Folha de S. Paulo


Procuradores e juízes criticam acordos de leniência e Lei Anticorrupção

Procuradores da República e e juízes federais atacaram nesta terça-feira (24) acordos de leniência para empresas alvos da Operação Lava Jato e o decreto de Dilma Rousseff que regulamentou a Lei Anticorrupção.

Os acordos, que podem ser firmados com a CGU (Controladoria-Geral da União), fazem com que empresas, em troca da atenuação de punições administrativas, colaborem com investigações e paguem multas com a União.

A regulamentação da lei – na qual os acordos são detalhados– foi a única medida de eficácia imediata prevista no pacote anticorrupção lançada pela presidente na semana passada. O pacote foi lançado como uma resposta aos atos contra Dilma e a corrupção do último dia 15.

As críticas às duas medidas, feitas em debate sobre corrupção no Tribunal de Contas da União, vieram de vídeo produzido da Ajufe (Associação dos Juízes Federais do Brasil), da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República) e de Gilson Dipp, ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça.

No vídeo da Ajufe, entrevistados colocaram em dúvida as consequências dos acordos para os processos judiciais e criticaram a possibilidade de eles serem firmados apenas pela CGU – cujo chefe, Valdir Simão, estava na plateia.

A não participação de procuradores e juízes nesses acordos tem gerado críticas no contexto da Lava Jato, segundo as quais a o governo, por meio da AGU, acabaria beneficiando as empresas, para não parar obras públicas, e assim alimentaria a impunidade.

O presidente da ANPR, Alexandre Camanho corroborou parte das críticas. Segundo ele, a regulamentação da lei não pode ser pautada pelo "casuísmo" e pensada apenas sob a perspectiva da Lava Jato.

"Como é que acordos são firmados pela CGU à inteira revelia de outras autoridades?", afirma, sobre o que diz a regulamentação sobre os acordos. Essa exclusividade do Executivo, afirmou, fará com que as empresas tenham medo de ser achacadas.

"Se nós pensarmos que acordos podem ser firmados nos âmbitos estaduais e municipais [e com as controladorias dessas esferas], o motivo passa a ser de pânico, e com certeza quem está em pânico é a iniciativa privada no Brasil."

O MPF (Ministério Público Federal), afirmou, quer mecanismos para ter certeza que esses acordos não gerarão impunidade. Camanho também teme que os acordos possam fazer com que as investigações penais sejam prejudicadas – os réus optariam por ceder informações à CGU, não ao MPF.

PROTAGONISMO 'EXAGERADO'

Gilson Dipp reafirmou a crítica de que a regulamentação foi feita de maneira açodada e indevidamente influenciada pela Lava Jato. "Estamos colocando essa lei casuisticamente, examinando essa lei frente a o quê? À Operação Lava Jato. Causa uma distorção da interpretação da lei, que já é complexa."

Para ele, a regulamentação vai além da lei original em relação a acordos. "No regulamento, a CGU teria competência para instaurar e julgar [processos administrativos]. Na minha opinião, [a lei] não [diz que] tem competência para julgar", exemplificou.

Segundo Dipp, a CGU passou a ter um protagonismo "exagerado" com a regulamentação da Lei Anticorrupção. Com isso, afirmou, os acordos poderão ser questionado em tribunais "como abuso de poder e como usurpação de competência, com o risco de anulação de todo o processo".

A jornalistas, depois do evento, Simão afirmou que não considera as falas como críticas, mas fato natural do debate público sobre as normas. Para ele, parte dos comentários é infundada. Ele afirmou que o TCU acompanhará cada passo dos acordos. Mesmo assim, lembrou, apenas 4 das 24 empresas investigadas pela Lava Jato procuraram o órgão para tentar fechar os acordos.

"Não há uma corrida por acordos com a CGU", disse. Ele negou que a Lava Jato tenha pautado a regulamentação da lei.


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