Folha de S. Paulo


Novo ministro de Dilma, Mangabeira Unger assume papel de provocador

Roberto Mangabeira Unger, brasileiro e professor de filosofia na Universidade Harvard que teve Barack Obama como aluno, não gosta de conversar sobre amenidades.

Ele é conhecido por citar Hegel e Thomas Jefferson na mesma frase. Pronuncia-se extensamente sobre assuntos como a condição humana. Certa vez, quando questionado se esperava se tornar presidente do Brasil, respondeu: "Sempre fui mais ambicioso que isso".

Unger, 68, é uma figura singular na política brasileira.

Conhecido por "O Futuro do Progressismo Americano", que coescreveu em 1998 com Cornel West, Unger no passado se envolveu com a política eleitoral. Hoje, ele ocupa um cargo no Executivo. Em fevereiro, a presidente Dilma Rousseff o apontou como ministro de Assuntos Estratégicos, com a missão de fomentar o pensamento em longo prazo sobre o Brasil.

Em entrevista a bordo de um jatinho operado pela Força Aérea Brasileira, que ele usa em suas viagens pelo país, Unger explicou que entende seu papel como o de uma espécie de "provocateur" intelectual. "Tenho de criar tensão dentro do governo e agitação fora dele."

Uma pessoa como Unger talvez não devesse contar com chegar muito longe em uma cultura política onde os insurgentes hoje tendem -sem piada- a ser palhaços expressando decepção com o sistema ou libertários posando de super-heróis.

Porém Unger, declaradamente esquerdista, está desfrutando de um momento positivo, navegando os corredores do poder na capital, Brasília, com toda a graça de um touro em uma loja de porcelanas.

'ANARQUIA CRIATIVA'

Sua filosofia radical, nutrida em mais de 15 livros, envolve um apelo por incomodar as instituições a fim de evitar a "esterilização" do potencial humano, a crença de que é possível atingir a redenção por meio da transformação pessoal e ideias como a de conceber o Brasil na forma de "uma grande anarquia criativa".

Unger foi causa de muitas controvérsias ao ocupar o mesmo posto ministerial de 2007 a 2009, no governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Unger foi convidado para o posto, então, mesmo depois de ter definido publicamente o governo de Lula como "o mais corrupto na história nacional".

Ele está começando mais ou menos do mesmo jeito neste ano, depois de voltar de Harvard. Suas ações vêm causando preocupação entre os cientistas do clima brasileiros, cuja influência ele estaria tentando cercear. Nada diplomaticamente, ele questionou por que o Ministério do Exterior é comandado por um diplomata de carreira. E apelou por uma rebelião contra as normas vigentes de propriedade intelectual e patentes.

Unger nasceu em 1947 no Rio de Janeiro, de mãe brasileira e pai norte-americano, mas seus pais o criaram em Manhattan.

Quando criança, Unger passava as férias no Rio com seu avô materno Octavio Mangabeira, proeminente político baiano.

Depois da morte de seu pai, quando ele tinha 11 anos, a mãe de Unger se mudou com ele de volta para o Brasil. Ele estudou direito no Rio no final dos anos 60, um período tumultuado depois que a ditadura militar instalada em 1964 endureceu sua política.

ESTRATÉGIA

Unger descreve sua missão como ajudar o Brasil a "redefinir uma nova estratégia de desenvolvimento, baseada no reforço das capacidades educacionais e no alargamento das oportunidades econômicas".

Definido por seus críticos como "absurdamente romântico", Unger é notoriamente escorregadio, em dados momentos. "É melhor ter uma voz dentro do Estado do que ter uma voz fora dele, mas é melhor ter uma voz fora do Estado do que voz alguma dentro dele", afirmou.

Emprestando uma frase de "O Homem Sem Qualidades", romance do austríaco Robert Musil, ele disse que "os filósofos são déspotas sem exércitos para comandar". A incursão na política "me privou do meu escudo", disse.

O que os filósofos devem evitar, acrescentou Unger, "é a tentação de seguir o exemplo de Platão e buscar influência sussurrando nos ouvidos dos poderosos".


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