Folha de S. Paulo


Vaccari usou gráfica para lavar propina ao PT, diz juiz

Condenada por realizar propaganda irregular de Dilma Rousseff em 2010, a Editora Gráfica Atitude recebeu R$ 1,5 milhão de um dos suspeitos de integrar o esquema de desvios na Petrobras, de acordo com o Ministério Público Federal. Pagamentos feitos entre 2010 e 2013 foram considerados pelo juiz Sergio Moro prova documental decisiva para a decretação da prisão preventiva do tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, na manhã desta quarta (15).

A Editora Gráfica Atitude Ltda., que teria sido indicada por Vaccari para o pagamento da propina devida por uma das empreiteiras que operavam na Diretoria de Serviços da Petrobras, pertence aos sindicatos dos Bancários e dos Metalúrgicos do ABC. A empresa edita a publicação "Revista do Brasil" e o site "Rede Brasil Atual".

Suspeito de corrupção e lavagem de dinheiro, Vaccari foi apontado por cinco delatores como o operador do PT no petrolão, mas um conjunto de extratos bancários corroboraram as acusações feitas contra o petista.

Augusto Ribeiro de Mendonça Neto, executivo da Setal Óleo e Gás (SOG) que fez acordo com a Procuradoria, afirmou que os pagamentos à Atitude tinham como destino final o PT e foram determinados pelo próprio Vaccari em 2010, 2011 e 2013. Segundo o delator, o valor transferido à Atitude foi descontado dos subornos que a empreiteira deveria repassar ao partido pelos contratos na Diretoria de Serviços.

Extratos bancários das empresas Tipuana e Projetec, controladas por Mendonça, registram pagamentos que somam R$ 1.501.600 entre 29 de junho de 2010 e 19 de agosto de 2013.

Em depoimento no dia 31 de março de 2015, Mendonça disse que a SOG não tinha qualquer interesse comercial em anunciar na "Revista do Brasil", editada pela Atitude, e que nem sequer sabe se os anúncios foram ou não veiculados –mas que fez os pagamentos por determinação de Vaccari.

No despacho em que determinou a prisão do tesoureiro, o juiz Moro conclui os pagamentos à Atitude escondiam doações não-contabilizadas ao PT: "Observo que, para esses pagamentos à Editora Gráfica Atitude, não há como se cogitar, em princípio, de falta de dolo dos envolvidos, pois não se tratam de doações eleitorais registradas, mas pagamentos efetuados, com simulação, total ou parcial, de serviços prestados por terceiros, a pedido de João Vaccari Neto".

Os pagamentos das empresas de Mendonça à Editora Atitude são apenas uma parte do montante total da propina paga pela SOG, segundo a Procuradoria. Entre 2008 e 2012, R$ 4,26 milhões foram repassados pela SOG, PEM Engenharia e Projetec (controladas por Mendonça) ao PT por meio de doações registradas na Justiça Eleitoral.

Segundo o delator, a origem destas "doações legais" era dinheiro obtido no contrato com a Petrobras e eram repassadas ao PT a pedido do então diretor de Serviços Renato Duque e por intermédio de João Vaccari Neto.

PROPAGANDA DE DILMA

A gráfica apontada pela força tarefa da operação como beneficiária valores do esquema de corrupção da Petrobras já foi punida pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) pela realização de propaganda eleitoral ilegal em 2010 em favor da então candidata à presidência da República Dilma Rousseff (PT), e contrária ao candidato tucano José Serra (PSDB).

Em abril de 2012, a Editora Gráfica Atitude, investigada na Lava Jato, e a CUT (Central Única dos Trabalhadores) foram condenadas a pagar multas de R$ 15 mil pelo TSE sob a acusação de promoverem a candidatura petista em jornal financiado pela CUT e em revista produzida pela editora, em setembro e outubro de 2010.

À época, o tribunal aplicou a punição com base no artigo 24 da Lei das Eleições (Lei nº 9.504/1997), que proíbe que sindicatos contribuam direta ou indiretamente com recursos para campanhas de candidatos ou partidos.

De acordo com o voto da relatora do caso em 2012, ministra Nancy Andrighi, as provas do processo não deixaram dúvida quanto à realização da propaganda eleitoral ilegal. "Os elementos probatórios dos autos não deixam dúvida quanto à realização da propaganda eleitoral. Os textos fazem menção direta às eleições presidenciais e suscitam a ideia de que a candidata representada seria a mais apta ao exercício do cargo em disputa, além de fazer propaganda negativa contra o seu principal adversário nas eleições de 2010", disse a ministra relatora. Os textos fazem menção direta às eleições presidenciais e suscitam a ideia de que a candidata representada seria a mais apta ao exercício do cargo em disputa, além de fazer propaganda negativa contra o seu principal adversário nas eleições de 2010", segundo o voto de Andrighi.

Porém, à época a ministra não considerou que a punição deveria se estender à Dilma e sua coligação, por entender que não havia no processo indícios de que a candidata e a equipe de campanha soubessem sobre as publicações irregulares.

ENRIQUECIMENTO

Na ordem de prisão, Moro também afirma que o Ministério Público Federal tem "razão" ao apontar indícios de "enriquecimento ilícito" de familiares de Vaccari, como a mulher dele, Giselda, a filha Nayara e a cunhada Marice Correa de Lima.

O documento cita, por exemplo, que Giselda recebeu em sua conta bancária depósitos de origem não identificada que somaram R$ 322,9 mil até 2014. Também menciona um relatório fiscal que aponta que a filha do casal, apesar de praticamente não ter tido um trabalho com rendimentos tributáveis, possuía um patrimônio de R$ 1 milhão no fim de 2013.

O juiz também citou conversa em que um funcionário da empreiteira OAS pede ao doleiro Alberto Youssef para entregar dinheiro na casa da cunhada de Vaccari. Uma planilha apreendida indica que os valores eram de R$ 244 mil.

Outra suspeita levantada é a compra de um apartamento por Marice no Guarujá (litoral paulista). O documento afirma que ela comprou o imóvel da empreiteira OAS por R$ 200 mil, desistiu do negócio e recebeu em troca R$ 430 mil de devolução. A empresa vendeu posteriormente o apartamento por um valor mais baixo, o que chamou a atenção dos investigadores.

Moro citou na decisão que a OAS é uma das empreiteiras envolvidas no "esquema criminoso da Petrobras" e alvo de uma ação penal relacionada à Lava Jato. Ele afirmou, no entanto, que é preciso "aprofundar a investigação" sobre o patrimônio e que os fatos ainda não são totalmente conclusivos.

OUTRO LADO

Procurado pela Folha, o coordenador editorial e financeiro da Editora Gráfica Atitude, Paulo Salvador, disse que vai esperar ser notificado pela Justiça para se pronunciar. A defesa de João Vaccari Neto ainda não comentou a prisão e as considerações do juiz Sergio Moro. O tesoureiro do PT tem negado envolvimento em irregularidades.


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