Folha de S. Paulo


Clã Sarney deixa poder, mas grupo não vai sair de cena

No último dia 18 de dezembro, o senador José Sarney (PMDB-AP) fez seu discurso de despedida do Congresso Nacional diante de um plenário vazio.

Uma semana antes, a filha Roseana havia renunciado ao governo do Maranhão para não ter de passar a faixa ao sucessor que tirou seu grupo político do poder.

A eleição de Flávio Dino (PC do B), que governará o Estado a partir deste 1º de janeiro, encerra um ciclo de quase 50 anos de comando de aliados de Sarney à frente do Palácio dos Leões e coincide com a saída do patriarca da vida pública. Ele não disputou a reeleição para o Senado e ficará sem mandato a partir de 2015.

A posse do novo governo, no entanto, não significa a saída de cena da família. Auxiliares de Dino afirmam que, além de serem donos dos principais veículos de comunicação do Maranhão, os Sarney manterão aliados em instituições importantes.

O futuro presidente do Tribunal de Contas do Estado, que também assume neste dia 1º, é um dos cinco conselheiros –de um total de sete– considerados alinhados ao grupo Sarney.

Ex-deputado estadual, Jorge Pavão foi secretário de Roseana em gestões passadas antes de chegar à corte, em 2000. O ex-vice da peemedebista Washington Oliveira será o ouvidor do órgão, responsável por julgar as contas do governo.

No Tribunal de Justiça, a corregedoria-geral é ocupada pela desembargadora Nelma Sarney, cunhada do ex-presidente. Pelo critério de antiguidade, ela poderá ser eleita para comandar a corte no final de 2017, ainda durante o governo Dino.

A desembargadora nega que as relações familiares influenciem sua atuação. "Sempre agi com independência. Seremos parceiros do governador Flávio Dino, meu colega de magistratura [ele é ex-juiz federal], em seu compromisso de atacar os problemas da segurança e do sistema carcerário", diz Nelma.

'MEMÓRIA DA PRESIDÊNCIA'

Dino terá que lidar ainda com um órgão do governo do Maranhão comandado diretamente pela família Sarney. A Fundação da Memória Republicana Brasileira, órgão público criado por Roseana para administrar o acervo da antiga Fundação Sarney, que era privada, é dirigida por um conselho curador no qual o ex-presidente tem a prerrogativa de indicar dois de seus nove integrantes.

A lei orçamentária do Maranhão prevê que a Secretaria da Educação destine R$ 3 milhões em 2015 para a conservação do acervo de Sarney. O orçamento total da pasta é de R$ 1,8 bilhão.

A fundação é presidida por Anna Graziela Costa, que foi chefe da Casa Civil de Roseana até dezembro e tem mandato de seis anos, assim como seus colegas de conselho, que incluem amigos e antigos auxiliares do ex-presidente e da ex-governadora.

"Ele [Dino] será o governador, mas o órgão será gerido pelo Sarney", diz Rodrigo Lago, futuro secretário estadual de Transparência e Controle.

Auxiliares do novo governador acreditam que, embora a ausência de mandato diminua o poder político de Sarney, ele tentará exercer um "poder paralelo" para dificultar a gestão Dino e retomar o Estado em 2018.

Seu grupo político, no entanto, ainda não tem um nome natural para o próximo pleito. Roseana, que havia anunciado em meados de 2014 que não disputaria mais eleições, ainda é apontada como potencial candidata.

Um possível obstáculo para o retorno da ex-governadora às urnas é a citação de seu nome nas investigações da Operação Lava Jato –ela nega irregularidades.

SOBRENOME

Apesar da saída de Roseana e do ex-presidente, o sobrenome Sarney continuará presente nas casas legislativas de São Luís e de Brasília.

O deputado federal Sarney Filho (PV) foi reeleito para o nono mandato.

Adriano Sarney, filho do parlamentar e neto de Sarney, terá o primeiro mandato como deputado estadual. O grupo de Flávio Dino espera que ele tenha uma atuação discreta, embora acredite que ele se alinhará ao grupo de deputados que fará oposição mais ferrenha ao governo.

Também estão previstos embates com o Sistema Mirante de Comunicação, que pertence à família Sarney e inclui a retransmissora local da Rede Globo, rádios e o jornal "O Estado do Maranhão", o maior do Estado.

Dino prometeu diminuir os repasses de publicidade oficial aos veículos da Mirante, que considera terem sido privilegiados pelos governos até agora. Sua expectativa é que se tornem porta-vozes da oposição, especialmente a coluna dominical que Sarney assina em "O Estado".


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