Folha de S. Paulo


Entre o céu e o inferno: Após ser tratado como liquidado, Aécio reage

Aécio Neves entrará para a história da política brasileira neste domingo (5), para o bem ou para o mal.

Pode se tornar o primeiro candidato desde a redemocratização a passar para o segundo turno da eleição presidencial depois de ter sido rebaixado à terceira colocação, 20 pontos percentuais atrás de suas principais adversárias.

Ou poderá ser lembrado como o primeiro nome do PSDB a ficar fora da etapa final de uma disputa nacional desde que a sigla chegou ao poder, em 1994, com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Os dois cenários, distantes como o céu e o inferno, se alternam na cabeça do tucano desde o dia 13 de agosto, quando Eduardo Campos (PSB), seu amigo e adversário, morreu em um acidente aéreo.

A tragédia trouxe para o centro da disputa a ex-senadora Marina Silva, que havia se filiado ao PSB para ser vice de Campos.

Mais conhecida que Aécio e uma das poucas figuras públicas do país a se beneficiar com os protestos de junho de 2013, Marina logo se tornou favorita. Impulsionada ainda pela comoção com a morte do aliado, fez com que a candidatura do tucano parecesse fadada ao fracasso.

Sinais negativos vinham de todas as partes. Os convites para eventos públicos com aliados diminuíram. Financiadores frearam as doações. Analistas políticos retrataram a campanha como liquidada.

Não fosse o suficiente, um erro no berço eleitoral de Aécio tornava-se cada dia mais evidente. Pimenta da Veiga (PSDB), nome que o presidenciável havia escolhido para disputar o governo em Minas Gerais, personificara o risco de um fiasco duplo: a derrota nacional e a estadual.

O grupo político de Aécio manda em Minas desde que ele se elegeu governador, em 2002. As pesquisas indicam que Pimenta encerrará esse ciclo, sendo derrotado pelo petista Fernando Pimentel.

Pressionado a se voltar para Minas, a fim de preservar o capital político regional, Aécio resistiu.

Com menos espaço na mídia nacional, refez o plano de comunicação e a programação da campanha. Centrou esforços nas regiões Sul e Sudeste, onde avaliou ter mais chances de recuperar o terreno perdido para Marina.

Passou a associar a adversária ao PT, partido no qual ela militou por mais de 20 anos, na propaganda eleitoral. Queria o voto antipetista de volta.

Para superar a redução do espaço no noticiário nacional, falava diariamente para rádios regionais. Chegou a reunir representantes de 83 jornais de bairro de São Paulo –o maior colégio eleitoral do país– para uma longa entrevista.

Recorreu a amigos famosos, como o ex-jogador Ronaldo, para atrair mídia e controlou pessoalmente a fuga de aliados, mobilizando seu pessoal por telefone todos os dias. Pregava a "volta da racionalidade à eleição".

Dizia que, passada a comoção com a morte de Campos, o eleitor iria ponderar se Marina tinha, de fato, condições de governar. Apostou nisso e na tese de que o PT, partido da presidente Dilma Rousseff, não assistiria inerte à ascensão da nova rival, o que de fato ocorreu.

Desde meados de setembro, começou a reagir nas pesquisas, lentamente. "Só um milagre", ouviu diversas vezes. Marina, por sua vez, desidratou.

O cronograma otimista do tucano se cumpriu. Ele chega à reta final da disputa empatado com Marina, como previu depois de despencar nas pesquisas.

Agora as urnas responderão se Aécio terá ou não o seu milagre.
p(division). -

AÉCIO

Aécio Neves da Cunha, 54 - Natural de Belo Horizonte, é economista formado pela PUC-MG e senador desde 2011. Antes, foi deputado federal e governador de Minas por dois mandatos (2003-2010)

RETOMADA:

"Chegou a hora da onda da razão para encerrar o ciclo de governo do PT"

Aécio Neves, Rio de Janeiro, 21.set.2014

ACERTOS

  • Contornou divergências internas no PSDB para agrupar FHC, Serra e Alckmin ao redor da candidatura; foi insistente mesmo com a queda nas pesquisas
  • Teve sangue frio para contornar os momentos mais delicados da campanha, quando chegou a estar 20 pontos percentuais atrás de Marina. Contornou defecções de aliados e manteve a tropa ao seu lado
  • Usou o horário eleitoral para se diferenciar em temas polêmicos, mas de grande apelo popular, como fez ao defender a redução da maioridade penal para crimes hediondos

ERROS

  • Demorou a responder sobre o caso, noticiado pela Folha, do aeroporto de Cláudio, construído em área desapro-priada de um terreno do tio do tucano. Aécio demorou dez dias para admitir que havia utilizado a pista
  • Aliados do tucano admitem que ele errou na escolha de seu candidato ao governo de Minas, Pimenta da Veiga. O aliado estava afastado da política mineira há dez anos e deve perder no 1º turno
  • Demorou para lançar programa de governo e, às vésperas do primeiro turno, só divulgou os principais eixos em redes sociais

CINCO PROMESSAS DE CAMPANHA

  1. Reduzir a inflação gradualmente e fazê-la voltar ao centro da meta, hoje em 4,5%
  2. Apresentar um projeto de reforma tributária no primeiro ano de governo, com redução de impostos e um sistema mais simples
  3. Ampliar os gastos com saúde pública de 7% para 10% da receita bruta federal e rever acordo pelo qual médicos cubanos ganham menos que outros no Mais Médicos
  4. Defesa da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos em casos de crimes considerados hediondos
  5. Incentivar jovens entre 18 e 29 anos a retomar os estudos por meio de auxílio de um salário mínimo mensal (o Poupança Jovem)

-


Endereço da página:

Links no texto: