Folha de S. Paulo


análise

Lula e PT entregam Dilma à própria sorte

A decisão do PT de contrariar as ordens do Planalto e determinar que seus deputados no Conselho de Ética da Câmara votem contra Eduardo Cunha (PMDB-RJ), com a consequente aceitação pelo presidente da Casa da analise do pedido de impeachment de Dilma Rousseff, entregou a presidente da República à própria sorte.

Nas últimas semanas, havia um embate no PT e dentro do governo sobre como lidar com a ameaça aberta de Cunha.

O partido crescentemente defendia que seria melhor se divorciar de Cunha e enfrentar no plenário o pedido de impedimento da presidente —afinal, são necessários apenas 171 de 512 votos na Câmara para barrar a ideia no nascedouro (Cunha não vota, exceto num empate que não seria suficiente para a aprovação, que precisa de 2/3 do plenário).

O núcleo duro do Planalto fez outras contas, e até esta quarta (2) apenas o lulista Edinho Silva (Comunicação Social) ainda defendia a estratégia de enfrentamento.

Na análise palaciana, as margens de votação da base aliada, variando entre 130 e pouco mais de 200 votos, é muito estreita. Para piorar, o clima político desandou com a prisão do líder de Dilma no Senado, Delcídio do Amaral (PT-MS), nas semana passada.

Ao temor de uma delação premiada dele ou de o teor da colaboração já acertada do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, potencialmente danosos ao governo, vieram se somar os números desastrosos do PIB, divulgados na terça (1).

Assim, Wagner pressionou pelo plano de salvar Cunha, bombardeado pelo próprio PT, a partir de "tweets" do presidente da sigla, Rui Falcão.

Destroçado pela sucessão de escândalos, com dois ex-tesoureiros presos e praticamente todos seus nomes históricos envolvidos em acusações criminais, o PT percebeu tardiamente o efeito de abraçar Cunha rumo ao abismo da crítica da opinião pública.

O partido já antevê uma eleição municipal desoladora em 2016, mas ainda tem o trunfo de ter como presidenciável Luiz Inácio Lula da Silva –combalido e hoje muito rejeitado, passível de investigações ainda incipientes, mas o último nome forte da sigla.

Pelo senso comum, não interessa nem ao PT, nem a Lula, a queda em desgraça de Dilma. Ainda há condições, mesmo que desfavoráveis dia após dia, de repetir Fernando Henrique Cardoso em 1999 e derrubar a ideia do impeachment no plenário.

Mas está dado que ambos, Lula e PT, já consideram que o eventual impeachment da presidente vale menos a eles do que a tentativa de salvar o que sobrou de seu projeto político.


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