Folha de S. Paulo


Operador do PMDB recebeu R$ 20 mi de empreiteiras suspeitas da Lava Jato

Uma das empresas de João Augusto Rezende Henriques, preso nesta segunda (21) sob suspeita de ser um dos operadores do PMDB na diretoria internacional da Petrobras, recebeu R$ 20 milhões de empreiteiras suspeitas de integrarem o esquema de corrupção na estatal.

Henriques é apontado pelo Ministério Público Federal como uma espécie de preposto do ex-executivo da Petrobras Jorge Luiz Zelada, preso desde julho, para recolher e repassar propina em contratos da diretoria internacional, no Brasil e no exterior.

Os investigadores detectaram que a Trend Empreendimentos, que pertence a Henriques, recebeu transferências bancárias da Andrade Gutierrez, da Mendes Júnior, da UTC e do Consórcio Novo Cenpes (liderado pela OAS) e de empreiteiras menores no valor de R$ 18,4 milhões. Além disso, a Procuradoria também encontrou evidências de que a Engevix pagou outros R$ 1,8 milhão à firma de Henriques.

A Procuradoria sustenta que a empresa não tem capacidade técnica e que contratos de assessoria às grandes empreiteiras eram somente um disfarce para a propina.

"Há fundada suspeita de que ele teria intermediado o pagamento de propinas em contratos da Petrobras para dirigentes da referida empresa e para agentes políticos ainda não identificados", escreveu o juiz federal Sergio Moro, ao justificar a prisão de Henriques.

Uma das operações suspeitas envolvendo a Trend Empreendimentos ocorreu em 2011, quando ela distribuiu R$ 1,4 milhão a títulos de lucro para Vitor Pereira Delphim, que nunca foi sócio da empresa. Henriques entregou-se no início da tarde desta segunda e Delphim foi levado para prestar depoimento à Polícia Federal.

No pedido de prisão, os investigadores também dizem ter encontrado rastros da atuação de Henriques como operador de suborno em outros negócios da área internacional: o contrato de afretamento do navio-sonda Titanium 10000 por US$ 1,8 bilhão com a Vantage Drilling e um contrato de US$ 825 milhões vencido pela Odebrecht para serviços de segurança, meio ambiente e saúde em ativos da estatal no exterior. Mais tarde, o contrato foi reduzido para US$ 485 milhões porque a Petrobras vendeu ativos no exterior.

NAVIO-SONDA

O lobista Hamylton Padilha, também ligado ao PMDB, descreveu em um dos depoimentos de sua delação premiada como João Augusto Henriques agiu nos bastidores como intermediário de Zelada.

Padilha era o representante da Vantage e foi informado por Raul Schimidt, outro lobista ligado a Zelada e que é réu em ação penal por corrupção e lavagem de dinheiro, que o negócio do afretamento do Titanium 10000 só iria para frente se houvesse o pagamento de propina. Representantes da Vantage toparam, segundo o delator, pagar o pedágio.

No final, parte da propina teria fluido por meio de um contrato de comissionamento de US$ 14,5 milhões entre a TMT, uma acionista da Vantage, e a Oresta Associated, uma offshore baseada em Belize, controlada por Padilha.

Só dois terços deste valor foram efetivamente pagos, nas contas de Padilha na Suíça, porque a TMT decretou concordata no período, travando o desembolso da última parcela da comissão. Dos US$ 10,8 milhões recebidos, Padilha repassou US$ 5 milhões a Raul Schimidt e, a partir dele, parte do dinheiro teria chegado às contas de Zelada.

A Procuradoria ainda suspeita da atuação do lobista na venda pela Petrobras da refinaria de San Lorenzo, na Argentina, e na aquisição pela Petrobras de 50% de um bloco de exploração de petróleo na Namíbia, país da África ocidental.

OUTRO LADO

A Folha ainda não conseguiu ouvir a defesa de João Augusto Henriques. Em depoimento em julho, ele negou que tenha ligações políticas com o PMDB ou intermediado propina.

A defesa de Zelada também refuta a acusação da Procuradoria de que o ex-diretor tenha recebido propina por contratos de empreiteiras com a área internacional da Petrobras.

A Andrade Gutierrez disse que não fará mais qualquer pronunciamento sobre os processos em andamento para garantir que não haja qualquer prejuízo à defesa de seus colaboradores e ex-colaboradores. A Engevix e a UTC também disseram que não se pronunciariam sobre os pagamentos feitos à Trend.

Já a Odebrecht disse que o contrato firmado com a Petrobras foi "resultado de licitação pública conquistada em 2010 de forma legítima por menor preço, em total respeito à lei".

"O contrato era destinado à execução de serviços em instalações da Petrobras fora do Brasil, e teve seu valor reduzido em janeiro de 2013 - exclusivamente em decorrência do plano de desinvestimento dos ativos da Petrobras no exterior, e não em virtude de auditoria interna, como está claro no aditivo contratual assinado entre as partes", afirmou a empresa, em nota.

"O plano de desinvestimento da Petrobrás, com a alienação de várias instalações, em diversos países, resultou na diminuição de escopo de trabalho previsto originalmente no contrato, que passou a abranger atividades em cinco países, quando a previsão inicial era atuar em nove países", finalizou a nota da Odebrecht.

A Folha não conseguiu localizar o advogado de Raul Schmidt. Em ocasiões anteriores, ele havia negado o envolvimento com atos de corrupção e pagamentos de propina no exterior.


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