que teria dado R$ 250 mil para Cerveró desistir da delação. "Isso não tem o menor cabimento", afirma Vilutis.

O BTG Pactual diz que não foi o banco, mas uma empresa dos sócios, que investiu numa rede de postos que recebeu a bandeira da BR Distribuidora. Essa empresa, chamada Partners Alpha Participações, diz desconhecer "qualquer irregularidade nas operações".

O banco nega que seja mantenedor do Instituto Lula, mas diz ter feito uma única doação para a entidade mantida pelo ex-presidente, em 2014. O mesmo valor foi entregue ao Instituto Fernando Henrique Cardoso, de acordo com o banco.

O BTG Pactual afirma ter contratado Lula para fazer três palestras, uma em 2011 e duas em 2013, em Nova York e Londres, para 300 investidores.

O banco não quis informar o valor da contribuição ao Instituto Lula nem o quanto pagou pelas palestras do ex-presidente.

O Instituto Lula, por sua vez, disse que não se pronunciaria sobre a delação de Delcídio.

Até este momento, a Folha não conseguiu localizar a defesa de Carlos Santiago.

Veja a íntegra da nota do BTG Pactual:

"O BTG Pactual esclarece que não é, e nunca foi, mantenedor do Instituto Lula. O Banco tem como política realizar doações para entidades socioculturais sem fins lucrativos, como fundações educacionais, orquestras, museus e entidades filantrópicas.

O BTG Pactual fez, em 2014, sua única doação para o Instituto Lula, mesmo valor, aliás, destinado à Fundação Instituto Fernando Henrique Cardoso no biênio 2010/2011. O valor doado a esses dois institutos representa menos de 2 % cada do total de doações realizadas pelo banco desde 2010.

O banco também fez doações para a Fundação Estudar, Insper Engenharia, Parceiros da Educação, Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp), Orquestra Sinfônica Brasileira (OSB) no Rio de Janeiro, Museu Judaico, Conservation International Brasil, Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM) e Museu de Arte de São Paulo (Masp), entre outras instituições.

O BTG Pactual contratou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por meio da empresa L.I.L.S. Palestras, Eventos e Publicações Ltda., para realizar uma palestra no ano de 2011 e duas palestras em 2013. Essas palestras foram realizadas no âmbito do evento internacional LatAmCEO Conference em Nova Iorque e Londres, nas quais ele falou para cerca de 300 investidores em cada uma delas. Os valores desembolsados pelas palestras foram compatíveis com a relevância dos eventos realizados e não se afastam da faixa de valores usualmente cobrados por ex-presidentes de outros países.

Nesses eventos, o BTG Pactual usualmente convida ex-presidentes para fazer palestras. Já participaram, entre outros, Nicolás Sarkozy (França), Cesar Gaviria (Colômbia), Alan Garcia (Peru), Álvaro Uribe (Colômbia) e Sebastián Piñera (Chile).

As Medidas Provisórias 668 e 681 não tratam do Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS) nem beneficiam a atividade específica do BTG Pactual."


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