Folha de S. Paulo


Marinha diz que Comissão cumpriu seu papel e que aguarda orientação do governo

Roberto Stuckert Filho - 11.dez.14/PR
A presidente Dilma Rousseff participa de cerimônia da Marinha
A presidente Dilma Rousseff participa de cerimônia da Marinha

O comandante da Marinha, almirante Júlio Soares de Moura Neto, afirmou nesta sexta-feira (12) que a Comissão Nacional da Verdade cumpriu seu papel e que a Marinha, assim como o governo brasileiro, irá se debruçar sobre o relatório final.

O almirante e os outros dois comandantes das Forças Armadas –o general do Exército Enzo Peri e o brigadeiro Juniti Saito, da Aeronáutica– se encontraram pela primeira vez com a presidente Dilma Rousseff desde a divulgação do relatório nesta manhã, no Rio.

Os quatro dividiram palco durante inauguração do prédio principal do estaleiro de construção de submarinos da Marinha, em Itaguaí, na baixada fluminense. Em coletiva após a solenidade e sem a presença da presidente, o almirante afirmou que os comandantes militares não conversaram com Dilma sobre o relatório –a presidente seguiu para outro compromisso no Rio, na companhia do governador Luiz Fernando Pezão e do ministro da Defesa, Celso Amorim.

Roberto Stuckert Filho/AFP
A presidente Dilma e o ministro da Defesa, Celso Amorim (dir.), com oficiais da Marinha
A presidente Dilma e o ministro da Defesa, Celso Amorim (dir.), com oficiais da Marinha

Neto afirmou que as Forças Armadas irão aguardar a orientação do governo brasileiro para se posicionar de maneira mais específica sobre o resultado da comissão.

"É realmente a primeira vez que nós nos encontramos com a presidente [desde a divulgação do relatório] e esse assunto não foi tocado com ela. Nos limitamos a falar sobre a inauguração desse prédio", respondeu ele.

Nesse momento, a assessora de imprensa da Marinha reforçou aos jornalistas que o "tema" da coletiva não era esse.

Em tom de brincadeira, o almirante disse que "a pessoa não consegue resistir à curiosidade" e respondeu a mais uma pergunta sobre o assunto.

"Na realidade, o relatório foi entregue à presidente da República e as Forças Armadas estão aguardando exatamente o que ela disse que iria fazer, de que iria se debruçar sobre o relatório. A partir do momento que ela fizer isso talvez saiam algumas orientações, algumas determinações", disse.

Neto afirmou que a Marinha irá se debruçar sobre o relatório, mas não adiantou se alguma providência poderá ser tomada. Ele disse que, por conta da organização da solenidade no Rio, a Marinha ainda não teve tempo de analisar o documento.

"No caso da Marinha também vamos nos debruçar sobre o relatório, o que não fizemos ainda. Esse relatório é do dia 10 e o dia 11 foi a véspera desse grande evento [a inauguração do estaleiro]. Temos alguns compromissos até o final do período de trabalho e aí possivelmente nós vamos ler com detalhes, nos debruçar e aguardar a orientação que virá do governo", disse.

Na terceira pergunta sobre o tema, o almirante, já demonstrando impaciência, afirmou que a comissão cumpriu o seu papel.

"A Comissão Nacional da Verdade cumpriu o papel dela. Fez um relatório, que não tivemos oportunidade de nos debruçar para poder analisar o que está escrito lá", afirmou.

FRONTEIRAS

A presidente defendeu, durante seu discurso, o fortalecimento das Forças Armadas como forma de dissuasão e também para a proteção das fronteiras.

Dilma falou para uma plateia de oficiais e trabalhadores do estaleiro. Ela afirmou que, ainda que o país viva em paz com seus vizinhos há cerca de 150 anos, o Brasil precisa fortalecer seus meios de dissuasão e controle territorial.

"O Brasil é, pois, um país pacífico e assim continuará. Isso, no entanto, não significa descuidar de nossa defesa ou abdicar de nossa capacidade dissuasória. Ao contrário, nossa capacidade de manter a paz será tanto maior quanto mais bem equipadas estiverem as nossas Forças Armadas e mais forte for a nossa indústria da defesa", disse a presidente.

Segundo Dilma, as fronteiras terrestres estão sendo "consolidadas cada vez mais" e os submarinos que serão construídos nos estaleiros da Marinha contribuirão para a defesa de nossos mares e, principalmente, do pré-sal.

A presidente lembrou que o Brasil entrará no grupo dos cinco países que possuem submarino nuclear e que fazem parte do conselho de segurança da ONU.

"Nossas relações com o mundo são pautadas pela defesa da paz como valor essencial entre as nações. Nós colaboramos sempre que demandados em forças internacionais de manutenção da paz sob a égide de organismos internacionais."

LAVA JATO

O almirante foi questionado sobre o cronograma de construção dos submarinos no estaleiro e se havia preocupação com o fato de a Odebrecht, parceira da Marinha no empreendimento, estar sendo investigada na operação Lava Jato, que investiga denúncias de desvios de verbas na Petrobras. O comandante da Marinha se limitou a responder que a força irá aguardar os desdobramentos das investigações.

O presidente da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, participou, ao lado das autoridades no palco, da solenidade, mas não discursou.

A previsão da Marinha é entregar o primeiro submarino convencional em 2018. Será o primeiro dos cinco submarinos não nucleares que serão construídos no estaleiro. A partir da entrega do primeiro, os quatro restantes, segundo o almirante, serão entregues a cada um ano e meio.

Já o submarino com tecnologia de propulsão nuclear será entregue em em 2025, disse o almirante. Apenas cinco países possuem equipamento com a tecnologia no mundo, explicou: Estados Unidos, Inglaterra, França, China e Rússia. Brasil e Índia estão em processo de construção dos seus. O país desenvolve seu projeto em parceria de transferência de tecnologia com o governo francês.

Eles serão incorporados à frota de submarinos convencionais brasileira, que hoje tem cinco equipamentos, no patrulhamento do território naval brasileiro.

MAMÃE NOEL

A solenidade ocorreu sem grandes supresas. O almirante foi o único integrante das Forças Armadas a discusar. Ele disse uma vez o nome da presidente, ao afirmar que estava honrado com sua presença.

Coube ao governador do Rio, Luiz Fernando Pezão (PMDB), rasgar elogios a presidente, a quem chamou de "mamãe noel".

Pezão, que em seu discurso enalteceu, como sempre faz, a parceria entre o governo federal e o Fluminense, enumerou obras conjuntas que, segundo ele, somam R$ 100 bilhões no Estado.

Ele citou as obras da usina Angra 3, o estaleiro da Marinha, o Arco Metropolitano, as obras da linha 3 do metrô do Rio e os projetos de abastecimento de água na Baixada.

"Nós só temos que agradecer (sic). Neste mês de Natal, estamos tão perto do papai noel e a senhora é a nossa 'mamãe noel' do nosso Estado. Eu prometo que não trouxe o 'são pidão' hoje. Não tenho mais nada a pedir, só a agradecer", disse ele.

Pezão chamou atenção pelo traje com que participou da solenidade. Enquanto as demais autoridades civis vestiam terno e gravata e as autoridades militares, farda de gala, Pezão vestia uma camisa social branca de mangas curtas, um tanto amassada, e para fora da calça.

Quem passou por um rápido constrangimento foi o prefeito de Itaguaí, Luciano Mota (PSDB), o primeiro a discursar. Quando teve seu nome anunciado, uma parte dos trabalhadores do estaleiro na plateia deu-lhe uma tímida vaia.


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