Folha de S. Paulo


Estivador que afirmou ter visto corpo de Campos diz que 'fantasiou'

Na tela do celular, o estivador Donizete Machado Júnior, conhecido como "Maguila", exibe uma montagem do pôster do filme "Forrest Gump: O Contador de Histórias". Em vez do rosto do protagonista, interpretado por Tom Hanks, há uma imagem sua. "Olha só, acabaram de fazer essa montagem com a minha cara", disse, acrescentando: "É o dia todo agora. Virei meme na internet".

Ex-pugilista, detentor de um cinturão de peso médio-ligeiro em um torneio de boxe amador, Donizete Júnior diz que trabalha em portos desde 1997. O apelido vem do boxeador que é seu "ídolo de adolescência".

O estivador, de cerca de 38 anos –ele não mostra o RG e, em cada entrevista, diz uma idade diferente–, é alvo de ataques e piadas na internet desde o acidente que matou o presidenciável Eduardo Campos (PSB) e mais seis pessoas em Santos, no litoral paulista, na quarta-feira (13).

Ele saía do trabalho quando testemunhou a queda do avião. Antes de os bombeiros confirmarem as mortes, disse à imprensa ter reconhecido o corpo do pessebista entre as vítimas fatais. "Eu vi o corpo do Eduardo Campos. Eu vi os olhos claros dele e cheguei a limpar o rosto dele", afirmou à Folha logo após o acidente.

Ao vivo, no "Jornal Hoje", da TV Globo, também disse que estava na sala de casa quando ouviu o barulho da queda da aeronave. As duas informações são falsas. O estivador vive em São Vicente, cidade vizinha a Santos, e não teve contato com os restos mortais das vítimas, que estavam deteriorados.

A repercussão da entrevista fez Maguila voltar atrás das declarações. Desde o domingo (17), ele tem postado "comunicados de retratação" em seu perfil no Facebook.

Nesta segunda (18), o estivador disse à Folha ter sido "infeliz" nos comentários. "Eu fantasiei aquilo. Fui pressionado a responder. Todo mundo ali, menos a imprensa, sabia que ninguém havia sobrevivido na queda. [Quando questionado,] A primeira coisa que pensei foi nos olhinhos dele", afirmou, no apartamento que divide com o professor de dança Maycon Simões, seu companheiro.

Os dois vivem juntos há 15 anos e protagonizaram, em abril, uma série de reportagens em jornais e sites da baixada santista. Incentivado pelo Sindicato dos Estivadores de Santos, Maguila convocou a imprensa após ter sido demitido de uma empresa portuária em que trabalhou durante 30 dias. Ele disse que havia sido vítima de homofobia por ter tentado incluir Simões como dependente no plano de saúde.

Maguila avalia que as declarações que fez sobre Campos "foram ruins até para o processo que tinha contra a empresa". "Acabou com minha credibilidade", afirmou. E completa, reiteradas vezes: "Eu estava lá para tentar ajudar. É bom que eu deixe isso claro. Não fui me aproveitar da situação".

A afirmação é dirigida a críticos como o editor da página do Facebook "Vivendo em Santos", Luiz Fernando Lobão, que publica postagens contra Maguila. Segundo Lobão, no dia do acidente, "enquanto todos estavam desesperados tentando ajudar, Maguila estava com calma e procurando seus 15 minutos de fama".

Apesar dos ataques, o estivador já desfruta do reconhecimento. Nas ruas de São Vicente, é cumprimentado por pedestres que o viram na TV. Ele diz ter recebido propostas para participar de um humorístico televisivo. Avesso às aparições do parceiro na imprensa, Simões reclama: "Não aguento mais. Eu quero é que isso passe o mais rápido possível".


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