Folha de S. Paulo


Transferência de bens abre crise entre Petrobras e TCU

O processo para bloquear os bens da presidente da Petrobras, Graça Foster, foi suspenso novamente nesta quarta-feira (20) no TCU (Tribunal de Contas da União) após a revelação de que ela transferiu imóveis no Rio para parentes no início deste ano.

A informação, publicada no site do jornal "O Globo" no meio da tarde de quarta-feira (20), levou o relator do caso sobre a compra da refinaria de Pasadena (EUA), ministro José Jorge, a pedir a retirada do processo da pauta de votação para averiguar a veracidade da informação.

"[A suposta transferência de patrimônio] É indicativo de que fizemos a coisa certa. Temos que confirmar [a transferência], e caso se confirme, isso se configura burla ao processo e é gravíssimo", afirmou Jorge. O ministro pretende retomar a votação do caso na próxima quarta (27).

Os imóveis foram transferidos por Graça para parentes em março e abril de 2014, quase um ano após o TCU ter começado a investigar a compra da refinaria nos EUA. O ex-diretor da Área Internacional da Petrobras, Nestor Cerveró, também transferiu imóveis para parentes em junho, informou "O Globo".

Assessores presidenciais disseram à Folha que foram "surpreendidos" com a notícia sobre a transferência de imóveis feitas por Graça. Mas ministros ouvidos pela reportagem dizem que o governo seguirá defendendo a presidente da estatal e batendo na tecla de que o processo no TCU é uma tentativa de "arrastar a Petrobras para o jogo eleitoral".

Alan Marques - 11.jun.2014/Folhapress
A presidente da Petrobras, Maria da Graça Foster
A presidente da Petrobras, Maria da Graça Foster

O caso Pasadena começou a ser investigado no TCU em 2012, após a Petrobras fechar o acordo que a fez pagar cerca de US$ 1,25 bilhão (R$ 2,8 bilhões) pela refinaria. Em abril de 2013, o TCU abriu o processo oficialmente. Em 23 de julho deste ano, os ministros decidiram responsabilizar diretores e ex-executivos da empresa por um prejuízo estimado pelo órgão em US$ 792 milhões (R$ 1,7 bilhão) no negócio.

Na mesma decisão, da qual cabe recurso, o TCU determinou o bloqueio de bens, mas, por um erro do órgão, o nome da presidente da Petrobras não foi incluído. Ontem, o TCU decidiria se o nome dela seria incluído ou não no processo e se ela teria seus bens bloqueados. Como os diretores ainda não foram notificados da decisão de bloqueio, o patrimônio deles ainda está disponível.

Caso a tese do relator do processo, ministro José Jorge, fosse a vencedora, Graça Foster seria responsabilizada por um dos quatro atos que levaram ao prejuízo da compra da refinaria. Ela era da diretoria da empresa quando uma das decisões que causou prejuízo à estatal foi tomada.

O relator do processo havia proposto há duas semanas a inclusão do nome dela entre os acusados, mas retirou a ação de pauta após contestação da Petrobras e da Advocacia-Geral da União.

Segundo a empresa e o governo, a decisão de condenar os diretores pela compra da refinaria americana e de bloquear seus bens está causando prejuízo à empresa e que a medida de bloqueio não cumpre a legislação.

Jorge disse que não havia nenhuma ilegalidade na decisão de bloquear os bens dos diretores, mas os ministros Raimundo Carreiro e Walton Alencar discordaram ontem (20), pouco antes de o caso ser retirado da pauta devido à reportagem de "O Globo".

No Congresso, onde foram abertas duas CPIs para apurar irregularidades na estatal, a oposição pediu a investigação das transferências de imóveis.

OUTRO LADO

A presidente da Petrobras, Graça Foster, iniciou o processo de doação de três imóveis para seus dois filhos Flávia e Colin em junho de 2013, informou a empresa –três meses depois de o TCU ter iniciado as investigações sobre a compra da refinaria de Pasadena, em 1º de março de 2013.

A empresa diz refutar "veementemente" a informação de que Graça tenha feito "qualquer movimentação patrimonial com intuito de burlar decisão do TCU" que tornou indisponíveis bens de 11 executivos supostamente responsáveis por perda estimada em US$ 792 milhões com a compra da refinaria. A decisão do TCU, de 23 de julho, não listava Graça entre os executivos penalizados.

A Petrobras confirmou que as doações foram concluídas entre março e abril de 2014: "É importante frisar que doações de bens são atos legítimos, previstos em lei e objetivam evitar futuros conflitos entre herdeiros", diz a estatal.

Edson Ribeiro, advogado de Nestor Cerveró, disse que seu cliente tinha e tem o direito de transferir bens. A transferência de três imóveis para dois filhos e um neto, segundo Ribeiro, se deu "no segundo trimestre" deste ano.

"Cerveró resolveu aproveitar este momento para pensar em sua vida, e decidiu tomar esta decisão, para a qual não havia, nem há, qualquer impedimento. Até agora, nem a Polícia Federal, nem o Ministério Público, procurou Cerveró para dizer que ele é investigado", disse Ribeiro. O advogado disse que Cerveró não pode ser responsabilizado por perdas na refinaria: "A responsabilidade é do conselho de administração. O TCU foi induzido ao erro".

O ministro da Advocacia-Geral da União, Luís Inácio Adams, disse que, ao que foi informado, a transferência de bens ocorreu anteriormente ao processo no TCU. Na época, disse, Graça Foster não era objeto nem estava no centro da discussão de Pasadena.

"Estão querendo transformar isso em uma coisa maior que é. Ela não participou da decisão [de Pasadena], não tem culpa nenhuma e não é indicada como responsável". Adams disse que a transferência de bens não caracteriza "fuga patrimonial'': "Não está escondendo. É um patrimônio localizado. Quem esconde esconde com laranjas".


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