Folha de S. Paulo


CPI vai investigar se atestado médico para cancelar depoimento foi adulterado

Numa reunião tumultuada e com direito a bate-boca, a CPI da Petrobras no Congresso decidiu nesta quarta-feira (22) abrir uma investigação para apurar se o atestado médico apresentado pelo diretor de abastecimento da Petrobras, José Carlos Cosenza, para faltar a depoimento, foi adulterado.

Cosenza substituiu no comando da diretoria de abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, delator do esquema de corrupção, que envolve superfaturamento e lavagem de dinheiro dentro da empresa, com participação de partidos e construtoras.

O diretor foi convocado para prestar esclarecimentos à CPI na tarde desta quarta, mas no início da manhã a Petrobras enviou um ofício com cópia do atestado médico alegando que ele estava "impossibilitado" de comparecer porque teve uma "intercorrência clínica" no início da noite desta terça-feira (21).

O documento foi encaminhado à comissão pelo gerente setorial de relacionamento com o Poder Legislativo, Carlos Henrique Lopes Sampaio, e informava ainda que o diretor foi medicado e estava afastado de suas atividades pelos próximos dois dias.

O atestado, de autoria do médico José Eduardo Castro, não fazia nenhuma referência aos sintomas nem a doença que acometia o ex-diretor.

Segundo técnicos da comissão, após identificarem a ausência da CID (Classificação Internacional de Doenças) a CPI entrou em contato com a Petrobras para a complementação do dado. Minutos antes do início da reunião da CPI, foi encaminhado um segundo documento informando que Cosenza teve uma crise hipertensiva.

"A CPI vai investigar se houve adulteração [do atestado], vamos solicitar ao médico o seu posicionamento com relação ao paciente, qual a previsão de alta, quais são os níveis de cuidados que vai ter um paciente com hipertensão primária. Todas essas questões de ordem procedimental nós vamos fazer", afirmou o presidente da CPI, senador Vital do Rego (PMDB-PB).

"A Petrobras tem também um departamento médico e o médico pode ter sido o da Petrobras. Vamos averiguar se ele foi atendido realmente pelo médico da Petrobras e, depois, por um outro médico. Oficiamos ao médico para ter a complementação do que respondia à presidência, que é transformar aquele laudo abrangente em uma patologia, e a patologia é a hipertensão primária", completou.

A oposição reagiu à substituição do documento, especialmente por ter sido enviado pela Petrobras. Não convocamos a Petrobras. "Não convocamos toda a quadrilha, mas apenas um membro da quadrilha. A CPI tem que investigar esse atestado devidamente. Esse documento foi adulterado", afirmou o líder do PPS, Rubens Bueno (PR).

O líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho (PE), disse estranha a "súbita" doença do diretor.

"É de estranhar essa súbita doença no momento em que a CPI tinha um depoimento muito importante faltando poucos dias da eleição, mas parece que é uma tática comandada pelo marketing de campanha da presidente Dilma de tirar do Congresso qualquer possibilidade de discussão da CPMI da Petrobras", afirmou.

CONVOCAÇÃO DE AÉCIO

Na reunião, governistas e oposicionistas também discutiram sobre novos depoimentos. O PT apresentou requerimento para convocar o candidato do PSDB à Presidência, senador Aécio Neves (MG), a prestar esclarecimentos à CPI da Petrobras no Congresso.

O deputado Afonso Florence (PT-BA) afirmou que a convocação de Aécio é motivada pela impossibilidade de o ex-presidente do PSDB, Sérgio Guerra, morto em março deste ano, explicar a declaração do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa ao Ministério Público Federal na qual é acusado de ter recebido R$ 10 milhões para ajudar a esvaziar uma Comissão Parlamentar de Inquérito criada pelo Senado para investigar a Petrobras em 2009.

Segundo o deputado, Aécio deve ser convocado porque é o atual presidente do PSDB. Ele disse que a iniciativa também pedir o depoimento de outros tucanos como o deputado Luiz Carlos Hauly (PR) e o senador Álvaro Dias (PR), além do senador eleito Fernando Bezerra (PSB-PE).

"Que ele [Aécio] venha prestar esclarecimentos para isentar os membros do PSDB. Temos que dar oportunidades de deputados e do presidente do partido de se defender", afirmou Florence.

O líder do Solidariedade na Câmara, Fernando Franceschini (PR), provocou o colega. "Deu um surto de convocação".

Florence reagiu. "Vossa excelência me respeite até porque eu lhe respeito até quando diz bobagens. Não é brincadeira. Me respeite", afirmou o petista aos gritos.

"O senhor está rindo da nossa cara", respondeu Franceschini.

Relator da CPI, o deputado Marco Maia (PT-RS) afirmou que a novidade da semana foi a "presença do PSDB" nas denúncias. "A principal novidade da semana é o envolvido do PSDB no processo de roubo e corrupção da Petrobras. Fiquei estarrecido com isso. Se o PSDB não estando dentro [da estatal] tem essa relação, imagina estando dentro", afirmou o petista.

O deputado Izalci (PSDB-DF) disse que, diante da movimentação do PT, também poderia pedir a convocação do ex-ministro Antonio Palocci (Casa Civil) para falar sobre a suspeita de ligação com o esquema de corrupção da estatal e até da presidente Dilma Rousseff.

Segundo governistas, a movimentação do PT foi combinada com partidos aliados. A ideia é fazer um contraponto a pressão pela convocação do tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, acusado de ser um dos operadores do esquema de desvio de recursos da estatal investigado pela Operação Lava Jato.

O presidente da CPI esteve com o ministro Ricardo Berzoini (Relações Institucionais) antes da reunião da comissão.

DOLEIRO

A CPI também definiu para a próxima quarta-feira (29) o depoimento do doleiro Alberto Yousseff. Parlamentares, no entanto, acreditam que ele vai permanecer calado para não prejudicar seu processo de delação premiada.

A oposição defendia que a presença do doleiro acontecesse antes do segundo turno das eleições, mas a base governista manobrou para impedir que a CPI tivesse oportunidade de criar fatos contra o governo na reta final da sucessão presidencial.


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